“Mulheres morrem por aborto inseguro porque têm medo de nós, profissionais de Saúde”, alerta a enfermeira Dannyelly Costa. “Mais do que ampliar o acesso ao DIU, nosso papel é acolher a mulher sem julgamentos e respeitar a liberdade de escolha”
A atuação da Enfermagem no planejamento reprodutivo está ampliando o acesso a contracepção de longa duração e contribuindo para a redução da mortalidade materna no interior do Brasil. Conforme dados do Ministério da Saúde, enfermeiros foram responsáveis pela expansão do acesso ao dispositivo intrauterino (DIU), tendo realizado 61% das inserções na Região Norte, 43,6% das inserções na Região Nordeste e mais de um terço das inserções na Região Centro-Oeste em 2022.
“A inserção ou não do DIU é o topo da pirâmide. A base de uma consulta de Enfermagem qualificada é uma escuta atenta, sem julgamentos. Aos poucos uma nova história vai sendo concluída, com liberdade de escolha”, afirma a enfermeira obstétrica Dannyele Costa. Presidente do Coren-AL, Dannyle coordenou a Comissão Nacional de Saúde da Mulher do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) e participou da sessão científica sobre Planejamento Sexual e Reprodutivo, no 26º Congresso Brasileiro do Conselhos de Enfermagem, juntamente com Mageany Reis (Coren-PI) e Josiellyda Teixeira (Coren-RO), com relatoria de Mara Bastos.
É preciso desmistificar o DIU. A falta de informação da população em geral, começando pelos profissionais de Saúde, é o primeiro obstáculo à ampliação do acesso, na avaliação das palestrantes. Faltam, ainda, profissionais qualificados para inserção e retirada do DIU na Atenção Primária à Saúde (APS). Altamente efetivo (99%), o DIU de cobre disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) não contém hormônio e tem o melhor custo-benefício, considerando a sua longa duração. Não interfere na lactação e permite um retorno rápido à fertilidade, caso a mulher decida engravidar.
Mulheres morrem por medo e precariedade na assistência
A maior parte das gestações no Brasil são não planejadas (55%). Em 2023, foram 66.381 mil mortes relacionadas a gestação, segundo dados do Ministério da Saúde. As principais causas são hipertensão, hemorragia, infecção, puerperal e aborto inseguro. “E o que a inserção do DIU muda? Muda a gravidez na adolescência, porque podemos inserir o DIU independente a mulher ter ou não filhos, mesmo em menores de idade. Garante a liberdade da escolha, o direito de seguir seus sonhos e planejar a gravidez. Tudo isso interfere na mortalidade materna e nas condições de vida da família”, afirma.
“Não é nosso papel julgar as mulheres, seja por terem muitos filhos, seja por não quererem filho algum. É preciso dizer que as mulheres estão morrendo no Brasil por abortos inseguros porque têm medo de buscar ajuda dos profissionais de Saúde. Têm medo de nós”, alertou Dannyele. A legislação brasileira assegura, desde 1940, o direito a aborto legal para vítimas de estupro. No caso de crianças abaixo de 14 anos, o estupro é presumido, sendo dever profissional o encaminhamento aos serviços especializados.
A existência de protocolos assistenciais é fundamental para direcionar a consulta, ressaltaram as palestrantes. Josiellyda Teixeira (Coren-RO) reforçou que a consulta de Enfermagem é um momento de escuta e permite identificar situações de violência contra mulher. “Até 2023 nós inseríamos DIU. Não fazíamos consulta de Enfermagem obstétrica e ginecológica. O que vimos, quando passamos a fazer a consulta, foi um alto índice de violência contra mulher. Muitas mulheres que passavam conosco há anos se abriram e puderam ter apoio”, relatou.