Para Aline Kerber, a forma como a polícia se relaciona com a cidadania e vice-versa diz muito acerca do grau de confiança e legitimidade social do Estado
(Gaúcha ZH, 04/12/2017 – acesse no site de origem)
Temos vivenciado uma onda de homicídios e crimes violentos sem precedentes. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2017 revelam o aprofundamento de um problema crônico na segurança. Nada menos de 61.283 mortes violentas intencionais no Brasil foram cometidas em 2016. No Rio Grande do Sul, houve um incremento de 8,3% nos homicídios, foram 2.844 vítimas fatais. Porto Alegre ficou em terceiro lugar no ranking nacional de assassinatos, entre as capitais, com uma taxa de 61,3 por 100 mil habitantes, atrás somente de Belém e Aracaju.
No ano passado, as 4.976 mortes de policiais brasileiros, em sua maioria fora do horário de serviço, e de civis decorrentes de intervenção policial denotam o tamanho e a complexidade dos desafios que se apresentam à consolidação da democracia e do Estado de direito. Apesar do lamentável aumento de 27% das mortes decorrentes de intervenção policial no Brasil, o Rio Grande do Sul reduziu esse indicador em 35%. Não nos estranhemos, portanto, com o fato de unicamente um terço dos brasileiros confiar nas polícias, a despeito de dois terços da população gaúcha entrevistada considerarem os policiais destas plagas como os mais honestos.
Ora, devemos colocar a temática da abordagem e do uso da força policial como um tema central na agenda pública. A forma como a polícia se relaciona com a cidadania e vice-versa diz muito acerca do grau de confiança e legitimidade social do Estado. Os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública desvelam que, entre 2015 e 2016, 76% das pessoas mortas em intervenções das polícias eram homens negros, ao passo que 56% dos policiais vitimados fatalmente, do sexo masculino e também negros.
O Brasil tem 54% de negros em sua população, todavia, a cada cem vítimas de homicídios 71 são negras. Entre as mulheres vítimas de homicídio e feminicídio, 65% são negras. Precisamos explicitar quem são as vítimas preferenciais da violência urbana no Brasil para avançarmos na segurança dos direitos. Lembrando Mandela: “Ou a segurança é para todos, ou não é para ninguém.” Mais Instinto de Vida para todos e todas!