A realidade nos força a refletir sobre uma questão: o que vem primeiro, raça, gênero ou classe?
Foi divulgado recentemente o 2º Relatório de Igualdade Salarial, que expôs a persistente desigualdade entre homens e mulheres no Brasil. A média salarial dos homens foi de R$ 4.495,39, enquanto a das mulheres foi de R$ 3.565,48.
Além disso, o documento destacou as diferenças salariais entre pessoas negras e não negras, revelando como a discriminação racial se soma à de gênero. Os números são alarmantes: em 2023, as mulheres negras recebiam, em média, R$ 2.745,26, o que representava apenas 50,2% do salário dos homens não negros, cujo rendimento médio era de R$ 5.464,29.
Os dados evocam algo que minha avó sempre diz: “Mulher negra tem que matar três leões por dia”. E, de fato, ela está certa. A realidade das mulheres negras na classe trabalhadora nos força a refletir sobre uma questão antiga –o que vem primeiro: raça, gênero ou classe?
Embora não haja uma resposta simples, é essencial considerar as reflexões de Lélia Gonzalez, que nos ajuda a entender a encruzilhada entre racismo, sexismo e capitalismo periférico na vida das mulheres negras no Brasil.
Lélia, uma referência tanto no ativismo quanto na academia, nos recorda que, desde a abolição da escravatura, o racismo não desapareceu; ele apenas se adaptou, permanecendo como um dos principais critérios de hierarquização social.
Esse fenômeno não só define quem é economicamente explorado, mas também quem ocupa os postos de trabalho mais precarizados. O capitalismo se beneficia dessa estrutura, mantendo a comunidade negra como uma força de trabalho barata e sujeita a condições de vida degradantes.
Dados do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) revelaram que, no segundo semestre de 2023, 46,1% da população negra ocupada trabalhava informalmente.
No caso das mulheres negras, esse percentual sobe para 46,5%, evidenciando a alta taxa de trabalhadoras sem carteira assinada ou contribuição para a Previdência Social. A maioria delas, cerca de 67%, está no setor de serviços e cuidados, caracterizado pela informalidade e pela ausência de direitos trabalhistas, como FGTS e licença médica.
Diante dessa realidade, fica evidente a urgência de implementar políticas de equidade racial no mercado de trabalho. Sem essas políticas, a igualdade só será alcançada em 166 anos, segundo uma pesquisa do Instituto Identidades do Brasil.