(SDH, 26/04/2016) Amor, carinho, compreensão e liberdade são palavras que o coletivo “Mães pela diversidade” buscam ao ajudar o próximo após perderem seus filhos, assassinados por conta da homotransfobia. Composto em sua maioria por mães e pais de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, o grupo surgiu há pouco mais de um ano, em São Paulo, e se expandiu para 15 estados. Segundo seus organizadores, a iniciativa surgiu como um movimento político para lutar pela garantia de direitos civis. No entanto, com o decorrer das atividades executadas, perceberam-se como um espaço de acolhimento e informação para outras mães e pais de LGBTs. Os integrantes do coletivo participam em Brasília das Conferências Conjuntas de Direitos Humanos, organizadas pela Secretaria Especial de Direitos Humanos do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos.
Integrante do “Mães pela diversidade”, a aposentada Angela Moyses afirma que é fundamental o apoio das mães e dos pais no dia a dia de filhos LGBTs para que se sintam amados e consigam superar o preconceito diário que vivem. “Não queremos que nossos filhos virem estatística nem que apareçam nas páginas dos jornais. Queremos que nossos filhos sejam felizes, possam amar e beijar quem quiser”, acrescentou.
A professora Marise Felix conta que os jovens são os que mais procuram as mães. “Eles nos veem como mães porque os acolhemos. Por um lado, é um trabalho difícil porque ocupamos um espaço que não é nosso e a maioria é bem triste”, diz.
Colcha de retalhos
Para homenagear as vítimas de homofobia, as mães fizeram uma colcha de retalhos coloridas com os nomes de cada vítima da violência no Brasil. Elas já participaram de Paradas do Orgulho LGBT e o trabalho não para. “Conversamos todos os dias pela internet ou aplicativos de celular. Não vamos parar. Todos são nossos filhos”, conclui Marise.
Depoimentos de pais e mães sobre a descoberta
Marise Felix, professora
“Eu descobri minha filha. Eu estava muito preocupada porque ela era uma adolescente totalmente diferente dos outros e dos irmãos também. Ela é minha caçula. E não conversava com ninguém, não tinha amigos, não tinha nada. Até que um dia a minha filha mais velha falou assim: Mãe, você não percebeu ainda que ela é gay? Ela até usou essa expressão “gay”. E eu falei que não tinha percebido. Falei que minha filha não era, mas é claro que a gente tem que parar para pensar. No outro dia eu fui conversar com ela, arrumei uma mesa de café bem bonita, esperei que estivéssemos sozinhas e comecei a conversar. Disse que estava preocupada, que ela estava chorosa, que a via conversando muito na internet com aquele menino e que aquele menino estava fazendo muito mal para ela. Minha filha dizia o tempo todo que eu não ia entender. Daí, olhei para ela e perguntei: Você acha que eu não vou entender o por quê? Acha que não vou entender porque ele não é ele, é ela? E então minha filha levantou a cabeça e perguntou como eu sabia? Afirmei que não sabia, mas se era isso, isso na minha casa não é problema. O problema era eu ver minha filha daquele jeito. Agora, ela gostar de uma menina não era problema. E a partir de então tudo mudou, aquele acolhimento da família fez com que ela ficasse melhor. Isso é amor”.
Josiane Marconi, especialista em gênero e diversidade
“Eu sou mãe de uma lésbica que hoje tem 19 anos e já mora com a namorada há três anos, mas desde novinha eu já percebia. Quando ela fez 14 anos eu perguntei: E aí? E ela pediu para ter calma. Eu não queria que ela perdesse a adolescência dela, que é a melhor fase da gente. Então, eu fiz um caminho inverso. Eu a levei ao psicólogo para que ela pudesse se descobrir, mas ela não falou e resolvemos dar o tempo dela. Um dia, ela me pediu que a levasse ao shopping porque havia conhecido uma menina. Ela conheceu outras pessoas, até que conheceu essa pessoa que está hoje. Eu tenho uma filha de sete anos que brinca de bonecas. Um dia elas são amigas, outros irmãs e até mesmo namoradas. O que importa é a gente ser feliz. Quando tem amor, é isso que importa”.
Alvelino Mendes, agrimensor
Seu Alvelino perdeu o filho em 2012 após o rapaz ter sido espancado e ter tido o corpo jogado ao mar de Recife.
Meu filho saiu do armário por volta dos 16 anos. No início a reação foi de todo pai criado nessa sociedade que ensina para nós que isso é errado, mas como a gente sempre teve um relacionamento muito bom, isso logo foi superado. E, em um determinado momento, a família passou a ser toda militante junto com ele. A mãe dele não o deixava de lado hora nenhuma, ele fazia faculdade de jornalismo e criou um movimento chamado “Colcha de Retalhos”, que era um grupo LGBT dentro da Universidade Federal de Goiás. Durante 12 anos, a minha casa se tornou um, como meu filho dizia, um albergay. A minha casa estava sempre cheia. Mas no dia 18 de novembro de 2012, ele participava de um torneio de vôlei em Recife, saiu à noite para comprar cigarro e foi brutalmente espancado e jogado no mar, onde ele acabou morrendo afogado. A mãe dele tinha falecido há dez meses. A partir desse triste acontecimento, eu que militava menos na família, assumi essa tarefa. Minha luta é para que os pais saiam do armário. Porque eu vejo que um pai que não sai do armário assina o atestado de óbito do filho. E eu como falo para eles, a minha luta não é por eles. É para que nenhum pai tenha que cumprir a missão dolorosa que eu tive de buscar após perder meu filho. Eu o deixei andando no aeroporto e busquei os restos mortais”.
Assessoria de Comunicação Social
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