(Géssica Brandino/Agência Patrícia Galvão, 01/07/2016) Dos 5.191 homicídios contra crianças e adolescentes de até 17 anos em 2013, mais de quatro mil foram cometidos contra negros, o que significa que morrem quase quatro vezes mais negros que brancos. Além disso, do total desses homicídios, mais de 576 foram cometidos contra meninas. É o que revela o Relatório Violência Letal Contra as Crianças e Adolescentes do Brasil, divulgado nesta semana pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso).
Elaborado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, o estudo mostra que a morte de crianças e adolescentes por causas externas vem aumentando no país desde a década de 1980 e representa quase 30% dos óbitos registrados em 2013. Com isso, o Brasil ocupa o 3º lugar em homicídios de crianças e adolescentes entre 85 países analisados.
Violência letal com recortes de gênero e raça
Os homicídios representam 48,2% das mortes de adolescentes de até 17 anos. Roraima, Acre, Tocantins, Santa Catarina e Amazonas são os estados com maior percentual de homicídios de mulheres até essa idade. Nos dois primeiros, o índice de meninas vítimas de homicídio representa mais de 45% do total. Os menores índices aparecem no Ceará, Maranhão, Sergipe e Amapá. Armas de fogo estiveram presentes em 78,2% dos homicídios de crianças adolescentes de até 17 anos.
Os dados da Flacso revelam também que o número de crianças e adolescentes negros vítimas de homicídio é 178% maior do que o de brancos, considerando o tamanho das respectivas populações. Em 2013, no conjunto da população de até 17 anos de idade, a taxa de homicídios de brancos foi de 4,7 por 100 mil e a de negros, 13,1 por 100 mil.
Quando se foca nos adolescentes de 16 e 17 anos, a taxa de homicídios de brancos foi de 24,2 por 100 mil. Já a taxa de adolescentes negros mortos nessas idades foi de 66,3 em 100 mil. A vitimização, neste caso, foi de 173,6%.
O estudo foi encomendado pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente e Secretaria de Direitos Humanos, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), em 2015. O relatório foca nas causas externas de mortalidade no Brasil, mortalidade por acidentes de transporte, suicídios e homicídios e tem como fonte os dados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério da Saúde. Em conjunto, as causas externas vitimaram 689.627 crianças e adolescentes, entre 1980 e 2013, no país.
Além da física, violência sexual também é recorrente
O relatório também apresenta dados sobre os atendimentos por violência no Sistema Único de Saúde. Segundo o SINAN (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), em 2014 foram registrados 97.976 atendimentos a crianças e adolescentes com idade até 17 anos. Violência física, negligência/abandono e violência sexual aparecem entre as principais incidências nos atendimentos realizados a esse público, somando 76 mil atendimentos em todo o país.
Somente em relação à violência sexual, foram realizados quase 20 mil atendimentos no SUS em 2014. A maioria dos atos foi praticada por conhecidos da vítima (mais de 5.3 mil casos). No Acre, praticamente duas de cada três consultas ao SUS foram em decorrência de violência sexual, ou seja, cerca de 65% dos atendimentos de crianças e adolescentes realizados no período.
Esse tipo de violência cresce ao longo da infância. Foram registrados 404 atendimentos a menores de um ano de idade. Já entre crianças de 1 a 11 anos, o número chega a quase 10 mil atendimentos, total que representa 25% dentre todos os casos de violência atendidos. A incidência também é alta entre adolescentes com idades de 12 a 15 anos, que representam mais de 7,6 mil atendimentos, ou 26,4% do total de atendimentos. Aos 17 anos, o atendimento por violência sexual representa apenas 8% dos casos de consulta.
Infografia: Tainah Fernandes