Guinada conservadora prossegue em Washington com desmonte de outra medida da era Obama
(El País, 07/10/2017 – acesse no site de origem)
O Governo de Donald Trump mantém sua firme marcha conservadora. O Departamento de Saúde anunciou nesta sexta-feira que limitará o acesso a anticoncepcionais, ao permitir que seguradoras e empresas privadas se recusem por motivos religiosos ou morais a oferecer esses métodos em seus seguros médicos. A nova norma acarretará a perda gratuita dessa cobertura farmacêutica para milhares de mulheres. É uma vitória para os grupos conservadores, e outro golpe para a agenda progressista que o ex-presidente Barack Obama promoveu durante seus dois mandatos (2009-2017).
A medida permitirá que um grande número de empresas privadas, ONGs, instituições educativas e seguradoras retirem sua oferta de anticoncepcionais gratuitos a funcionárias ou alunas, por intermédio dos seus planos de saúde, se tiverem alguma objeção moral ou religiosa. Nos últimos anos, 200 empresas haviam apresentado até 50 recursos contra essa norma da era da Obama.
Nos Estados Unidos, mais de 55 milhões de mulheres recebem esse serviço de forma gratuita atualmente. Um porta-voz governamental disse ao jornal The Washington Post que 99,9% delas não serão afetadas pela medida e continuarão recebendo proteção anticoncepcional gratuita, mas não explicou como chegou a essa cifra. A estimativa antecipada pelo próprio Governo indica que até 120.000 mulheres poderiam ser privadas do acesso grátis a esses métodos.
Trata-se do mais novo açoite conservador de Trump. Mais uma das suas promessas destinadas a satisfazer suas bases evangélicas e religiosas. Em seus oito meses, o presidente designou Neil Gorsuch, um conservador de pura cepa, para a Suprema Corte, aprovou medidas para ampliar o peso das organizações religiosas e tentou aprovar uma reforma sanitária que deixaria quase 30 milhões de pessoas sem cobertura médica nos próximos anos.
Ao revelar o novo decreto, o diretor de direitos civis e liberdade religiosa do Departamento de Saúde, Roger Severino, defendeu que se trata de uma medida dedicada a proteger as pessoas religiosas e associadas a uma fé que se opuserem ao uso de métodos anticoncepcionais. “Acabaremos com os ataques à liberdade religiosa. É uma promessa que fizemos e uma promessa que cumpriremos. Devemos criar espaços para que cada organização possa se regular com base na sua identidade religiosa e não ser discriminada por sua fé”, afirmou Severino.
A decisão da Administração foi aplaudida por grupos conservadores e religiosos e duramente criticada por organizações da sociedade civil em favor do aborto, da liberdade de expressão e dos direitos da mulher. “A Administração estabeleceu um precedente perigoso para que empresas e instituições educativas possam resistir a cobrir os custos sanitários obrigatórios com base em suas próprias crenças”, escreveu em nota o diretor executivo da ONG Families USA, que atua no âmbito da saúde. Quem critica a decisão considera que a Administração poderia usar esses argumentos para limitar a cobertura de outros serviços sanitários.
Entre outras medidas, o presidente republicano também já proibiu que indivíduos transgênero sirvam às Forças Armadas, eliminou proteções a trabalhadores e estudantes homossexuais e revogou normas de transparência que auxiliavam na luta contra a discriminação salarial. Apesar das frequentes distrações com seus estrambóticos tuítes, Trump, rodeado de ultraconservadores como o vice-presidente Mike Pence, avança no retrocesso de muitas medidas progressistas aprovadas por seu antecessor.
Nicolás Alonso