PEC das Domésticas reacende debate sobre as condições de permanência da mulher no mercado de trabalho

10 de abril, 2013

(Agência Patrícia Galvão, 10/04/2013) Chegado o momento em que a PEC das Domésticas deve ser regulamentada e colocada em prática, especialistas avaliam que a sociedade brasileira terá grandes desafios: repensar a organização do trabalho doméstico dentro da família, hoje relegado majoritariamente às mulheres; e exigir respostas do Estado ao gigantesco déficit de equipamentos sociais.

A avaliação é que a PEC traz à tona demandas latentes por políticas públicas e aparatos sociais – como aumento de vagas em creches e pré-escolas e ensino público em período integral – para que mulheres, empregadoras e contratadas, possam continuar no mercado de trabalho e, ao mesmo tempo, sair da situação de exaustão em que vivem para dar conta da dupla jornada.

Assim, para além da garantia dos direitos das 7 milhões de trabalhadoras domésticas no Brasil, o impacto da PEC deverá ainda reacender o debate sobre as condições de permanência das mulheres no mercado de trabalho – o que colocará em pauta as responsabilidades do Estado, de empresas e de todos os membros da família com o cuidado da casa, das crianças e dos idosos.

A Agência Patrícia Galvão preparou e selecionou diversos materiais para apoiar a cobertura da imprensa sobre o tema.

 

As tensões que as mulheres brasileiras enfrentam para poder dar conta da dupla jornada: o trabalho reprodutivo e trabalho remunerado; e o déficit de equipamentos sociais para apoiar a articulação dessas duas esferas de trabalho.

veronicaferreira soscorpoVerônica Ferreira – especialista do tema mulher e trabalho e pesquisadora do SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia. Tels.: (81) 3087.2086 / 9932.2794

“No Brasil, diante da falta de políticas públicas voltadas ao trabalho reprodutivo – como creches, educação pública integral, restaurantes populares – há um déficit de equipamentos sociais destinados a apoiar a articulação entre o trabalho reprodutivo e o remunerado. Diante dessa ausência de políticas públicas, uma parcela das mulheres que realizam atividades remuneradas recorreu à contratação de outras mulheres – as empregadas domésticas – para realizarem as tarefas de cuidar. As trabalhadoras domésticas, assim, têm sido fundamentais para garantir a ida de mulheres com um poder aquisitivo maior para o mercado de trabalho.

Mas as trabalhadoras domésticas também fazem parte do conjunto de mulheres que vivem a tensão permanente para articular o trabalho remunerado e o reprodutivo, e são as que mais sofrem com a falta de aparato social. Ou seja, as empregadas domésticas garantem o suporte para outras mulheres associarem essas duas esferas de trabalho, mas elas mesmas não contam com condições de dar conta dessas duas dimensões da vida. Estamos falando de uma das maiores categorias de trabalhadoras do país. Então, o primeiro grande impacto da PEC é justamente aliviar um pouco a dupla jornada para as próprias domésticas”. Leia mais

 

Creches e educação integral são essenciais; a urgência de regulamentar o direito à creche no local de trabalho.

MariaMaltaCampos pluricomMaria Malta Campos – pedagoga e pesquisadora da Fundação Carlos Chagas. Tel.: (11) 3723.3106 – Email: [email protected]

“Hoje há uma enorme demanda reprimida por vagas em creche nos grandes centros. É possível que boa parte dessas mulheres mães sejam trabalhadoras domésticas. Se não houver mais financiamento para as prefeituras, acho difícil imaginar que uma lei como a PEC possa influir significativamente no aumento da oferta de creches.

A nossa legislação já prevê a obrigação de o poder público oferecer creches a quem a demanda. Mas a creche como um direito social nunca foi regulamentada. Na realidade, muitas creches e berçários que existiam em empresas, públicas e privadas, foram fechados ao longo dos anos. Então esse é um aspecto que pode ser considerado neste momento: não estaria na hora de regulamentar esse direito à creche no local de trabalho, que ficou só no papel?

