Um abaixo-assinado com milhares de assinaturas na internet pede que a escritora mineira Conceição Evaristo, de 71 anos, seja eleita pela ABL (Academia Brasileira de Letras) para ocupar a cadeira de número 7, cujo patrono é o poeta baiano Castro Alves (1847-1871), uma das grandes vozes contra a escravidão na literatura brasileira, autor do famoso poema “O Navio Negreiro”.
(UOL, 07/05/2018 – acesse no site de origem)
Se os imortais ouvirem o apelo, a ABL poderá fazer história ao eleger para a mais tradicional entidade da literatura brasileira uma escritora mulher e negra.
O objetivo da campanha é que a autora ocupe a vaga aberta com a morte do cineasta Nelson Pereira dos Santos no último dia 21 de abril.
Autora de livros como “Ponciá Vicêncio”, “Becos da Memória”, “Poemas da Recordação e Outros Movimentos”, “Insubmissas Lágrimas de Mulheres” e “Histórias de Leves Enganos e Parecenças”, Conceição Evaristo tem nas tradições e cotidiano afro-brasileiros, sobretudo da mulher negra, boa parte da inspiração de sua obra.
No ano passado, ela ganhou o Prêmio Claudia, o mais tradicional troféu destinado a mulheres do Brasil. E ainda é vencedora do Prêmio Jabuti, o principal da literatura brasileira.
Segundo o abaixo-assinado que pede seu nome na ABL, Conceição Evaristo “rescreve a história do Brasil a partir do ponto de vista de quem a vivencia, desde a chegada forçada de seus ancestrais, a partir de todas as suas trágicas e cotidianas impossibilidades”
Mulher negra com o tradicional fardão?
O documento assinado pela professora de literatura da UFBA (Universidade Federal da Bahia) Denise Carrascosa ainda diz que “a este lugar de enunciação, Evaristo, assumindo a multifacetada tarefa da crítica e teorização literárias, nomeia “escrevivência” – tarefa intelectual negro-feminina por excelência de renarrar criticamente o imaginário social hegemônico brasileiro: profundamente elitista, patriarcal e racista e responsável pela falência de um projeto democrático de país”.
O abaixo-assinado ainda reitera a importância de uma mulher negra entrar para a ABL, fundada por Machado de Assis, que era negro mestiço e é considerado o maior autor da literatura brasileira e “um crítico do sistema escravocrata que fundou as bases de nosso imaginário nacional”, segundo o documento.
O texto ainda reforça que Castro Alves, patrono da cadeira de número 7 pleiteada para Conceição Evaristo, foi um autor que “escreveu criticamente sobre a escravidão a uma distância segura de não tê-la conhecido de fato” e que Conceição Evaristo é uma “intelectual negra que conheceu a escravidão desde sua linhagem ancestral e em seu corpo de mulher afrobrasileira que escrevive suas tragédias e potências contemporâneas cotidianas”.
Conceição Evaristo nasceu em uma favela em Belo Horizonte, em uma família pobre com nove irmãos. Ela trabalhou como empregada doméstica para custear seus estudos. Aos 25, mudou-se para o Rio, onde formou-se em letras na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Depois, fez mestrado em literatura brasileira na PUC-Rio e doutorado em literatura comparada na UFF (Universidade Federal Fluminense). Ela é considerada pela crítica especializada uma das mais importantes autoras negras contemporâneas do Brasil.
Miguel Arcanjo Prado