Lei do Feminicídio completa um ano com condenações ao assassinato de mulheres

08 de março, 2016

(Portal Brasil, 08/03/2016) Governo e ONU Mulheres trabalham para definir elementos criminais que irão nortear investigações, julgamentos e condenações do feminicídio

Um ano após a entrada em vigor da Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104), as primeiras condenações pelo assassinato brutal de mulheres começam a indicar o fim da impunidade na espiral de violência contra o sexo feminino.

Leia também: Com mulheres mais confiantes, queixas de cárcere privado sobem 325% (Portal Brasil, 08/03/2016)

A aplicação da norma se junta à lei Maria da Penha e às políticas criadas para prevenir e punir atentados, agressões e maus-tratos, em uma demonstração do empoderamento das mulheres.

Para avançar na punição aos responsáveis e ampliar a aplicação da nova lei outras medidas estão em curso.

Numa importante linha de ação, está em definição as diretrizes e os elementos desse tipo de crime que irão nortear as investigações, os julgamentos e as condenações do feminicídio. A definição desse padrão está sendo feito pelo governo brasileiro em conjunto com a ONU Mulheres.

“Fechamos cinco Estados mais o Distrito Federal, conjuntamente com a ONU Mulheres, para trabalharmos essas diretrizes”, informa a secretária de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Aparecida Gonçalves.

“Não basta fazer a lei e soltar para os investigadores. É preciso que os investigadores saibam quais são os elementos que irão caracterizar o crime de feminicídio”, complementa.

A definição desse padrão de procedimento nas investigações do assassinato de mulheres está inicialmente sendo feita no Maranhão, Piauí, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro e no Distrito Federal.

A ação envolve juízes, promotores e defensores da vara criminal e de delegados e delegadas de homicídios.

Delegacia especializada em feminicídio

 Em outra medida, Aparecida Gonçalves cita a criação no Piauí da primeira delegacia especializada em crimes de feminicídio.

“O Piauí tem mostrado ser uma referência nisso”, disse. Ela destacou que está em curso também nesse estado a criação de um departamento específico de investigação de crimes contra as mulheres na estrutura do governo estadual.

No ano passado, o Piauí registrou três crimes bárbaros contra mulheres que chocaram o País: o estupro coletivo de quatro adolescentes feito por três menores e um adulto; o espancamento até à morte de uma menina de 3 anos na frente das irmãs feito pelo tio; e o estupro de uma mulher idosa morta em decorrência da violência.

Punição severa para feminicídio

A fim de inibir esses crimes, a Lei do Feminicídio trouxe a possibilidade de um agressor ser julgado levando em consideração múltiplos crimes, que elevam bastante a pena, deixando claro que ele será severamente punido.

Em um dos três crimes ocorridos no Piauí no ano passado, no do espancamento até a morte de uma menina de 3 anos, o réu, o tio da vítima, foi julgado e condenado a 63 anos. A pena foi decidida com base em 10 crimes, entre os quais o de homicídio triplamente qualificado e cárcere privado.

No estupro coletivo das quatro adolescentes, a pena do adulto que participou do crime junto com outros três adolescentes pode ultrapassar 100 anos justamente pelo fato de vários crimes terem sido cometidos simultaneamente.

“A lei do feminicídio alterou o Código Penal e ampliou os agravos. Então, o réu será condenado por violência sexual, pela tortura. Há, nesses casos, vários elementos que fazem a condenação ser maior”, lembra a secretária de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres.

Vítimas

Nos dados mais recentes, o Mapa da Violência edição de 2015 mostra que, entre 1980 e 2013, 106 mil mulheres morreram vítimas de homicídio.

Em 1980, 1.353 mulheres foram assassinadas, o correspondente a 2,3 mulheres para cada grupo de 100 mil habitantes.

Já em 2013, 4.762 foram mortas num número que fez a taxa subir para 4,8 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes.

O aumento das mortes é explicado, em boa medida, pela impunidade, diz a professora de direito constitucional da Universidade de Brasília, Janaína Penalva.

“A Lei do Feminicídio e a Lei Maria da Penha são legislações que surgem, e surgem atrasadas, para demonstrar que a violência contra a mulher é uma questão de direitos humanos e para fortalecer a responsabilização legal em relação a isso”, diz a professora.

Em um dos casos mais brutais, ela lembra o assassinato de Eliza Samudio a mando do goleiro Bruno Fernandes e executado por Luiz Henrique Romão, o Macarrão.

Eliza desapareceu em 2010 e seu corpo nunca foi encontrado. Ela tinha 25 anos e era mãe do filho recém-nascido do goleiro Bruno de que foi amante. Na época, o jogador era goleiro do Flamengo e não reconhecia filho. Bruno e Macarrão cumprem pena de 24 anos e de 16 anos, respectivamente.

Com a Lei do Feminicídio completando um ano, Janaína Penalva lembra ser necessário que o poder público passe a reunir e divulgar os dados desse tipo de crime.

“É preciso que a gente investigue e esperamos isso do poder público: que informe sobre quantidade de denúncias do ministério público e de condenações pelo crime de feminicídio.”

Segundo ela, também é importante ver como as varas do tribunal do júri se organizaram para lidar com esse novo crime, como o ministério público tem se posicionado nas denúncias de homicídio de mulheres e como as ocorrências tem sido interpretadas.

“Muitas vezes a violência que as mulheres sofrem não é investigada e punida e a lei do feminicídio é uma tentativa de fortalecer os direitos das mulheres.”

Fontes: Secretaria de Políticas para Mulheres e Universidade Federal de Brasília (UnB)

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