(The Economist/Estadão, 26/07/2016) Marketing começou a apostar cada vez mais nas diferenças de gênero, mesmo que os produtos de beleza geralmente sirvam tanto para homens como para mulheres
Amigos, é hora de darmos adeus aos produtos de limpeza femininos, sugere o site da Hero Clean, uma linha de materiais de limpeza para homens que a professora de sociologia Elizabeth Sweet, da Universidade da Califórnia, em Davis, descobriu quando estava fazendo compras. “Chega de frascos em tom pastel, com cãezinhos, bebês e campos brilhando com o orvalho.”
Só um número muito reduzido de produtos faz jus a distinções de gênero. “Apenas os que se destinam aos nossos órgãos genitais”, diz outra especialista em questões de gênero, Lisa Wade, do Occidental College, de Los Angeles. Apesar disso, proliferam os artigos desnecessariamente voltados “para ele” ou “para ela”.
Os cotonetes Q-Tips agora têm uma versão “definitivamente masculina”, para homens cuja cera de ouvido não tem como ser removida por cotonetes delicados. A loja de instrumentos musicais Daisy Rock vende “guitarras para meninas” cor-de-rosa choque. A marca de protetores solares Banana Boat tem uma linha de frascos pretos para os homens, que sentiriam sua masculinidade ferida se tocassem as garridas embalagens cor de laranja que popularizaram a marca.
Dos anos 1950 em diante, o marketing começou a apostar cada vez mais nas diferenças de gênero, mesmo que os produtos de beleza geralmente sirvam tanto para homens como para mulheres, diz Sweet. Uma explicação possível para o fenômeno é que, com homens e mulheres levando uma vida cada vez mais parecida, frequentando as mesmas universidades e exercendo as mesmas profissões e fazendo as mesmas tarefas domésticas, os responsáveis pelas campanhas de marketing perceberam que podiam apelar ao instinto primitivo da diferenciação.
Diferencial de preço. Algumas fabricantes chegam a cobrar mais caro pelas versões de um mesmo produto destinadas especificamente ao público feminino. Estudo realizado em 2015 na cidade de Nova York mostra que as mulheres chegam a pagar 40% mais caro por artigos que de “femininos” têm pouco mais do que a embalagem. Mas muitos dos novos produtos com “selo de gênero” são destinados aos homens.
A fabricante de laticínios Powerful Yogurt comercializa iogurtes com alta dose de proteína em potes pretos. A neozelandesa Mammoth Supply, que vende café em lata, para ser consumido gelado, incentiva os homens a cair de cabeça em sua nova realidade doméstica: “Não basta varrer as folhas secas do quintal, é preciso aniquilá-las. Não basta dar conta das tarefas domésticas, o negócio é fulminá-las”.
Há também empresas que enveredam com mais cuidado por essa seara. Depois de receber queixas no ano passado por etiquetas com indicação de gênero, a varejista americana Target removeu esse tipo de sinalização de suas seções de brinquedos e roupas de cama infantis. Outras companhias, como a fabricante de produtos de higiene Johnson & Johnson, por meio de sua linha Clean & Clear, chegam a usar temas transgêneros em seu marketing.
Muitos consumidores resistem à exploração da diferenciação. No site da Amazon, avaliações postadas na página das canetas “Bic para Ela”, que são iguais às outras, só que com tintas de cor rosa e roxa, vêm recheadas de sarcasmo. Um consumidor conta que a esposa desmaiou ao tentar digitar alguma coisa em seu teclado “varonil” e teve de ser reavivada com sais aromáticos. Talvez os homens sejam de Marte e as mulheres de Vênus, mas num ponto todos parecem estar de acordo: as canetas, assim como os lápis e as borrachas, são unissex.
Acesse o PDF: Produtos dele, produtos dela (The Economist/Estadão, 26/07/2016)