(Centro de Direitos Reprodutivos) O Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher (Comitê CEDAW) aprovou um acordo com o Estado brasileiro sobre o pagamento das reparações financeiras à mãe da Alyne da Silva Pimentel
O governo brasileiro fez um acordo para o pagamento das reparações em conformidade com a primeira decisão das Nações Unidas de reconhecimento da mortalidade materna como uma violação de direitos humanos.
Quase três anos após o Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher das Nações Unidas (Comitê CEDAW) declarar que o Brasil era responsável pela morte de uma mulher negra e recomendar ao Estado que fornecesse acesso a serviços de saúde materna de qualidade sem discriminação, o Estado brasileiro pagará reparações à mãe da Alyne da Silva Pimentel.
De acordo com Nancy Northup, presidente e CEO do Centro de Direitos Reprodutivos (Center for Reproductive Rights), “Todas as mulheres têm direito a serviços de saúde materna quando necessitá-los, sem importar onde vivam, seu salário ou sua raça.”
“Negou-se repetidamente à Alyne a atenção médica requerida, o que desencadeou sua morte.”
“O Estado brasileiro deu o primeiro passo fundamental para cumprir a decisão das Nações Unidas, mas deve fazer mais para melhorar os serviços de saúde materna e eliminar a discriminação contra mulheres vulneráveis que requerem tratamento médico.”
Alyne, uma mulher negra de 28 anos que estava no seu sexto mês de gravidez de seu segundo filho, foi admitida em um centro de saúde privado em Belford Roxo com sintomas de náuseas em novembro de 2002. Apesar dos sinais de uma gravidez de alto risco, foi enviada a sua casa sem receber qualquer tratamento médico. Dois dias depois retornou à clínica privada em um estado de saúde agravado. Os médicos descobriram que o feto havia falecido e o retiraram, mas a saúde de Alyne continuou deteriorando. Ela foi encaminhada ao Hospital Geral de Nova Iguaçu após esperar oito horas por uma ambulância que fizesse sua transferência. A Alyne não recebeu qualquer tipo de atenção médica por mais de 21 horas. Em seguida entrou em coma e morreu no dia 16 de novembro de 2002, cinco dias após ter solicitado atenção médica pela primeira vez.
O Centro de Direitos Reprodutivos e a Advocacia Cidadã pelos Direitos Humanos interpuseram uma petição em representação da família da Alyne perante o Comitê CEDAW em novembro de 2007- o primeiro caso de mortalidade materna interposto perante um órgão de direitos humanos. O Comitê declarou que o Brasil era responsável pela violação dos direitos humanos da Alyne e ordenou ao Estado que provesse reparações individuais a sua família e implementasse medidas gerais para prevenir mortes maternas.
Desde a decisão do Comitê CEDAW no ano 2011, o Estado brasileiro tomou algumas medidas para implementar a decisão das Nações Unidas, mas ainda falta um longo caminho a percorrer. O Grupo de Trabalho Interministerial para a implementação das recomendações gerais do Comitê CEDAW foi criado para desenvolver um plano de trabalho e indicadores de cumprimento. Seu mandato venceu em outubro de 2013 sem que tivesse cumprido sua tarefa.
Em 28 de fevereiro de 2014, o Comitê CEDAW aprovou um acordo entre o Estado brasileiro e o Centro de Direitos Reprodutivos, como representante da família da Alyne, a respeito da compensação financeira que seria paga à mãe de Alyne. As reparações individuais para a filha da Alyne continuam pendentes. O Comitê CEDAW também determinou que o monitoramento do cumprimento das demais recomendações continuará, especialmente em relação às reparações devidas à filha da Alyne.
“O Estado brasileiro está dando um passo importante ao reconhecer que o sistema de saúde falhou para a Alyne e outras mulheres brasileiras vulneráveis”, disse Mónica Arango, diretora regional para a América Latina e o Caribe do Centro de Direitos Reprodutivos. “Permanece um caminho a percorrer para que sejam pagas as reparações financeiras à filha de Alyne e para que sejam criadas políticas públicas que melhorem os serviços de saúde materna para todas as mulheres sem discriminação.”
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, aproximadamente 800 mulheres morrem diariamente em todo o mundo por complicações associadas à gravidez. Um quarto de todas as mortes maternas na América Latina ocorre no Brasil e noventa por cento delas poderiam ser evitadas pela atenção pré-natal. Ainda que o Brasil tenha reduzido sua taxa de mortalidade materna na última década, a mortalidade materna persiste como a maior causa de mortes entre mulheres em idade reprodutiva, afetando de maneira desproporcional as mulheres com recursos escassos, negras, indígenas e aquelas que vivem em áreas rurais nas regiões norte e nordeste do Brasil.