Mais mulheres no poder para enfrentar a violência contra a mulher, por Jô Cavalcanti

Mulheres negras de punhos levantados – Crédito – Ian de Farias – Mídia NINJA

Foto: Ian de Farias/ Mídia Ninja

05 de setembro, 2025 Brasil de Fato Por Jô Cavalcanti

*Em co-autoria com Vitória Genuíno, coordenadora nacional do MTST.

As imagens de um homem desferindo 61 socos contra uma mulher dentro de um elevador, em Natal, Rio Grande do Norte, há pouco mais de um mês, chocaram o Brasil. Algumas semanas depois, Alexsandra, Maria Helena e Mariana foram assassinadas em Ilhéus, Bahia. Mãe, filha e amiga caminhavam na praia com o cachorro quando foram abordadas. Horas mais tarde, seus corpos foram encontrados em um matagal. Mortas por um homem.

Essas não são histórias isoladas. Em 2024, o Brasil alcançou recorde de feminicídios na série histórica: 1.492 mulheres assassinadas, quase quatro por dia. Mais de 63% delas eram mulheres negras. São dados que expõem como o gênero e a raça se entrelaçam, tornando as mulheres negras as principais vítimas. Esse deve ser um chamado urgente para as políticas públicas de enfrentamento estarem centradas na justiça social e racial.

Os estupros também bateram recorde: 87.545 casos registrados, o que significa que uma mulher foi estuprada a cada seis minutos no país.

Os números do Anuário Brasileiro de Segurança Pública não deixam dúvidas: estamos diante de um problema estrutural, que trata as mulheres como cidadãs de segunda classe e nossos corpos como passíveis de agressão, violência e apagamento.

Vanessa Ricarte, 42 anos, foi assassinada em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, após ter denunciado e solicitado uma medida protetiva que não foi suficiente. No Piauí, uma adolescente de 15 anos, grávida de cinco meses, foi morta pelo padrasto. No Rio de Janeiro, Sther dos Santos, de apenas 22 anos, perdeu a vida por se negar a sair com um homem.

Cada uma dessas histórias revela não apenas a falha do Estado, mas também a ausência de prioridade política diante da vida das mulheres. Todos os casos mencionados neste artigo ocorreram este ano e são manifestações extremas de um problema estrutural, que atravessa raça, idade, classe.

O mês de agosto trouxe mais uma vez a memória da luta contra a violência. Foi em agosto que a Lei Maria da Penha completou 19 anos, legislação que ajudou a desnaturalizar a violência doméstica e a tratá-la como uma questão pública e não privada. Ainda assim, a narrativa de que “não falha a lei, falha a aplicação” segue sendo repetida enquanto mulheres continuam morrendo.

Sabemos que a violência não para na esfera doméstica: ela avança para a política, para as ruas, para as redes sociais, assumindo formas múltiplas de exclusão, opressão e silenciamento.

É aqui que precisamos enfrentar uma verdade: não haverá políticas eficazes de combate à violência contra a mulher sem mulheres no centro de sua construção. Isso vale para as casas-abrigo que não saem do papel, para delegacias sem estrutura ou protocolos e para programas de prevenção que não chegam às comunidades. O mesmo vale para o espaço mais alto da política: o Congresso Nacional.

Hoje, o Senado tem apenas 18 mulheres entre as 81 cadeiras. Na Câmara dos Deputados, pouco mais de 17% são parlamentares mulheres. O resultado é que em ambos os espaços, não são raros os discursos machistas, misóginos e transfóbicos que ecoam das tribunas, proferidos justamente por quem deveria legislar em defesa de todas e todos.

Como esperar que esse Congresso seja capaz de aprovar medidas robustas contra a violência de gênero se nele predominam tantas vozes que tentam deslegitimar as nossas lutas?

A violência contra a mulher é base de uma sociedade que se estrutura a partir do controle dos nossos corpos e das nossas vozes. Enfrentá-la exige um processo contínuo e complexo, que passa pela educação, pela justiça, pelo acolhimento, mas sobretudo pela participação ativa das mulheres nas decisões de poder. Sem isso, continuaremos a ter leis que não saem do papel e medidas protetivas que não protegem.

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