O caso Daniel Alves escracha o modus operandi da cultura do estupro, onde a vítima é difamada e na dúvida, absolve-se o culpado.
A Constituição Federal de 1988 é taxativa em seu artigo 5º, inciso LVII: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Seguindo o mesmo entendimento, o Código de Processo Penal determina em seu art. 386, Inciso VII que:
"O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: (...) VII - não existir prova suficiente para a condenação".
Tais garantias derivam do princípio norteador denominado In dubio pro reo. Simplificando, o termo significa que caso a autoridade competente tenha dúvidas, ou seja, mesmo após toda a instrução processual não tenha se convencido, na dúvida absolve-se o réu.
O princípio é motivado pelo desejo de evitar, ao máximo possível, que uma pessoa inocente venha a ser privada de liberdade. Afinal, uma condenação equivocada causa danos irreparáveis.
Saindo da esfera do ideal e partindo para o real, principalmente no que se refere às práticas e costumes sociais, basta lermos os comentários em redes sociais ou observarmos os diálogos sempre que a imprensa divulga notícia da possível prática de um crime. Nesses casos, evidencia-se que o princípio do In dubio pro reo está bastante distante da formação do pensamento popular.
A condenação expressa é o habitual. Se a pessoa acusada for preta, mais contundente é a condenação pública. Aí sim, os adjetivos são os mais perversos. Não interessa quem é aquela pessoa, sua história de vida ou se de fato existem provas que embasem a sua condenação, bandido, traficante, agressor estes são os adjetivos.
E quem nunca ouviu o famoso “bandido bom é bandido morto”?
E quando é mulher
No entanto, está escrachado como este pensamento punitivista se modifica quando se trata de crime contra a mulher, ou crimes de gênero.
Quando há a divulgação de que mulheres denunciaram agressões, os comentários em redes sociais, os diálogos entre os mesmos interlocutores passam a ter uma conotação totalmente diferente:
“Ela quer dinheiro”, “ela quer fama”, “eu conheço, homem de bem, jamais seria capaz de tal conduta”, “mentirosa, está fazendo isso por vingança porque ele não a quis mais”, e etc.