Audiência pública realizada na PGR debateu medidas para garantir maior participação das mulheres na política
Nas últimas cinco eleições gerais realizadas no Brasil, a proporção de mulheres ocupando vagas de deputado estadual e distrital cresceu apenas 1,23 pontos percentuais. Em 1998, as Câmaras federal e distritais de todo o país possuíam apenas 10,1% de representação feminina, enquanto em 2014 essa proporção passou para 11,3%. “Não obstante tenhamos legislação de cotas, há um déficit evidente e grave no que se refere à participação das mulheres na política no Brasil”, afirmou o vice-procurador-geral Eleitoral, Nicolao Dino, durante audiência pública realizada nesta quinta-feira, 11 de maio, na Procuradoria-Geral da República (PGR).
(MPF, 11/05/2017 – Acesse no site de origem)
Em relação ao legislativo municipal o avanço foi ainda menor. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que, nas eleições de 2000, 12,63% das vagas de vereador foram ocupadas por mulheres. No ano passado essa proporção passou a ser de 13,51%, um aumento de 0,88 ponto percentual em 16 anos. Na tentativa de mudar esse quadro, cerca de 200 pessoas, entre autoridades, especialistas, integrantes de partidos políticos, de órgão públicos, de entidades da sociedade civil e cidadãos em geral participaram da audiência pública para propor medidas que fomentem a maior participação de mulheres na política.
O evento foi promovido pela Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) e pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, com o apoio da ONU Mulheres, entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres. A ideia é que outras audiências como essa sejam realizadas pelos estados. Ao abrir o evento, o vice-PGE lamentou o fato de o Brasil ocupar atualmente a 154ª posição num ranking de 174 países em relação à participação das mulheres no Congresso. Ele salientou que as manifestações feitas na audiência servirão de base para a definição de diretrizes de atuação do MPF nessa temática, assim como para ao envio de propostas ao Congresso Nacional, visando alcançar a igualdade de gênero na política.
Apesar dos avanços legislativos obtidos nos últimos anos, com aprovação de leis que preveem a presença de 30% de mulheres entre as candidaturas nas eleições, além de tempo de TV para a promoção feminina na política, a representatividade feminina na esfera política ainda é baixa. Para a procuradora federal dos direitos do cidadão, Deborah Duprat, isso se deve, em parte, à falta de interesse dos partidos em fomentar essa participação. “As cotas para as mulheres são imperativo para a superação dessa desigualdade originária que existe no Brasil”, destacou a procuradora.
Hoje dos 35 partidos que existem no país, apenas três têm mulheres nas diretivas nacionais. De acordo com a coordenadora nacional do Grupo Executivo Nacional da Função Eleitoral (Genafe) da PGE, Ana Paula Mantovani, levantamento realizado pela Procuradoria da Mulher no Senado mostra que a falta de apoio dos partidos é o maior entrave para a entrada das mulheres na política. Mais de 40% das entrevistadas mencionaram esse motivo, enquanto apenas 5% atribuíram aos afazeres domésticos a dificuldade de ingressar no meio político. “Esse é um dado relevante , que vai servir de base para nossa atuação junto aos partidos, pois precisamos mudar essa mentalidade”, afirmou.
A criação de políticas públicas de igualdade de gênero, como cotas para o preenchimento de vagas no legislativo e não apenas candidaturas, medidas que combatam a diferença salarial entre homens e mulheres, e melhor distribuição de cargos de direção foram algumas das propostas apresentadas durante o evento. A representante do Escritório da ONU Mulheres no Brasil, Nadine Gasman, defendeu a necessidade de implantação da democracia paritária no Brasil, que garanta participação igualitária de homens e mulheres nos setores público e privado.
Manifestações – Embora as mulheres correspondam a 52,13% do eleitorado brasileiro, segundo dados do TSE, elas ocupam menos de 15% das cadeiras no Congresso Nacional e 11,57% das prefeituras no país. “Precisamos nos unir para eleger mais mulheres. Temos que debater e discutir o papel da mulher dentro da sociedade”, manifestou a analista parlamentar Adriana Cavalcante, durante a audiência. Ela lembrou que a mulher sofre preconceito e assédio nas mais diversas áreas profissionais e, para mudar essa realidade, é necessário criar políticas e leis, o que só será possível a partir de uma representação política equilibrada.
Com 80 anos, a deputada federal Creuza Pereira (PSB/PE) contou que, em toda sua trajetória política, sofreu preconceitos por ser mulher, inclusive de outras mulheres. “Venho da época em que mulher não podia falar em política e, quando me vi na condição de disputar um mandato, encontrei mais rejeição de mulheres do que de homens. Muitos diziam que eu só sabia rezar e que não conseguia cuidar nem da minha casa”, lamentou. Ela disse ser fundamental trabalhar para mudar a mentalidade do eleitorado brasileiro em relação à importância do equilíbrio de gênero na política.
Todas as manifestações foram registradas e servirão de base para que a PGE defina propostas para ampliar a participação de mulheres na política, além de prevenir a prática de irregularidades eleitorais, como a utilização de candidatas laranjas, que visam mascarar o cumprimento da cota. Nas eleições de 2012, 21.432 mulheres não obtiveram nenhum voto, enquanto em 2016 esse número foi de 15.957. “Os dados demonstram a utilização de mulheres para cumprir de forma artificial a cota exigida pela legislação, o que não podemos admitir. Precisamos assegurar vagas efetivas para as mulheres na política”, concluiu o vice-PGE.
Para combater a prática, a vice-presidente da Ordem do Advogados do Brasil no Distrito Federal, Daniela Teixeira, sugeriu que seja ajuizada uma ampla ação na Justiça Eleitoral para que partidos e parlamentares beneficiados com candidaturas laranjas de mulheres sejam punidos. “Vamos cassar aqueles que foram eleitos, usurpando dinheiro e tempo de televisão, com a invenção de candidatas”, propôs. Para ela, é preciso criar mecanismos que garantam a punição dos partidos que descumprem a legislação eleitoral antes do pleito, de forma a inibir a prática de irregularidades. “Temos que buscar no Judiciário o que nunca vamos conseguir no Legislativo”, concluiu.