No 1º semestre deste ano, foram ofertadas 114,5 mil cadeiras por meio de cotas, ou 51,7% do total; em 2013, porcentual era de 33,4%. Expectativa é de que número aumente nos próximos anos; especialistas se dividem em relação à eficácia do sistema
(O Estado de S. Paulo, 04/09/2016 – acesse no site de origem)
As 63 universidades federais do País já oferecem mais vagas para cursos de graduação por sistema de cotas e ações afirmativas do que pelo formato de concorrência comum. Este foi o primeiro ano em que a reserva para estudantes de escolas públicas superou o porcentual aberto à ampla disputa, dominado historicamente por alunos oriundos de unidades particulares de ensino.
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O aumento foi impulsionado pela Lei 12.711, a chamada lei de cotas. Sancionado e regulamentado em 2012, o texto previa que gradualmente as universidades passassem a destinar vagas para cotas até que, ao fim de quatro anos, o porcentual atingisse 50% com base em critérios sociais e raciais (mais informações no quadro ao lado). No primeiro semestre de 2016, foram ofertadas 114,5 mil vagas reservadas (51,7%), ante 113 mil de disputa livre (48,3%). Em 2013, a proporção destinada a cotas estava em 33,4%.
O cumprimento da meta dos 50%, no entanto, ainda não significa que metade dos alunos atualmente matriculados nas universidades tenha vindo da escola pública. Relatório da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) mostrou que as federais tinham, em 2014, 939 mil estudantes, dos quais 305 mil, ou 32,55%, haviam entrado por meio de cota.
A expectativa é de que a reserva para cotas continue aumentando nos próximos anos. Em 2022, está prevista uma revisão do texto, que nasceu com argumento de política provisória.
Queda. Especialistas em Educação se dividem em relação à eficácia da medida. Para o ex-reitor da Universidade de São Paulo (USP) e atual presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), José Goldemberg, a introdução das cotas é “totalmente inadequada”, por afetar a qualidade da produção científica e tecnológica das universidades.
Embora pondere que ainda é cedo para avaliar as consequências das cotas, Goldemberg acredita que o resultado a curto e médio prazo é a queda de nível no ambiente acadêmico. “Claramente, as cotas não são nenhuma receita para fazer uma universidade de excelência. As universidades servem para preparar pessoas capazes de enfrentar os problemas do País, pessoas, portanto, que tenham conhecimento científico e tecnológico necessário”, disse. “As cotas são paliativos. O custo disso vai ser afetar a qualidade dos graduados. O País vai acabar não sendo beneficiado.”
O ex-reitor defendeu o combate dos problemas de discriminação social e racial, mas não nas universidades. Ele citou as escolas primária e secundária como exemplos de ambiente correto para a introdução de políticas sociais. “A universidade não pode resolver problemas de discriminação social ou racial. Não é que não se deva combater essa discriminação. Sou totalmente favorável ao combate”, afirmou. Como alternativa às cotas, Goldemberg citou a política de bônus a estudantes de escolas públicas no processo seletivo. “É uma maneira de corrigir parte das distorções sociais. É razoável dar um bônus. Mas acho que esse é o limite.”
O professor da Universidade Estadual do Rio (Uerj) André Lázaro, por outro lado, destaca o que considera o papel positivo da inclusão. “As universidades federais são onde se forma a elite intelectual, empresarial e política do País. Então, uma universidade mais com a cara do Brasil, representada por negros e pessoas de baixa renda, ajuda a formar uma elite mais consciente”, disse.
Lázaro pede ainda que um formato de avaliação seja instituído mais claramente para que em 2022 possa ser feita uma análise dos efeitos da lei.
Notas. O coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, Naercio Menezes Filho, estuda o sistema de cotas e analisou notas do Enem de beneficiados pela medida. O estudo mostra que a reserva de vagas não provocou queda relevante na nota mínima nem média de entrada nas instituições de ensino. “Há muita gente de escola pública na disputa. Então, os aprovados acabam entre os 10% com melhor desempenho. As cotas parecem muito boas, porque aumentam a representatividade sem diminuir muito a nota.”
O estudante Hasani dos Santos, de 22 anos, está no último ano de Ciências Sociais na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). É o primeiro da família a entrar em uma universidade. “Minha visão de ascensão sempre foi com o trabalho, nunca tive perspectiva de fazer universidade.” Para ele, cotistas favorecem a pluralidade.
Luiz Fernando Toledo e Marco Antônio Carvalho. Colaborou Juliana Diógenes