(UNFPA Brasil, 26/04/2016) O UFNPA Brasil participou na sexta-feira (22), do 9º Seminário “A Mulher e a Mídia”, do Instituto Patrícia Galvão, em São Paulo (SP), que neste ano teve o tema “Mídia, Zika e Direitos das Mulheres”. Fernanda Lopes, Representante Auxiliar do Fundo de População participou do painel “Acesso à informação e planejamento reprodutivo no contexto da zika”, ao lado da diretora de pesquisa do Data Popular, Maíra Saruê, a neuropediatra, Ana Van Der Linden e a socióloga Jacqueline Pitanguy. O momento foi mediado pela coordenadora da RadioAgência Nacional EBC, Juliana César Nunes.
Fernanda destacou a importância do foco não ser apenas no vetor, o mosquito, mas também nas mulheres e, sobretudo, na “centralidade do direito da escolha informada, voluntária, livre de coerção, disseminação e qualquer tipo de violência para com as mulheres, em relação ao planejamento da sua vida reprodutiva”.
A Representante Auxiliar colocou ainda necessidade de trazer as mulheres para o centro da resposta à epidemia do zika vírus. “O desfecho em saúde pública que estamos vivendo e o fato da epidemia das arboviroses estarem crescendo, são resultados de muitas ausências. Ausência da garantia ao direito universal de acesso aos serviços de saúde, como os de saúde sexual e reprodutiva, mas, também, da ausência de saneamento, de água tratada e encanada, de limpeza urbana, coleta de lixo. Ou seja, da construção de uma condição de vida e de saúde digna para todas às pessoas. Para o UNFPA, trabalhar no contexto do zika tendo as mulheres no centro da resposta, é trabalhar com a determinação social das condições de vida e saúde”.
Fernanda, que também é doutora em saúde pública, falou sobre “a lógica do materno-infantil que só responde ao infantil e considera as mulheres como ‘contêineres’”, e de que é preciso trabalhar com as mulheres no centro das políticas no contexto de zika. Ela lembrou ainda que as epidemias de arboviroses (dengue, chikungunya e zika) estão estreitamente ligadas à desigualdade social e ao racismo – o que reforça a importância da atenção humanizada, que só se efetiva quando livre de estereótipos, discriminação e coerção.
A socióloga Jacqueline Pitanguy, que vem acompanhando o surto de zika desde o início, destacou o desrespeito aos direitos reprodutivos das mulheres afetadas pelo vírus. O conceito dos direitos reprodutivos, que expandiu a esfera dos direitos humanos ao reconhecer a reprodução humana, o planejamento familiar e a sexualidade informada como direitos fundamentais, associado intrinsecamente à saúde física e mental, está permanentemente ameaçado de retrocessos em um país que tem uma das legislações mais restritivas do mundo, frisou Jacqueline.
Para ela, é fundamental colocar no centro do debate que a regulamentação destes direitos deve ser pautada por parâmetros dos direitos individuais, de saúde pública e da justiça social. “É fundamental que haja o acesso à prevenção, que inclui contracepção, mas não se limita a isso. A opção de levar adiante ou não uma gestação em função do direito à saúde física e emocional das mulheres, o amparo e acolhimento àquelas que optam por levar adiante a gestação: tudo isso é uma responsabilidade do Estado”, destacou.
Maíra Saruê Machado, diretora de pesquisa do Data Popular, apresentou o relatório preliminar de um estudo qualitativo realizado com mulheres grávidas em João Pessoa, Recife e São Paulo. O primeiro dilema ressaltado no estudo é que as gravidezes, em geral, não foram planejadas. E neste momento a gestação é “um misto de alegria, tristeza e medo” e este receio está diretamente relacionado à epidemia e à falta de informações.
“Elas demandam mais esclarecimentos e orientações. Como vive uma pessoa com microcefalia, quais são as causas, como se precaver, se tem cura ou não, tratamento, vacina, enfim, querem informações”, ressaltou. A mídia, entretanto, não vem dialogando com essas mulheres, segundo a pesquisa qualitativa. “Sabemos que há várias perguntas que não têm respostas, mas várias delas já têm e essas respostas não estão chegando a essas mulheres”, frisou a especialista.
Além do conteúdo das informações transmitidas, Maíra apontou a importância de repensar a forma como a cobertura é construída. “Para elas, a cobertura é triste e assustadora. A abordagem da TV, que é o principal meio de informação que elas têm, as amedronta e torna a gravidez ainda mais angustiante”, relatou.
A neuropediatra Ana Van Der Linden, uma das primeiras profissionais a identificar o aumento da incidência do novo tipo de microcefalia e demais alterações neurológicas posteriormente associadas à infecção pelo zika, destacou o erro que a mídia vem cometendo ao simplificar a abordagem do problema.
“A microcefalia não é uma doença, é um sinal de uma série de doenças”, reforçou. No Imip (Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira, do Recife), onde Ana atua, já foram identificados caso de hidrocefalia manifesta em pelo menos três bebês com mais de três meses que nasceram acometidos pela microcefalia, comprometimento da visão, irritabilidade extrema, entre outros inúmeros sintomas da síndrome.
Para efetivar os direitos das mulheres, a coordenadora da RadioAgência Nacional EBC, Juliana Nunes, defendeu a articulação das discussões entre profissionais de comunicação e saúde e as mulheres, ressaltando o papel que mídias como o rádio têm nesse processo. “E essas mulheres precisam se tornar protagonistas de suas vidas e da solução para o problema”. Outra urgência apontada pela jornalista é a necessidade de enfrentar o racismo institucional e estruturante da sociedade brasileira. “É necessário, por exemplo, treinar profissionais de saúde para respeitar e não temer espaços como os terreiros e reconhecer a sabedoria e conhecimento das mulheres desses terreiros, que poderiam inclusive contribuir nas políticas de prevenção”, exemplificou.
Texto original do Instituto Patrícia Galvão
Fotos Midiã Santana/UNFPA
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