(R7, 29/06/2016) Tatiane Moreira Lima ficou 20 minutos em poder de sequestrador no Butantã em 30 de março
Quando retornou ao trabalho no Fórum do Butantã, na zona oeste de São Paulo, a juíza Tatiane Moreira Lima, de 37 anos, recebeu a promessa de que o local teria segurança reforçada. O compromisso foi cumprido, assim como em outros fóruns frequentados por ela. Mesmo com o trauma, ela afirma que nada mudou em sua vida pessoal.
— Não tenho motivos para me sentir insegura, até mesmo porque o agressor está preso. Com relação ao trabalho, eu senti que, em alguns fóruns por onde eu andei, tem mais segurança. No fórum em que trabalho, foi mudado todo o esquema para evitar que eventos como esse se repitam.
A agressão aconteceu no dia 30 de março deste ano. Alfredo José dos Santos, de 36 anos, invadiu o fórum onde está localizada a Vara da Região Oeste de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Foro Regional do Butantã, e manteve a magistrada refém por quase 20 minutos. Durante este tempo, o homem cobriu parte do corpo de Tatiane com gasolina, a agrediu e a ameaçou, além de obrigá-la a dizer que ele era inocente.
O homem respondia por agressão contra a ex-mulher. Em entrevista ao Domingo Espetacular, Santos afirmou ter agredido a juíza por desespero. Porém, para a magistrada, a agressão foi motivada por gênero, pois acredita que se fosse homem, Santos não teria agido da mesma forma.
— O que eu sofri foi uma violência contra a mulher. Não foi uma violência doméstica porque não tinha uma relação de afeto, mas é violência contra a mulher. Ele se valeu da minha condição para praticar o delito.
Segundo a magistrada, o crime foi premeditado.
— Ele já me conhecia porque tinha ido à uma audiência anterior. No dia da agressão, ele foi destinado para a minha sala porque sabia com quem estava lidando e quem era seu alvo.
Violência contra crianças
Por trabalhar na Vara da Região Oeste de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, a juíza lida quase todos os dias com a questão de violência contra crianças e mulheres. Ela afirma que grande parte dos casos acontece dentro do âmbito familiar, sendo que, na maioria das vezes, é o pai o padrasto quem pratica.
— A maioria é menina e o agressor se vale da condição de conhecer aquela vítima e de ter a confiança dela para praticar os crimes. Infelizmente, isso é muito presente na nossa sociedade e um dos mais difíceis de se trabalhar porque a vítima tem que repetir a mesma história várias vezes. Ela é constantemente revitimizada até o caso chegar à uma audiência anos depois.
Para tentar minimizar este problema, o Tribunal de Justiça tem se dedicado ao chamado depoimento sem dano, que é uma tentativa de que ela seja ouvida a mínima quantidade de vezes possível, explicou Tatiane.
Violência contra a mulher
As mulheres vítimas de violência doméstica reclamam do atendimento realizado em delegacias. Muitas vezes, elas são atendidas por homens. Para a magistrada, aumentar o número de mulheres juízas, delegadas e policiais femininas ajudaria nesta questão, mas não o suficiente.
— Um número maior com certeza ajudaria, mas as pessoas também têm que ter sensibilidade para trabalhar com essa mulher. É normal a vítima reatar com o agressor ou voltar atrás com suas histórias. Isso é um processo chamado ciclo da violência. Então, as pessoas que trabalham com esse tema têm que entender e não menosprezar a vítima por isso.
Ainda de acordo com a magistrada, apenas 5% das mulheres denunciam na primeira agressão. Elas demoram, em média, oito anos para denunciar.
— Eu acredito muito na especialização e sensibilização dos profissionais. A gente tem que se qualificar mais, saber como ocorre, como é um fato repetitivo. Esses fatores são importantes de se entender por quem trabalha com violência doméstica. Isso é fundamental.
Dinalva Fernandes
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