Como um aborto legal realizado por uma médica de Minas Gerais em uma paciente estuprada na Bahia ajudou uma menina no Espírito Santo
(Folha de S. Paulo| 02/09/2020 | Por Hela Borges Martins da Silva Paro)
Entre um atendimento e outro, o telefone da obstetra Helena Paro tocou: era um colega pedindo orientações para tentar ajudar uma menina de 10 anos, violentada e grávida de seu estuprador no Espírito Santo. O caso ganharia repercussão nacional, e a gravidez avançada, de mais de vinte semanas, impediria o aborto legal, afirmavam alguns. A médica atendera um caso semelhante em abril deste ano, quando uma mulher de 26 anos, grávida de mais de 22 semanas, procurou o Nuavidas (Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual), coordenado por ela e ligado ao Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia. A jovem fora estuprada e queria interromper a gestação. A equipe do Nuavidas realizou o procedimento e elaborou um protocolo detalhando recomendações legais e médicas sobre o aborto legal acima de vinte semanas de gravidez – e explicitando que, pela legislação brasileira, não há limite de tempo para interromper uma gestação decorrente de estupro. Nesse depoimento, a obstetra de 42 anos relata sua rotina num serviço de aborto legal: o medo vivido pelas mulheres estupradas, o preconceito dos colegas médicos e as batalhas cotidianas para garantir um direito.