(Folha de S. Paulo, 03/11/2014) Penitenciárias femininas paulistas proíbem namoros e só liberam o contato íntimo entre as presas depois do casamento, atestam advogados que defendem mulheres condenadas.
Por conta dessas restrições de comportamento, uniões como a de Suzane von Richthofen, revelada pela Folha na semana passada, são comuns.
Suzane, condenada por matar os pais, cumpre pena em uma das duas penitenciárias do município de Tremembé, no Vale do Paraíba. Na mesma região, em São José dos Campos, há um centro de ressocialização de regime semiaberto.
Nas três unidades, a união não costuma ser oficializada em cartório, mas pela direção do presídio, de acordo com advogados com clientes presas. Uma vez casada, a detenta dorme em cela especial com sua companheira, ao lado de três a cinco casais.
Nessas celas, como em qualquer outra da unidade, as camas são feitas de colchões finos para uma só pessoa. A diferença é que são isoladas por lençóis pregados com barbantes chamados de “quietos”, abreviação de “come quieto”, conta a advogada Viviane de Carvalho.
Bilhetinhos são vetados pela administração penitenciária, mas muitas paqueras começam com “pipas”, as cartas entre presas entregues clandestinamente.
A orientação sexual de uma mulher em geral é respeitada. Se uma presa se declarar heterossexual, não receberá “pipa”, segundo Carvalho, que trabalha para detentas dessas unidades. No entanto, é comum que mulheres casadas com homens quando livres passem a se relacionar com detentas depois de presas, afirma.
Em muitos casos, isso acontece porque as visitas a penitenciárias femininas são escassas. Sentindo-se sozinhas, presas se envolvem com colegas com mais naturalidade, opinam advogados, um padre e dois defensores públicos ouvidos pela Folha.
HÁBITOS E COSTUMES
O grande número de casamentos na cadeia provocou a criação de regras de conduta pelas próprias presas. Na hora do banho, por exemplo, as mulheres devem circular com toalhas que cubram sua visão para evitar o ciúmes de companheiras.
Uma briga mais acalorada pode ser considerada falta grave pela direção da cadeia, levando à regressão de pena.
Como o acesso a bens materiais é restrito, dificilmente uma presa pode oferecer um presente à sua parceira. Agrados oferecidos são, por exemplo, serviços advocatícios.
O advogado William Telles relata que uma cliente presa em Tremembé pagou R$ 1.500 para que ele cuidasse de um processo administrativo contra sua companheira.
Os casamentos também fazem bem à autoestima das presas. Nas penitenciárias de Tremembé, onde detentas trabalham, o salário é gasto em parte com a compra de produtos de beleza.
Esmaltes, lixas, lâminas para depilar e tintas de cabelo são objetos presentes nas listas mensais de compras. Como nenhum produto que contenha álcool é permitido, a acetona, para remover esmaltes, é substituída por óleo de banana.
Apesar de todas as restrições, casais põem à prova sua lealdade atrás das grades. Segundo o advogado Telles, há alguns meses uma presa em Tremembé pediu para ficar na cela de isolamento com a parceira enquanto ela tivesse que cumprir o castigo por desacato.
A Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo afirmou, em nota que na penitenciária feminina Santa Maria Eufrasia Pelletier, de Tremembé, onde Suzane cumpre pena, “as presas que tiverem interesse nessa união devem manifestar essa vontade por escrito, a qual será analisada pela área de segurança da unidade penal, apenas sob o ponto de vista de segurança e disciplina”.
“O ‘termo de compromisso para fins de união celular’ é solicitado pela direção da unidade penal. Esse documento é meramente administrativo e não produz nenhum efeito legal.”
Thais Bilenky
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