(Mídia News, 25/01/2016) A violência contra a mulher é um problema cultural e vem afligindo a humanidade através dos séculos.
A grande repressão sexual, exacerbada a partir do século V até o século XV, reafirmou no inconsciente coletivo a mulher como coisa, nunca levando em conta os seus próprios desejos. Isso porque, desde a pré-história, e depois passando pelos gregos e romanos, as sociedades eram predominantemente hedonistas, colocando o prazer como mote prioritário de vida.
Com a queda do império romano e o advento do cristianismo, inicia-se um ciclo de ausência absoluta de individualidade e luta contra as tentações.
Amar, só a Deus. A teoria do pecado original foi maciçamente difundida.
A partir do século XII, com o renascimento, aparece o amor cortês, sempre exaltando os prazeres do espírito em detrimento aos prazeres da carne. A verdadeira mulher amada deveria ser inatingível ao toque e apenas venerada como uma deusa. Apenas aí, o amor já se cogita como recíproco.
Os últimos três séculos foram impregnados por todos esses conceitos arcaicos, que faziam do sexo algo abominável. Até os dias de hoje, homens e mulheres ainda sofrem muito com seus medos, culpas e frustrações.
Até 1950, a virgindade ainda era um valor. Apenas entre 1960 e 1980, a verdadeira revolução sexual foi exercida, já que a pílula anticoncepcional estava presente e ainda não havia o HIV.
A partir do século XX, com o aparecimento dos grandes movimentos feministas e as grandes mudanças econômicas mundiais, a mulher consegue entrar definitivamente no mercado de trabalho em todos os setores e inicia assim o seu processo de “descoisificação”.
Entretanto, os estigmas de tantos séculos de opressão, não são assim removidos tão facilmente quanto gostaríamos.
Por outro lado, a mulher, despreparada para essa nova situação, começou a confundir liberdade com libertinagem, extrapolando comportamentos agressivos, tidos como masculinos, nunca antes exercidos e, principalmente, para os quais os homens não estavam programados.
Paralelamente, o mercado de consumo, ávido de novos lucros, jogou na sociedade a propaganda de um erotismo exagerado e a tudo vinculado. Nem as crianças escaparam desse projeto, sendo desde muito cedo estimuladas por suas mães a se tornarem miniadultas, através de roupas e comportamentos inadequados para a idade.
Agregado a tudo isso, a divulgação maciça de músicas com letras e coreografias sempre um forte apelo sexual.
Seios e bundas siliconadas, graças a esse grande mercado erótico, são oferecidos abertamente a preços módicos e suaves prestações mensais, servindo de desejo a mentes mais desavisadas, principalmente as jovens.
A indústria pornográfica já é a terceira maior em crescimento no mundo.
A violência familiar, exacerbada pelas drogas, legais e ilegais, só faz crescer. Campanhas de descriminalização progressivas e sérias, como as que vêm sendo feitas pelos países mais desenvolvidos, não conseguem se sobrepor aos interesses de pequenas minorias que obtém grandes lucros com esse mercado.
Diante de todo esse quadro, no mínimo propício, não é de se admirar que os instintos animalescos, escamoteados pelas leis sociais, estejam recrudescendo com tanta intensidade e frequência. A violência e os casos de estupro, em todas as partes do mundo, têm aumentado, e muito. Países superdesenvolvidos como, por exemplo, a Inglaterra, já mostram níveis assustadores desses casos, apesar das altas penas infringidas aos infratores.
Aprendemos desde muito cedo que onças não devem ser cutucadas com vara curta e sempre que a sociedade se torna muito permissiva, a barbárie começa a imperar.
Já vimos isso inúmeras vezes na história e sabemos os resultados desastrosos que daí advém.
Os conceitos de amor não são imutáveis e o histórico da humanidade está aí para nos comprovar isso.
A nossa vida sexual afetiva está sempre condicionada a atuações do inconsciente cultural e social.
Gabriel Novis Neves é médico em Cuiabá, foi reitor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)
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