Dois terços das ocorrências aconteceram em casa e em 70% dos casos os agressores mantinham relações afetivas estáveis com a vítima
(R7, 02/03/2018 – acesse no site de origem)
Dos 400 casos de abuso contra a mulher analisados pelo Ministério Público de São Paulo, 124 terminaram em morte — ou seja, feminicídio, consequência de abuso doméstico e que torna o homicídio doloso crime hediondo.
Os dados foram apresentados nesta quinta-feira (1) no Raio-X do Feminicídio, estudo realizado pelo próprio MP-SP em 121 cidades do Estado. A pesquisa foi conduzida pela promotora do Núcleo de Gêneros do MP, Valéria Scarance.
A proporção de mortes nos casos analisados é de praticamente um a cada três. O Brasil é o quinto país do mundo que mais mata mulheres — algo que, para a promotora, é uma “doença social”. “A morte de mulheres é uma endemia”, diz.
Uma das buscas da pesquisa era responder se a Lei Maria da Penha funciona. A promotora acredita que sim. Segundo ela, as medidas protetivas inibem a ação dos homens.
Quase a totalidade das mulheres que morreram não fez boletim de ocorrência ou pediu medidas protetivas: das 124, apenas cinco fizeram.
Dos crimes, 68% ocorreram de segunda a sexta-feira — não apenas nos fins de semana, como era senso comum. Os casos ocorrem à noite (35% das 18h às 24h), e não na madrugada.
“Se acreditava que o homem matava mais aos fins de semana e embriagado. E a pesquisa mostra que não. É preciso que a mulher tenha proteção durante o dia e a caminho do trabalho. O agressor conhece a rotina dessa mulher.”
O local mais perigoso para às mulheres é a própria casa. Em cada 3 crimes registrados, 2 ocorreram no próprio lar. Os agressores costumam usar, 58% dos casos, armas caseiras como facas ou facões. Ferramentas como martelos e chave de fenda também são muito utilizadas.
“Se acreditava que o homem matava mais aos fins de semana e embriagado. E a pesquisa mostra que não.”
Valéria Scarance, promotora do MP-SP
A promotora observa que as mãos são usadas como arma seja para espancamento ou asfixia. “A asfixia é muito comum. Espanca e depois esfaqueia.”
Das vítimas, 70% tinham relações afetivas estáveis e os crimes ocorreram em 45% dos casos em pedidos de separação. Outros 30% foram por machismo ou sentimento de posse.
Entre os exemplos citados pela promotora está o de uma adolescente de 16 anos que foi morta porque pediu para o namorado abaixar o som. Uma mulher foi morta por não querer ter relação sexual naquela noite.
A pesquisa aponta que os filhos também são vítimas diretas e indiretas desses ataques — quando são agredidos e quando presenciam a violência contra a mãe, respectivamente.
As mulheres vítimas que não tinham uma relação afetiva são mães, vizinhas ou pessoas que tentaram ajudar o alvo das agressões.
“O que mata é o silêncio, as mulheres precisam denunciar e buscar ajuda”, diz Valéria.
Karla Dunder