Vídeos acirram debate antiaborto nos EUA

23 de julho, 2015

(Folha de S. Paulo, 23/07/2015) Gravações com câmeras ocultas são usadas para acusar organização de planejamento familiar de lucrar com fetos

Congresso investigará material feito por grupo conservador; entidade diz que meta é pesquisa e nega ganhar dinheiro

A disputa entre grupos contra e a favor do direito ao aborto nos Estados Unidos subiu de tom com a divulgação de dois vídeos controvertidos nos últimos dias.

A partir das imagens, representantes da organização Planned Parenthood (algo como “paternidade planejada”, que presta assistência à saúde de mulheres, faz campanhas educativas e distribui anticoncepcionais) estão sendo acusadas por ativistas antiaborto de vender partes de fetos para pesquisa e lucrar.

Num dos vídeos, a diretora de serviços médicos da Planned Parenthood, Deborah Nucatola, aparece durante um almoço discutindo em detalhes como podem ser recolhidas para pesquisa partes de fetos abortados.

Em outro divulgado nesta semana, que causou mais polêmica, a diretora de uma clínica da organização na Califórnia, Mary Gatter, fala em preços com um ativista que finge ser um interessado.

Ambos os vídeos foram editados –o segundo, de 162 para nove minutos– e produzidos com câmeras ocultas pelo Centro para o Progresso Médico, organização pouco conhecida antes do episódio.

Após sua divulgação, três comissões do Congresso e políticos de vários Estados anunciaram que abrirão investigações para apurar a veracidade das alegações.

A lei federal dos EUA proíbe a comercialização de tecidos fetais, mas permite sua doação sem fins lucrativos para pesquisa se houver o consentimento das mulheres.

Nos vídeos, representantes da Planned Parenthood discutem valores entre US$ 30 e US$ 100 por espécime. Em resposta oficial divulgada em vídeo, a organização afirma que se trata de custos de armazenamento e transporte, o que não seria ilegal.

Eric Ferrero, porta-voz da instituição, negou as acusações de comercialização de fetos e disse que os vídeos foram produzidos por “um grupo de extremistas que intimidou mulheres e médicos durante anos em sua campanha para banir o aborto”.

Em carta à Comissão de Energia e Comércio da Câmara, a Planned Parenthood afirma que as imagens foram orquestradas pelo ativista antiaborto David Daleiden e que ele teria milhares de horas de filmagem com câmeras ocultas feitas desde 2007.

Daleiden, por sua vez, afirmou em uma nota que o desmentido da organização é “uma mentira desesperada”.

PESQUISA

A prática de recolher tecidos fetais para pesquisa é defendida pela Planned Parenthood como contribuição para avançar a pesquisa de tratamentos médicos para doenças como o mal de Alzheimer.

Vários políticos republicanos pediram que o Congresso investigue o caso, incluindo o pré-candidato presidencial Jeb Bush.

Para Bush –cujo irmão George, enquanto presidente, limitou fundos federais para pesquisas com células embrionárias–, o episódio levanta dúvidas sobre o financiamento federal a grupos com “uma agenda política”.

“É perturbador para mim que alguém venda partes de corpos”, disse Bush.

Em editorial nesta quarta (22), o “The New York Times” faz duras críticas aos vídeos contra a Planned Parenthood e acusa os políticos conservadores de pegarem carona em falsas afirmações para reforçar a campanha antiaborto.

“Os políticos que defendem o corte de fundos à Planned Parenthood não se importam com a verdade e têm apenas interesse em minar os direitos reprodutivos das mulheres a qualquer custo.”

A Planned Parenthood teve 41% de suas receitas, de US$ 1,3 bilhão em 2014, vindas do governo.

Marcelo Ninio

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