O exemplo de Carol Gonçalves, de Toritama (PE), se soma a muitos outros que tentam limitar a ação de mulheres
Terminou bem o caso de Carol Gonçalves (MDB), vereadora do município de Toritama, interior de Pernambuco, que enfrentava um pedido de cassação por uma viagem ao México para participar como palestrante do Fórum Global pela Cidadania. Uma viagem sem uso de recursos públicos. A acusação? O fato de ela não ter informado a viagem à Mesa Diretora da Câmara Municipal, algo não exigido no regimento interno da Casa. Na prática, Carol Gonçalves enfrentava uma flagrante perseguição: uma acusação sem amparo no regimento nem na Lei Orgânica do Município, disseminação de fake news contra ela e omissão do próprio partido em sua defesa. Ela foi a primeira vereadora a sofrer um pedido de cassação na Justiça em quase 70 anos de história política de Toritama. Justo ela: uma mulher, jovem, preta e da periferia. Na semana passada, porém, o pedido foi arquivado no Ministério Público de Pernambuco.
Terminou bem, em termos. O que Carol Gonçalves enfrentou nos últimos meses entre seus pares homens na Câmara Municipal de Toritama é enfrentado daí para pior por muitas mulheres e pessoas trans que ousam ocupar espaços de poder. Isso tem nome e está na lei desde 2021: violência política de gênero. Diz respeito a qualquer agressão física, psicológica, econômica, simbólica ou sexual, com a finalidade de impedir ou restringir o acesso e exercício de funções públicas e/ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade. O que organizações que lidam com o tema explicam é que violência de gênero não se trata apenas de um ataque a alguém de um gênero específico, mas de um ataque motivado pelas expectativas sobre o papel que a vítima deveria empenhar na sociedade. Em outras palavras, no caso da violência contra a mulher, seus algozes acreditam que ela não deveria ocupar outro lugar que não o da submissão.
São exemplos desse tipo de violência política restrições, interrupções e tentativas de silenciamento ao exercício do direito da palavra por uma mulher parlamentar. Críticas a uma liderança política mulher que recorrem a estereotipações da figura feminina ou tentativas de ridicularização. Ou ainda agressões de fato, sejam elas psicológicas, sexuais ou físicas, no exercício do poder.
Ao município, em suas redes sociais e à coluna, a vereadora não hesitou em dizer que foi vítima de violência política de gênero. Não só pela acusação e pelas fake news de que foi alvo, mas pela singularidade da escolha. Outros vereadores ali – homens, claro – já se envolveram em escândalos como agressão, discriminação e uso indevido de diárias. Sem sequer punição leve. Na viagem ao México, o epicentro da crise em que se envolveu, a vereadora falou sobre um projeto de participação popular, a Assembleia Cidadão ‘RespirAR Puro’, cujo objetivo é combater a poluição do ar causada pelas lavanderias industriais de Toritama. “Tentaram me perseguir e me censurar”, disse a vereadora à coluna, antes do arquivamento. Depois da notícia, compartilhou o alívio, dizendo-se de “coração lavado” e anunciando que vai à Justiça em nome da criminalização da violência política de gênero.