Pesquisa liderada por Diana Greene Foster mostra que quem faz o procedimento não tem impacto negativo na saúde mental
Mesmo certas de que gostariam de fazer um aborto, mulheres precisavam ouvir os batimentos cardíacos do feto que carregam e ter acesso a descrições detalhadas do ultrassom. Era prática comum —e amparada pela lei— nos estados mais conservadores dos Estados Unidos, como o Kentucky, até o fim de Roe vs. Wade, decisão que garantia a legalidade do procedimento no país. Lugares em que a interrupção da gestação foi recém-legalizada, como a Argentina, apresentam outros entraves, como a exigência que a mulher passe por um psicólogo antes de dar continuidade ao procedimento.
Esse tipo de política, que joga o abordo no campo da saúde mental e da expectativa do arrependimento, é uma mudança em relação à posição comum dos manifestantes contrários ao direito de escolha das mulheres, aqueles que costumam usar fetos de borracha e falas sobre o direito à vida do embrião. Agora, evitar o aborto deixa de ser um cuidado com o suposto bebê, e passa a ser proteção à mulher.
A mudança de discurso acendeu um alerta vermelho e impulsionou Diana Greene Foster, demógrafa e professora da Universidade da Califórnia em São Francisco (EUA), a liderar um estudo que medisse o impacto do procedimento em gestantes. Durante oito anos, a pesquisadora fez 8.000 entrevistas com mais de 1.100 mulheres grávidas que desejavam realizar o aborto.
“Quando comecei o estudo Turnaway, era esse mote que guiava o debate nos Estados Unidos. Haviam slogans políticos e outdoors que diziam ‘o aborto machuca mulheres’ e a Suprema Corte decidiu manter restrições ao procedimento porque parecia razoável assumir que mulheres seriam machucadas por fazer abortos, mesmo sem dados. Eu entendi que havia uma necessidade desesperada por dados nesse assunto”, diz a pesquisadora à Folha.
Uma vez que o aborto é uma prática comum, era necessário saber se fazê-lo realmente gerava prejuízos. Foster escreve que antes de seu trabalho, as pesquisas sobre danos causados pelo procedimento incluíam mulheres que não tinham sequer considerado o aborto. Ela diz que o problema de fazer essa comparação é que ela mistura aquelas possivelmente estáveis, em relacionamentos felizes, que desejavam bebês, com mulheres que não se viam felizes ou preparadas, o que poderia enviesar a questão da saúde mental.