Sessão foi remarcada apenas para março. Apesar de os autores terem confessado o crime, ocorrido em junho de 2015, eles respondem em liberdade
(Rede Brasil Atual, 28/11/2016 – acesse no site de origem)
A segunda audiência judicial para recolher depoimentos sobre o assassinato da travesti Laura Vermont, que ocorreria na tarde de hoje (28), foi cancelada devido à ausência de uma testemunha. A sessão foi remarcada para março. A jovem de 18 anos foi morta com socos e pauladas há um ano e meio por cinco homens, na zona leste de São Paulo, acobertados por dois policiais militares. Apesar de os envolvidos terem confessado o crime, respondem em liberdade.
Para a família e amigos, que organizaram um protesto em frente ao Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo, trata-se de um caso claro de crime de ódio, motivado por homofobia. “Nunca esperávamos que isso fosse acontecer”, disse a mãe da jovem, Zilda Laurentino. “Estamos aqui porque queremos justiça. Não quero a morte para eles, como fizeram com Laura. Quero que eles respondam pelo crime, dentro dos princípios da lei.”
Além da mãe, estiveram no protesto as duas irmãs da jovem, a sobrinha, o pai, amigos e integrantes dos movimentos Mães pela Diversidade e Stronger, que reúne homossexuais, transexuais e simpatizantes no que chamam de uma “família”. A maioria dos integrantes é de jovens negros das periferias de São Paulo, principais vítimas de assassinatos no país.
“Essa caso é muito emblemático. Os autores confessaram o crime. O que mais precisa?”, disse o amigo Elvis Justino. “Não podemos deixar um caso como esse impune. Eles estão soltos e já são acusados de se envolverem novamente em brigas com homossexuais na zona leste. É praticamente um grupo de extermínio”, disse.
O crime ocorreu em 20 de junho de 2015. Segundo o 32º Distrito Policial (DP), que investiga o caso, câmeras de segurança de uma padaria gravaram a briga entre os cinco rapazes e Laura. O delegado que acompanha o caso José Manoel Lopes afirmou, na época, que um dos jovens confessou que pegou um pedaço de pau e deu três pauladas na cabeça de Laura. A investigação, no entanto, descartou a possibilidade de o crime ter sido motivado por homofobia. A morte teria ocorrido de um desentendimento.
Os autores do crime são Van Basten Bizarrias de Deus, Iago Bizarrias de Deus, Jefferson Rodrigues Paulo, Bruno Rodrigues de Oliveira e Wilson de Jesus Marcolino e têm idades entre 20 e 25 anos. Eles chegaram a ficar presos por alguns dias, mas foram liberados pela juíza Érica Aparecida Ribeiro Lopes e Navarro Rodrigues, que alegou que não havia indícios de que eles estavam tentando “furtar-se à sua responsabilização criminal ou prejudicar a instrução probatória”.
Segundo o delegado, Laura havia pego carona com o cliente de uma amiga travesti e se desentendeu com as duas pessoas no veículo. O motorista então parou para que elas descessem na Avenida Pires do Rio, na zona leste, e continuaram a brigar. Laura se desentendeu com um casal que passava na rua e depois foi a uma padaria onde estavam os cinco jovens que as agrediram.
A Polícia Militar foi ao local atender o chamado da briga. Dois policiais contaram que a travesti entrou na viatura, saiu dirigindo e bateu o carro. Durante o trajeto, o soldado Diego Clemente Mendes, de 22 anos, que estava no carro, atirou no braço de Laura. Ele e o sargento Ailton de Jesus, de 43 anos, teriam deixado de socorrer a travesti, que foi levada por pessoas da região para o hospital.
No entanto, após investigações constatou-se a versão do soldado Diego Clemente Mendes, de 22 anos, e do sargento Ailton de Jesus, de 43 anos, era falsa. Eles prestaram um novo depoimento e afirmaram ter atirado na jovem. Os PMs ficaram presos por quatro dias, e estão sendo investigados por falso testemunho e fraude processual. Eles negaram socorro para a jovem, que foi levada ao hospital por pessoas que passavam pela rua. O laudo do Instituto Médico Legal (IML) concluiu que a causa da morte foi traumatismo craniano.
O Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais no mundo. Entre janeiro de 2008 e março de 2014, foram registradas 604 mortes no país, segundo pesquisa da organização não governamental Transgender Europe (TGEU). “Lutamos porque nossos filhos têm família e queremos que eles tenham todos os direitos e oportunidades de qualquer um. Não podemos permitir que nosso filhos sejam vítimas de violência motivada por crime de ódio”, disse a integrante do grupo Mães pela Diversidade Clarice Cruz Pires.