(O Globo Online) Muitos dos temas recorrentes nos debates sobre as posições da Igreja Católica, como aborto, pedofilia e casamento gay, foram discutidos pelo Papa Francisco no livro “Sobre el cielo y la Tierra” (“Sobre o céu e a Terra”), de 2010. A publicação compila uma série de conversas do Pontífice, então arcebispo de Buenos Aires, com o rabino Abraham Skorka, reitor do Seminário Rabínico Latino-Americano, sediado na capital argentina. Em 29 capítulos, o livro reforça a imagem do Papa como um sacerdote profundamente apegado aos dogmas do catolicismo e voltado para a Igreja como instrumento social e de diálogo. Na maioria dos casos, um homem aparentemente sem medo de expor suas ideias de forma clara. A seguir, opiniões de Francisco sobre alguns dos temas mais caros à Igreja hoje em dia.
Pedofilia
“O problema não está vinculado ao celibato. Se um padre é pedófilo, já o era antes de ser padre. Agora, quando isso ocorre, não se pode fazer vista grossa. (…) Creio que nos EUA adotaram como solução trocar os padres de paróquia. Isso é uma estupidez porque, dessa forma, o padre leva o problema nas malas. (…) Admiro a valentia e a retidão de Bento XVI neste assunto.”
Aborto
“Separo o tema do aborto de qualquer concepção religiosa. É um problema científico. Não é ético impedir o desenvolvimento de um ser que já tem todo o código genético de um ser humano. (…) Abortar é matar quem não pode se defender.”
Casamento gay
“O ministro religioso chama a atenção sobre certos pontos da vida privada ou pública porque é o condutor da paróquia. Mas não tem direito de forçar a vida privada de ninguém. Se Deus, na criação, correu o risco de nos fazer livres, quem sou eu para me meter. (…) Nossa opinião sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo não tem base religiosa, e sim antropológica. (…) No sermão do casamento, costumo dizer ao noivo que ele deve fazer sua noiva mais mulher, e a ela, que deve torná-lo mais homem.
Ditadura
“O que fez a Igreja naqueles anos? Fez o que faz uma entidade com santos e pecadores. (…) Na Igreja houve cristãos mortos na guerrilha, cristãos que ajudaram a salvar gente e cristãos repressores que acreditavam estar salvando a pátria. A conferência dos bispos fez muitas negociações reservadas. Não se pode crer que houve uma cumplicidade simplista. (…). Isso deu lugar a todo tipo de especulação. Eu, por exemplo, tive que esclarecer as acusações contra mim.”
A mulher no cristianismo
“No catolicismo, muitas mulheres podem conduzir uma liturgia da palavra, mas não podem exercer o sacerdócio porque no cristianismo o sumo sacerdote é Jesus, um homem. (…) A mulher tem outra função no cristianismo, refletida na figura de Maria. A mulher tem o dom da maternidade, da ternura; se estas riquezas não são integradas, uma comunidade religiosa não só se transforma em uma sociedade machista como também em austera, dura e mal sacralizada. (…) O fato de a mulher não poder exercer o sacerdócio não significa que ela seja menor do que o homem.
O poder na igreja
“Uma coisa boa que aconteceu com a Igreja foi a perda dos Estados Pontifícios, porque fica claro que a única coisa que o Papa tem é meio quilômetro quadrado. (…) Agora também há intrigas, porque há ambição nos homens da Igreja, há — lamentavelmente — o pecado do carreirismo.”
Política e religião
“Todos somos animais políticos (…). Todos estamos convocados a uma ação política de construção em nosso povo. A atribuição de valores humanos, religiosos, tem conotação política. (…) Celebrei uma missa pelas vítimas do tráfico de pessoas. Acabou virando um grande protesto, ao qual se juntou gente que não era católica, que não compartilha minha fé, mas compartilha o amor por seus irmãos. Não estou me metendo em política, estou me colocando no lugar de meu irmão.”
Acesse em pdf: Livro exibe posição do Papa sobre temas polêmicos (O Globo Online – 18/03/2013)
Leia também:
Uma caridade para Francisco, leia o seu livro, por Elio Gaspari (Folha de S.Paulo – 17/03/2013)
Ativistas gays temem retrocesso na América Latina com novo Papa (O Globo – 16/03/2013)