Mulheres têm voz sufocada pela violência e pelo boicote eleitoral

03 de outubro, 2014

(Brasil de Fato, 03/10/2014) Entre janeiro e junho deste ano, a Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180, recebeu 265.351 notificações. Das denúncias, 30.625 foram de violência, sendo a mais recorrente a física, com 15.541 casos. Ainda estão entre os principais relatos das vítimas a violência psicológica (9.849 relatos); moral (3.055 relatos) e sexual (886 relatos).

Os dados se tornam mais perversos e alarmantes quando 77,16% das mulheres em situação de violência revelam que sofrem agressões todos os dias ou semanalmente.

Sem ver suas questões pautadas nas esferas do poder ou na mídia, o coletivo “Nós, mulheres da periferia” busca ser um canal de informação para todas aquelas que se sentem invisíveis dentro desse cenário. Lívia Lima, uma das organizadoras do coletivo, explica que dar visibilidade é uma forma de fortalecer as mulheres.

“O que a gente tenta é ser um veículo que possa informar as mulheres sobre os direitos delas, por meio de serviço, políticas públicas e divulgar esses direitos que a gente tem, cobrar também a partir de denúncias de irregularidades. E também dar visibilidade para aquelas mulheres que estão atuando, mostrar um pouco o que elas fazem, seja no poder público ou nos movimentos.”

O coletivo acabou se transformando em uma ferramenta de denúncia da violência doméstica e do abuso sexual. São oito jornalistas e uma designer, todas moradoras de bairros da periferia da cidade de São Paulo, engajadas no combate às desigualdades de gênero.

Há ainda muita luta a ser feita. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que no ano passado as mulheres receberam, em média, 73,7% do salário dos homens. O rendimento médio deles foi de R$ 1.890 por mês, enquanto elas receberam R$ 1.392.

Sub-representatividade

Embora as lutas sociais tenham ganhado destaque, sobretudo nas redes sociais, o papel das organizações populares é muito limitado, e consiste basicamente em identificar violações, denunciá-las e pressionar órgãos públicos e governantes. Apelo que quase nunca é ouvido, tornando indispensável a participação das minorias nos espaços institucionais.

Apesar de representarem 51,04% da população brasileira, menos de 9% dos parlamentares que ocupam o Congresso Nacional são mulheres. Desequilíbrio que terá continuidade na próxima legislatura, já que nas eleições deste ano dos 25.919 candidatos, apenas 8.008 (30,90%) são mulheres.

Recentemente, estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) demonstrou que a maior parte dos partidos apenas cumpre a definição legal de cotas mínimas de 30% para mulheres.

Desde 2009, com a sanção da Lei n° 12.034, tornou-se obrigatório que cada partido ou coligação preencha o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. A assessora política do Inesc Carmela Zigoni explica as fragilidades do procedimento.

“Nas eleições desse ano tem um grupo de mulheres que se candidatou, está concorrendo, mas elas têm 20 anos. Então, os partidos têm um recurso alegando que na posse elas vão ter 21 anos, mas você tem uma porcentagem de candidaturas de mulheres que já está em risco de ser indeferido.”

Entre as causas da sub-representatividade das minorias, Carmela chama atenção para o financiamento privado de campanhas. Ela pontua o desequilíbrio gerado por esse modelo em que grupos econômicos buscam apoiar candidatos que depois defendam os seus interesses no Parlamento.

“Tem uma parcela dessas candidaturas que não tem recursos financeiros para fazer campanha, por isso que a gente quer discutir a reforma política. A maioria das candidatas é a que tem menos recursos, menos exposição da mídia. Então, não consegue chegar também ao eleitor”, observa.

A opressão de gênero foi amplamente discutida no 9º Encontro Internacional da Marcha Mundial das Mulheres, realizado no final de agosto de 2013. Durante uma semana de debates e oficinas, que reuniu 1,6 mil representantes de 48 países na capital paulista, o movimento fechou uma pauta unitária de luta.

No documento final, as mulheres destacaram, entre outras defesas, o direito ao aborto legal, seguro e público, além de exigirem a aplicação plena da Lei Maria da Penha.

Daniele Silveira.

Acesse no site de origem: Mulheres têm voz sufocada pela violência e pelo boicote eleitoral (Brasil de Fato, 03/10/2014)

 

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