O segredo para a elaboração de uma vacina da zika pode estar em uma bomba de pressão. Há um ano, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) estudam como o vírus que causa a doença reage quando colocado dentro de uma bomba que aumenta a sua pressão hidrostática. Eles concluíram que esse processo inativa o vírus, tornando-o incapaz de infectar uma pessoa. Além disso, mesmo inativo, o microrganismo mantém sua capacidade imunogênica, isto é, a capacidade de gerar imunidade em quem entra em contato com ele. Estes são dois critérios básicos para criar uma vacina.
(Extra, 19/12/2016 – acesse no site de origem)
Na pesquisa, os cientistas colocam o vírus em uma solução dentro de um tubo feito especialmente para ser pressurizado. Depois, inserem o tubo dentro da tal bomba de pressão, na qual ele fica mergulhado em água ou etanol. A bomba é ligada, e a pressão hidrostática aumenta. Em seguida, os pesquisadores retiram o tubo e expõem camundongos ao vírus. Nos cerca de 30 experimentos feitos até agora, os animais não apenas continuaram com a saúde intacta, como também ficaram imunes ao vírus.
O estudo se mostra promissor porque, além de camundongos saudáveis, os pesquisadores usaram animais imunodeficientes, ou seja, com sistema imunológico debilitado por doenças, como a Aids. Todas as cobaias reagiram positivamente. Isto leva os cientistas a acreditar que os microrganismos poderiam compor uma vacina eficaz para toda a população, mesmo para pessoas com alguma enfermidade autoimune ou outro tipo de problema. Mas ainda são necessários mais estudos até que se possa testar o experimento em humanos.
— Nossa linha de pensamento é que, se nem os animais mais frágeis são afetados de forma negativa, esse vírus daria uma vacina segura — comenta a cientista Andréa Cheble de Oliveira, do Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis, da UFRJ, uma das autoras da pesquisa.
Para ela, a chave para a inativação do vírus é a alta pressão exercida sobre ele, alterando sua estrutura sem destruí-lo.
— O vírus é totalmente alterado em sua estrutura, mas sua aparência continua a mesma. É isto que parece importante para manter a capacidade imunogênica — destaca ela. — Além disso, a pressão é é um agente físico, não químico. Muitas vacinas hoje usam agentes químicos, e, por isso, produzem efeitos colaterais. Quanto menos agentes químicos forem empregados, menos efeitos colaterais as pessoas terão.
O estudo é parte do conjunto de trabalhos da Rede Zika. O esforço conjunto de cientistas teve início quando o surto da doença começou, e o Ministério da Saúde declarou estado de emergência, em novembro do ano passado, por conta da epidemia de microcefalia — malformação do cérebro de bebês relacionada com a infecção das gestantes com o vírus. A Rede Zika foi criada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) para trazer respostas, o quanto antes, sobre essa doença, cujos primeiros casos no Brasil foram registrados em 2015.
Diretor científico da Faperj, Jerson Lima Silva lembrou que o Brasil responde hoje por 15% dos artigos publicados sobre zika no mundo. Considerando apenas publicações nacionais, o Estado do Rio foi responsável por aproximadamente 35% dos artigos sobre o assunto, diz o pesquisador.
— Neste primeiro ano de trabalho, a Rede Zika teve importância fundamental para os resultados na ciência, contribuindo com descobertas relevantes — afirma ele, que também integra a equipe que usa uma bomba de pressão para tentar chegar à tão aguardada vacina.
DEMANDA URGENTE DA SOCIEDADE
Desde que os surtos de zika começaram, cientistas de todo o mundo iniciaram uma caça à vacina. Enquanto qualquer imunização demora anos ou décadas até ser disponibilizada, tudo indica que a vacina contra o vírus da zika não levará tanto tempo.
— Temos que buscar fazer essa pesquisa o mais rápido possível, de forma segura e eficaz. Vamos trabalhar possíveis reações cruzadas com dengue, febre amarela e outras doenças. Vacinas demoram a ser produzidas, mas temos que acelerar a criação desta. É uma demanda urgente da sociedade — afirma Jerson Lima Silva.
Ele sabe, porém, que o caminho para uma vacina não permite atalhos. Depois que terminar a fase do estudo com experimentos em camundongos, são necessários testes em animais maiores, como macacos. Trata-se de uma etapa mais cara, portanto exigirá que o trabalho seja publicado, antes, em revistas científicas, para que possa angariar verba. Depois dos exames em macacos, se os resultados forem positivos, a pesquisa pode seguir para os ensaios clínicos, com pessoas.
— A vantagem é que, diferentemente da dengue, a zika só tem um tipo de vírus. Então, é mais fácil desenvolver uma vacina. Trata-se um inimigo só — pontua Lima Silva. — Mas é uma doença muito grave, precisamos testar todas as armas que temos.
Além dele e de Andréa Cheble de Oliveira, participam da pesquisa o professor André Marco de Oliveira Gomes, do Instituto de Bioquímica Médica, os pós-doutorandos Carlos Henrique Dumard e Francisca Hildemagna Guedes da Silva, e o professor Herbert Guedes, do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, também da UFRJ.