(Fisenge, 28/06/2016) No último dia 20/6, o Coletivo de Mulheres da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) lançou uma campanha, nas redes sociais, de combate à cultura do estupro. Ao todo, foram cinco ilustrações, que retratam situações de violência no trabalho, no transporte público, na rua, em casa e nas universidades. O objetivo é alertar sobre casos, infelizmente cotidianos, que reforçam uma cultura de violência contra as mulheres.
A expressão “cultura do estupro” repercutiu nas ruas e nas redes, principalmente após o caso de estupro de uma menina de 16 anos, no Rio de Janeiro (relembre o caso: http://goo.gl/l7sIvR). Segundo a ONU Mulheres, cultura do estupro é “o termo usado para abordar as maneiras em que a sociedade culpa as vítimas de assédio sexual e normaliza o comportamento sexual violento dos homens. Ou seja: quando, em uma sociedade, a violência sexual é normalizada por meio da culpabilização da vítima, isso significa que existe uma cultura do estupro”.
De acordo com a engenheira e diretora da mulher da Fisenge, Simone Baía, a campanha busca representar formas de manifestação desta violência nos mais diversos espaços que as engenheiras e as mulheres em geral transitam. “Além de denunciar a cultura do estupro, tivemos o cuidado de realçar o protagonismo feminino e a capacidade de solidariedade entre nós, mulheres”, afirmou ela. Dados do 9º Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram que, a cada 11 minutos, uma mulher sofre violência sexual no Brasil. Os dados são alarmantes, e ainda existe o problema da subnotificação, uma vez que as mulheres temem a denúncia justamente por enfrentarem a culpabilização da vítima, a proteção ao agressor e a normalização da tese de que os corpos femininos são públicos.
“Precisamos romper os silenciamentos, manter a mobilização nas ruas e combater todos os dias as piadas e os assédios. Por isso, a atuação em rede é fundamental entre nós, sempre com empatia e solidariedade na organização coletiva”, destacou Simone. As peças são de autoria da ilustradora Teenage Micha (www.facebook.com/teenagemicha/). No transporte público: Ônibus, trens ou metrôs cheios não são desculpas para apalpar o corpo de uma mulher! Isso também é manifestação da cultura do estupro e parte da lógica de que aquele corpo feminino pode ser tocado sem consentimento. A falta de qualidade dos transportes públicos corrobora para que esta violência ocorra: insuficientes, lotados e sucateados, não há dignidade para os passageiros durante as viagens. O Estado precisa cumprir seu papel não apenas em relação à qualidade da mobilidade urbana, mas também adotando políticas de acolhimento às vítimas de violência e de responsabilização dos agressores no transporte público. É preciso criar uma cultura de segurança, para que as mulheres saibam que terão apoio caso denunciem uma agressão, e para que os homens saibam que nenhum abuso será tolerado. As mulheres devem ter direito de utilizar o transporte público sem medo, seja para trabalhar, estudar ou passear. Respeito é a palavra de ordem e deve ser seguida à risca em um espaço coletivo.
Em casa: A cultura do estupro também é manifestada em nossos lares, em nossas famílias e construções afetivas. São filhas, mães, companheiras, avós, netas. Todas são mulheres, vítimas destas violências. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 67% dos casos de violência contra as mulheres são cometidos por parentes próximos ou conhecidos das famílias; 70% das vítimas de estupro são crianças e adolescentes e apenas 10% dos estupros são notificados. A maioria dos agressores não é punida. Sororidade, substantivo feminino. Sororidade é a união entre mulheres, baseada na empatia e no companheirismo, e também na luta cotidiana pelo fim da rivalidade entre nós. A construção de alianças é fundamental para redes de apoio mútuo. Uma ajuda a outra. Uma resiste ao lado da outra. E todas lutam juntas. Na rua: Estamos em 2016 e a rua ainda é um espaço hostil para as mulheres, principalmente à noite. Seja voltando do trabalho, da faculdade ou de um passeio, o medo é real e, sabemos, vai além do receio pela violência urbana. O medo é também fruto da cultura do estupro! O Estado precisa promover políticas específicas de combate a este tipo de violência, mas pensando também a cidade como um espaço acolhedor para as mulheres. É necessário investir em iluminação pública, segurança não-militarizada nas ruas e transporte coletivo de qualidade. A campanha #MeAvisaQuandoChegar, feita por estudantes da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro no início deste ano (veja aqui: https://goo.gl/o3ei3b), evidencia isso: mulheres estudantes têm medo de serem estupradas ao voltar para casa depois das aulas. Como forma de driblar o medo, criaram uma rede de apoio em que contam com a sororidade para se sentir mais seguras. O direito ao estudo e ao trabalho, o direito à autonomia, são colocados à prova pela cultura do estupro. Isso precisa acabar! Precisamos combater a cultura que coloca “ser mulher” como um risco! E isso vai além de medidas de repressão: é preciso ensinar os meninos, desde cedo, que a segurança do próprio corpo é fundamental na vida em sociedade e é um direito de todas as pessoas.
Nas universidades: “Matemática não é coisa de menina! Mulher não sabe calcular”. Estas são frases comuns ouvidas desde a infância até a vida adulta. Isso porque mulheres têm suas capacidades questionadas e a sociedade patriarcal reforça o estereótipo de que mulheres não devem ocupar espaços para além das responsabilidades familiares e domésticas. Os tempos estão mudando e as universidades de engenharia estão com um número cada vez maior de mulheres. Mais engenheiras estão se formando e liderando projetos e equipes. Mais mulheres estão ocupando cargos de poder. Sim, nós, mulheres, resolvemos equações, projetamos prédios, desenvolvemos projetos no campo e estamos em todos os espaços. Porque lugar de mulher é onde ela quiser. Meninas, a matemática e a ciência também são nossas!No trabalho: O assédio sexual é uma manifestação da cultura do estupro e está presente no ambiente de trabalho, atingindo mulheres nos mais diferentes cargos. Estas violências mostram que, no imaginário social, o corpo da mulher é tido como público, alvo de cantadas e assédios. Respeitar a dignidade da mulher significa reconhecê-la como protagonista de sua própria história, respeitando suas competências, inteligência e capacidade profissional. Queremos tranquilidade para fiscalizar uma obra ou estar em trabalho de campo sem ouvir assobios, para caminhar entre colegas homens sem ouvir piadas ou cantadas, ou mesmo para ter nossos projetos e esforços reconhecidos de forma igualitária!