24/11/2013 – Apesar das melhorias da última década, condição de vida dos brasileiros negros e pardos é bem pior que a da população branca

24 de novembro, 2013

(Correio Braziliense) O Brasil, se dividido pela cor da pele, seria dois países distintos. Um, formado por uma população branca, que ocuparia a 65ª posição no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Outro, de negros e pardos, estaria relegado ao fim dessa fila, no 102º lugar. Os dados evidenciam o tamanho e a persistência da desigualdade racial que ainda reina no país, a despeito de todos os avanços sociais da última década.

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Calculados pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com base no IDH da Organização das Nações Unidas (ONU), que põe o Brasil na 85ª posição numa lista de países ordenados de acordo com as condições de vida da população, os dois índices mostram que a longa distância que os separa exige ações concretas do governo e da sociedade para corrigir problemas históricos.

É evidente, também, que o Brasil mais pobre, de características preta e parda, que agrega 96,8 milhões de pessoas, está, aos poucos, rompendo barreiras importantes. Entre 2003 e 2013, esse grupo passou a dar as cartas no mercado de consumo. O potencial de gastos mais que dobrou – cresceu 136% -, saltando de R$ 509,3 bilhões para R$ 1,2 trilhão. No mesmo período, o avanço entre os não negros, conforme classificação do Instituto Data Popular, foi de 67%.

Ainda assim, falta muito, cerca de R$ 800 bilhões, para que os negros e os pardos alcancem o patamar de gastos do restante dos brasileiros, que, em 2013, será de R$ 2 trilhões. “A renda dos que ganham menos vem crescendo mais desde 2003. O país, porém, apresenta um grande índice de desigualdade. Temos mais negros na baixa renda do que na alta”, afirma Renato Meirelles, sócio-diretor do Data Popular.

Mesmo no topo da pirâmide, as cores da desigualdade são evidentes. O rendimento dos negros de classe alta representa apenas 28% dos gastos totais dessa camada da população. Na parcela classificada como média, negros e pardos respondem por 51% da renda. Na base, eles são donos de 68% do dinheiro despejado na economia todos os anos. “Essa desigualdade decorre, primeiro, da disparidade no mercado de trabalho”, explica Meirelles. Os brancos acabam sendo os escolhidos para os melhores postos, com remunerações maiores.

Andar de baixo

Pela métrica do IDH, e conforme as observações da pesquisa da UFRJ, o Brasil branco tem uma qualidade de vida semelhante à da Sérvia, que não tem “características de país de terceiro mundo”. O de negros e pardos fica entre as nações de IDH baixo, como o Turcomenistão, a Tailândia e a China, países que avançam rapidamente.

O estudo, elaborado pelo professor Marcelo Paixão, não prega o separatismo. Muito pelo contrário, evidencia a desigualdade racial que persiste nos indicadores de educação, saúde, segurança e renda. “O Brasil construiu uma naturalização de papéis sociais, que faz com que uma pessoa esteja condenada a uma posição por causa da cor da pele”, explica o professor. “Como é considerado normal que os negros ocupem o andar de baixo na sociedade, todos tratam como se fosse natural, como se não houvesse necessidade de mudar”, argumenta.

A construção da nova classe C, impulsionada pela distribuição de renda – principalmente por programas como o Bolsa Família e os reajustes do salário mínimo -, apesar de não ter sido montada com base em uma política direcionada para negros, beneficiou essa população e ajudou a amenizar as disparidades entre os brasileiros.

Dados do Data Popular reforçam que 75% das pessoas que ascenderam à classe média na última década são pretas e pardas e, hoje, somam 53 milhões. “A entrada do negro no universo do consumo melhorou a vida individualmente, mas não alterou a dinâmica das relações étnico-raciais, nem lhes deu total acesso à cidadania”, ressalta Meirelles.

O mercado de trabalho, no setor público e privado, ainda abre mais possibilidades à população não-negra. Dados do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revelam que o desemprego entre brasileiros pretos e pardos é maior que o registrado entre os brancos: 11,9% contra 9,2%.

Entre as mulheres negras, o índice é ainda pior, de 14,1%. “Elas sofrem o que chamamos de múltiplo preconceito por serem mulheres e negras”, justifica Mônica Oliveira, da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial. No funcionalismo público federal, a situação é semelhante. Os negros são 33% do contingente de servidores e ocupam as vagas de menor salário, justamente porque não tiveram acesso a uma boa educação para disputar postos mais bem remunerados. Cerca de 90% dos negros estão na escola pública.

Desemprego

Com opções limitadas de acesso à educação formal, os pretos e pardos também são os mais empurrados para a informalidade. “O número de empreendedores negros tem crescido, mas o problema é que ter o próprio negócio não foi uma escolha para boa parte deles”, pondera Mônica. “É diferente da pessoa branca, que vai por esse caminho porque enxerga uma oportunidade. As pessoas negras são obrigadas a se virarem porque são as vítimas maiores do desemprego”, avalia. O Correio, em uma série de reportagens publicada hoje, mostra esse Brasil que ainda tem dificuldades para oferecer condições de igualdade para todos os seus cidadãos.

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Acesse o PDF: As cores da desigualdade (Correio Braziliense, 24/11/2013)

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