(Revista Época, 26/05/2014) Um rapaz matou seis pessoas na Califórnia. Culpou as mulheres que rejeitaram seus avanços sexuais pelos crimes. Elas responderam pelo Twitter: a hashtag #YesAllWomen reúne casos de violência contra a mulher e reafirma seu direito de dispôr do próprio corpo como bem entender, à revelia dos desejos dos homens
O estudante Elliot Rodger, de 22 anos, matou a tiros seis pessoas em um campus universitário em Santa Barbara, Califórnia, na última sexta-feira (23). Sua motivação, segundo vídeos que o próprio Rodger publicou no youtube, seria vingança: ele queria que todas as garotas que o rejeitaram, e todos os garotos populares de quem ele sentia inveja, sofressem. Rodger esfaqueou três pessoas e baleou as outras três antes de se suicidar. As armas estavam registradas em seu nome.
O incidente levantou questionamentos óbvios, sobre a cultura armamentista nos EUA, que facilita o acesso a armas de fogo, e quanto à saúde mental do rapaz. Os comentários em vídeos deixados por Rodger também trouxeram à tona questões relacionadas ao papel desempenhado pela misoginia – o ódio contra as mulheres – no atentado.
Rodger era filho do diretor Peter Rodger, conhecido por trabalhar na produção de Jogos Vorazes. Vivia uma vida confortável, vestia-se bem, tinha uma BMW. Não entendia o motivo de ser rejeitado pelas garotas. Segundo ele, seus planos violentos foram resultado de anos de rejeição feminina. Aos 22 anos, ele se queixava de não ter uma namorada e ser virgem, apesar de se definir como “o mais perfeito cavalheiro”. As ações dele teriam sido influenciadas por grupos online de “defesa dos direitos dos homens”. Segundo o site Business Insider, Rodger era colaborador regular em um fórum de discussões online no qual homens se queixavam da falta de sorte com as mulheres, descritas como injustas por preterir seus avanços. Ofensas eram comuns. Os comentários e o fórum de que o Business Insider fala estão fora do ar. Já a conta de Rodgers no youtube mostra que ele acompanhava diversos canais de vídeos destinados a ensinar homens a se sair bem com as mulheres, driblando sua resistência aos avanços masculinos. Um dos vídeos ensina como conquistar uma mulher em uma festa e levá-la para casa em 5 minutos. O método inclui puxá-la pelos pulsos.
Em seu vídeo manifesto, publicado dias antes dos assassinatos, Rodger diz que “pelos ultimos 8 anos, desde que atingi a puberdade, sou forçado a suportar uma vida de solidão, rejeição e desejos não realizados. Tudo porque as garotas nunca estiveram atraídas por mim”. Desde então, grupos da internet afirmam concordar com ele. “Imagine se uma das garotas que o rejeitou tivesse saído com ele ao menos uma vez. Então toda essa tragédia teria sido evitada”, afirma uma página no Facebook. Outro grupo, destinado a celebrar sua memória, afirma em uma postagem: “Não fosse pelas feminazi (um termo que mistura “nazistas” com “feministas”, usado para definir feministas consideradas radicais) que rejeitaram Elliot Rodger, isso nunca teria acontecido. Elliot foi o único com coragem o bastante para opor-se às fascistas feministas que tentaram reprimir seus diretos de homem em uma sociedade patriarcal. As feminazis devem aprender seu lugar e calar suas bocas”.
Pelo twitter, as pessoas reagiram. Acompanhados pela hastag #yesallwomen (algo como “sim, todas as mulheres”), usuários de ambos os sexos compartilharam histórias destinadas a por por terra a versão de que as mulheres que rejeitaram Rodger seriam as responsáveis pelos seus crimes. São postagens que falam sobre assédio e violência contra a mulher em situações cotidianas e sobre a desigualdade de gênero. A hashtag começou a ser usada por uma blogueira muçulmana de nome Kaey na noite de sábado (24). Desde então, tornou-se uma das mais reproduzidas no twitter. “Vou começar a tuitar com a hashtag #yesallwomen. Vamos discutir aquelas coisas que nem todos os homens fazem, mas todas as mulheres temem”, disse ela pelo twitter.
Acesse no site de origem: “Sim, todas as mulheres”: como o Twitter reagiu ao atentado na Califórnia (Revista Época, 26/05/2014)