Outra questão importante tem a ver com o horário integral. Nem sempre o atendimento à criança pequena é em tempo integral. A maioria das pré-escolas para crianças de 4 e 5 anos funciona poucas horas por dia. Nos primeiros anos do ensino fundamental é a mesma coisa. Esse é outro tema que merece ser discutido neste momento”. Leia mais

 

Em questão as condições de permanência da mulher no mercado de trabalho

sirleioliveira dieeseSirlei Márcia de Oliveira – socióloga e coordenadora executiva da Escola Dieese de Ciências do Trabalho. Tel.: (11) 3874.5377 – Email: [email protected]

Acho que a PEC coloca um elemento em destaque: a realização do trabalho doméstico tem um custo. Isso talvez faça com que os homens e mulheres passem a olhar para essas atividades com outra preocupação.

A jornada extensa das mulheres que trabalham no mercado não é dupla, é tripla: ela tem que trabalhar, tem que cuidar da família e da casa, e ainda tem que se qualificar muito mais que o homem para garantir as mesmas condições no mercado de trabalho. Ela tem que provar e afirmar o tempo inteiro a sua capacidade para poder competir em condições de igualdade com os homens se desejar a ascensão profissional.

Com a aprovação da PEC, a gente traz à tona todas essas questões que estão relacionadas à permanência da mulher no mercado de trabalho: condições de ampliação da renda, valorização do trabalho no mercado e em casa, necessidade de compartilhar com a família as responsabilidades de manutenção da casa e cuidado dos filhos. Ou seja, todas as mulheres, não só as domésticas, vão pensar também a relação trabalhista delas no mercado de trabalho”. Leia mais

 

Trabalho doméstico precisa ser reconhecido e valorizado

AnaCarolinaQuirino AgenciaBrasilAna Carolina Querino, coordenadora do Programa de Promoção da Igualdade de Gênero e Raça no Mundo do Trabalho do Escritório da OIT no Brasil. Tel.: (61) 2106.4620 – Email: [email protected]

“O trabalho doméstico é uma atividade que não tem visibilidade, nem reconhecimento de valor. Então, mesmo que as domésticas realizem isso de forma remunerada, existe uma ideia geral equivocada de que as mulheres teriam um dom natural para desempenhar essas tarefas, e, uma vez naturalizado esse trabalho, cria-se uma noção também equivocada de que ele não exige desempenho, nem qualificação.

A PEC tem uma importância simbólica e prática muito concreta, porque elimina a distinção entre as trabalhadoras domésticas e outras categorias de trabalhadores. Agora, se a PEC por si só estimulará a formalização, eu acho que não, ela precisa ser acompanhada de outras medidas.

Uma ação que poderia contribuir de fato com o aumento da formalização seria trabalhar com a parte cultural, no sentido de promover a valorização do trabalho doméstico, tanto por quem realiza como por quem contrata. E também adotar medidas como as previstas na Convenção 189 da OIT, para facilitar os mecanismos de queixa e a inspeção para reforçar o cumprimento da lei”. Leia mais

 

Alguns dados:

>> Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), no Brasil há cerca de 7 milhões de empregados domésticos: 70% deles não possuem contrato de trabalho formalizado, e nove em cada dez são mulheres.

>> De acordo com a pesquisa Trabalho remunerado e trabalho doméstico – uma tensão permanente, feita pelo Data Popular em parceria com o SOS Corpo – Instituto Feminista pela Democracia:

– Sete em cada dez mulheres sentem que falta tempo no dia a dia, especialmente para cuidar de si.
– Três em cada quatro consideram sua rotina extremamente cansativa.
– Nos finais de semana 73% das mulheres realizam tarefas domésticas nas suas próprias casas.
– A falta de vagas em creches e a melhora no transporte para ir trabalhar foram apontadas como as principais demandas das mulheres para o poder público.

Veja essa pesquisa na íntegra em pdf: Trabalho remunerado e trabalho doméstico – uma tensão permanente.

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