(O Estado de S. Paulo, 23/11/2014) Levantamento realizado pelo Estado com os deputados federais eleitos aponta para itens de uma possível reforma política que contariam com o apoio da maioria do Congresso. São eles o fim da reeleição, a unificação do calendário eleitoral, a proibição das coligações partidárias para o Legislativo e a adoção de cláusula de desempenho para as legendas. Em contrapartida, o financiamento público das campanhas aparece como a medida que mais encontra resistência.
A partir das sete perguntas elaboradas para a enquete, a proposta de maior aceitação entre os 341 deputados que responderam ao questionário – de um total de 513 parlamentares – foi o fim da reeleição para cargos executivos. A medida foi defendida por dois dos três principais candidatos à Presidência – Aécio Neves, do PSDB, e Marina Silva, do PSB.
Hoje, 278 parlamentares reeleitos ou novatos se dizem favoráveis a essa mudança. Outros 63 afirmaram ser contra à proposta, que não foi defendida abertamente pela candidata vencedora ao Planalto, Dilma Rousseff. A petista, porém, se disse disposta, durante a campanha, a discutir o assunto. A reeleição foi instituída por emenda do Congresso em 1997, no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso.
Esse volume de votos ainda é inferior aos 308 exigidos para mudar novamente a Constituição – o número corresponde a 60% do total de deputados da Câmara. Os 278 votos representam, porém, 81% de todos os parlamentares entrevistados. Essa tendência foi constante ao longo da enquete. O tema também foi o único no qual nenhum entrevistado se absteve.
Outras duas propostas obtiveram adesão semelhante. A adoção da cláusula de desempenho foi apoiada por 274 entrevistados. A medida restringiria o acesso ao Fundo Partidário a siglas que não obtivessem um mínimo de votos. Ela chegou a ser aprovada pelo Congresso em 1995, mas foi julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Juristas consideram que a medida depende de emenda constitucional para que entre em vigor.
Outra medida bastante apoiada, com 273 votos, é a unificação das eleições municipais, estaduais e presidencial num mesmo ano – hoje, os eleitores vão às urnas a cada biênio e as eleições para prefeito e vereador são realizadas separadas das demais. O tema também foi defendido por Aécio e Marina, mas rejeitado por Dilma e por 64 deputados eleitos.
Coligações. O fim das coligações proporcionais obteve adesão de 270 deputados, ou 79% dos entrevistados que responderam a essa questão. Outros 64 foram contra e 7 não souberam opinar. A medida é vista como fundamental para evitar distorções na representação parlamentar: pelo atual sistema, os partidos podem se unir na disputa por vagas do Legislativo e, depois, atuarem de forma independente. Assim, o eleitor dá o voto para uma legenda, mas ajuda a eleger o candidato de outra sigla.
Na atual proposta de reforma política em discussão no Congresso, os parlamentares discutem a criação da federação partidária, como contrapartida à defesa da cláusula de desempenho. Partidos menores poderiam se unir na disputa eleitoral, mas seriam obrigados a atuar de forma conjunta pelos próximos três anos – caso contrário, seriam barrados pela cláusula de desempenho.
Com menor adesão, mas próxima da maioria dos 513 deputados, o fim do chamado foro privilegiado para autoridades tem apoio de 257 parlamentares. Isso permitiria abertura de processo contra políticos sem depender de autorização do STF. Os defensores do foro privilegiado – 76 votos – alegam que, na primeira instância, haveria maior risco de perseguição política.
O ponto que mais divide os deputados ouvidos é o financiamento de campanha. Na enquete, 182 se disseram favoráveis ao uso exclusivo de verba pública e 151, contra esse modelo. O STF julga a ação movida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que tenta barrar a doação de empresas aos candidatos e aos partidos, por considerá-la inconstitucional. A análise permanece suspensa por um pedido de vistas.
A única questão feita com múltipla escolha é a relacionada ao sistema de votação. A exemplo da cláusula de desempenho, foi a que mais houve abstenção: 13 entrevistados. Entre os cinco modelos que poderiam ser votados, o de maior adesão (30%) é o distrital misto, pelo qual metade da Câmara é eleita em lista definida pelos partidos, de forma proporcional, e metade em distritos eleitorais, nos quais o mais votado ganha a vaga. Esse modelo é o preferido da maioria dos tucanos. Em seguida vem a proposta de “distritão” defendida pelo vice-presidente da República e presidente do PMDB, Michel Temer.
O modelo majoritário, na qual os mais votados são eleitos, obteve 27% de apoio. A proposta de maior aceitação entre petistas – proporcional com lista fechada – foi apoiada por 12% dos entrevistados, mesmo porcentual dos que preferem o sistema distrital puro. O atual modelo – proporcional com lista aberta – ficou com 14% da preferência.
Como foi feita a enquete
A enquete foi realizada eletronicamente e por telefone. Por e-mail, a reportagem enviou o link para um formulário criado no Google Forms, que poderia ser respondido pelo deputado ou por um assessor.
Dos 513 parlamentares que tomam posse em fevereiro, 341 responderam às perguntas – seis com opções Sim ou Não e uma de múltipla escolha – e 72 informaram não querer opinar. Outros 84 eleitos foram contatados por e-mail ou por telefone, mas suas respostas não chegaram ao Estado até sexta-feira, e 16 não foram localizados.
Ajudaram a realizar a enquete alunos do Curso Estado de Jornalismo: Ana Cristina Mazeo, Ana Paula Mansur, Diego Moura, Luiz Felipe Barbiéri, Luana Assis, Maria Eduarda Chagas, Maria Tereza Matos, Mariana Goulart Hueb, Mariana Naviskas, Marília Marasciulo, Mateus Luiz de Souza, Natália Cacioli, Raquel Brandão, Raul Galhardi, Stéfano Mariotto de Moura, Thiago Sawada e Tulio Kruse.
Iuri Pitta, Ricardo Chapola, Valmar Hupsel Filho
Acesse o PDF: Levantamento mostra reforma política possível (O Estado de S. Paulo, 23/11/2014)