(O Estado de S. Paulo, 23/05/2016) Se o Estado deixar de criar regras de transição estará permitindo a desigualdade entre seres humanos e, portanto, estará deixando de cumprir o seu papel.
O Estatuto do idoso ( Lei nº 10.741/2003) estabelece a idade de 60 anos para que uma pessoa seja considerada idosa, independentemente do seu sexo.
Hoje não há idade mínima para aposentadoria por tempo de contribuição para os aposentados do regime geral (INSS). Os segurados podem se aposentar contribuindo por 30 anos ao INSS, no caso da mulher, e por 35 anos, para homens. A regra atual leva em conta idade, tempo de contribuição e expectativa de vida do segurado (Fator Previdenciário). O aposentado pode pedir o benefício do INSS e continuar trabalhando. Há, também, a aposentadoria por idade, que exige 60 anos de idade para a mulher e 65 anos para o homem, e apenas 15 anos de contribuição. Nesta ultima modalidade de aposentadoria não há incidência de Fator Previdenciário que só será aplicado se for beneficiar o segurado.
O governo sinaliza mudanças nas regras da aposentadoria por tempo de contribuição. Com as mudanças demográficas, torna-se necessário instituir idade mínima para as aposentadorias desse tipo. A idade média em que os trabalhadores se aposentam, no INSS, é de 52 anos para as mulheres e 57 anos para os homens.
Hoje as mulheres se aposentam cinco anos antes que os homens. Cogita-se diminuir a diferença de tratamento entre homens e mulheres nos requisitos para aposentadoria. Essa redução deve ser individualizada e estar vinculada ao número de filhos que a segurada tiver, sendo necessária a criação de políticas que facilitem a participação de mulheres no mercado de trabalho. O incentivo à natalidade responsável se faz necessário, no momento, para garantia do pagamento das futuras aposentadorias de população cada vez mais velha.
A fixação de idade mínima para concessão de aposentadorias por tempo de contribuição, no entanto, exige regra de transição para que seja respeitada a igualdade entre os trabalhadores. E dar tratamento isonômico aos trabalhadores que acabaram de ingressar e àqueles que estão há mais de vinte anos no mercado de trabalho, significa respeitar as proporções devidas na reforma pretendida.
As novas regras não atingirão aqueles que já preencheram os requisitos de tempo de contribuição e no caso da aposentadoria por idade, também de idade, para obtenção do benefício, mas que ainda não o requereram. No entanto, o segurado que estiver prestes a se aposentar deve fazer a contagem do seu tempo de contribuição e aguardar as regras de transição que nossos representantes no Congresso Nacional certamente exigirão para garantia da igualdade entre os trabalhadores, respeitando o tempo de contribuição de cada segurado já inscrito na previdência social, na data da modificação legal que certamente virá.
Lembramos que, em 24 de julho de 1991, o Congresso Nacional, ao aprovar a Lei 8.213, modificou a carência para aposentadoria por idade que até então era de apenas cinco anos e passou para 15 (quinze). Na ocasião foi criada pela comissão de seguridade e justiça uma tabela como regra de transição para aqueles que já estavam inscritos na previdência, com aumento progressivo do tempo de contribuição exigido entre 1991 até 2011, quando a mudança foi efetivamente concluída.
Estamos cientes da dificuldade que temos, na atualidade, quando a questão é assegurar a todas as pessoas, com igualdade, os direitos sociais previamente estabelecidos na Constituição. É que o próprio conceito de igualdade muda de acordo com o momento histórico e econômico de cada cultura.
Se o Estado deixar de criar regras de transição estará permitindo a desigualdade entre seres humanos e, portanto, estará deixando de cumprir o seu papel. A igualdade é resultado de compromisso político selado pelo direito. É produto de negociação. O homem deve comprometer-se com a igualdade para o que Kant denomina “uma existência digna do homem”.
Na próxima semana, falaremos sobre a tentativa do atual governo em desatrelar o piso pago pelo INSS do salário mínimo.
Marta Gueler