Pesquisas feitas nos últimos 20 anos mostram que, quanto mais avança a gravidez, mais a vida de meninas estupradas corre risco.
Uma frase que sempre ouvi em mais de sete anos cobrindo o judiciário é que “os magistrados têm autonomia para decidir de acordo com seu convencimento”.
Foi isso que me disse a assessoria de imprensa do tribunal de Goiás quando pedi um posicionamento sobre a decisão judicial que obrigou uma menina de 13 anos a manter a gestação após ser estuprada – mesmo a legislação garantido o direito ao aborto nesse tipo de situação.
Mas o que forma o convencimento dos magistrados em um tema como o aborto – diretamente relacionado à saúde da mulher e seus direitos reprodutivos –, mas é dominado por conservadorismo e convicções religiosas?
Para a obstetra Helena Paro, pesquisadora que criou o primeiro serviço de aborto legal por telemedicina do país, decisões como a das magistradas de Goiás, de Santa Catarina e do Piauí, que impediram o acesso ao aborto legal de crianças e adolescentes, não fazem sentido do ponto de vista médico.
Isso porque os riscos de um aborto induzido são muito baixos se comparados à manutenção da gestação. E eles aumentam semana a semana. Estudos citados pela especialista e publicados entre 2004 e 2022 em diversas revistas científicas, entre elas a The Lancet, trazem essa e outras conclusões.
Mesmo em gestações acima de 20 semanas, destaca Paro, a morte em um aborto induzido ocorre em menos de 8 a cada 100 mil procedimentos. Já a possibilidade de hemorragia é menor do que 1%. Se a gravidez seguir adiante, o risco de hemorragia é três vezes maior. E o risco de morte ou quase morte é de 1 a cada 100, segundo dados da Organização Mundial da Saúde de 2013. “Isso é multiplicado cinco vezes quando se fala de menores de 14 anos”, afirma a obstetra.
Além disso, tentar antecipar o parto de fetos com cerca de 30 semanas de gestação eleva em mais de 50% a chance de eles terem uma vida de sofrimento com as sequelas graves causadas pela prematuridade, segundo estudos citados por Paro.