O voto feminino determinará o resultado de uma das eleições mais imprevisíveis dos últimos 30 anos
As mulheres brasileiras continuam indecisas sobre quem apoiar na corrida presidencial, sentindo-se pouco inspiradas pelos candidatos e não representadas pelas propostas políticas.
(Exame, 23/08/2018 – acesse no site de origem))
Metade das mulheres não sabem em quem vão votar e 15% pretendem anular seus votos, de acordo com a última pesquisa Datafolha. Com mulheres abrangendo 52% do eleitorado, o voto feminino determinará o resultado de uma das eleições mais imprevisíveis dos últimos 30 anos.
A falta de propostas dos candidatos em assuntos de interesse das mulheres e a ausência de informações sobre políticas voltadas para o público feminino em seus planos de governo é o que motiva parte dessa indecisão, segundo Eva Bay, professora da Universidade de São Paulo (USP).
“Não falam na questão da violência contra a mulher, não falam sobre os problemas relacionados à saúde reprodutiva, filhos, maternidade, aborto. Os candidatos não tocam nesses assuntos. As mulheres estão mais fortalecidas e querem votar com certeza, não querem jogar fora o voto”.
O ambiente político masculino e culturalmente excludente também são elementos que afetam o voto das mulheres.
“Historicamente, a política é feita de homens para homens”, disse a analista Deysi Cioccari, doutora em Ciências Políticas pela PUC-SP. “O debate eleitoral é um processo agressivo, num cenário predominantemente masculino e, quando surge um tema ligado às mulheres, como o aborto, por exemplo, o desgaste é imenso.”
Embora as eleitoras estejam um pouco mais decididas desde a última pesquisa em junho, ainda há uma diferença de vinte pontos percentuais entre homens indecisos e mulheres indecisas.
Vox Populi
Pelas ruas da capital federal é possível confirmar a indefinição feminina. A falta de propostas voltadas às mulheres é um dos principais motivos apontados por entrevistadas.
“Não decidi ainda, não me sinto representada por nenhum dos candidatos, nenhum vale o meu voto. Vou ver os programas de TV e avaliar um pouco mais”, disse a comerciante Luzia Martins, de 43 anos.
A empregada doméstica Maria do Socorro Silva, 52, fala em desilusão com a política porque não consegue ver honestidade nos candidatos. “Não sei em quem votar, é tudo a mesma coisa. Eu acho que ou não vou votar, ou vou votar nulo. É muito triste ver o país assim”.
Em sua primeira eleição, a estudante Fernanda Marcela, 17 anos, se diz frustrada. Segundo ela, apesar de intensa pesquisa para conhecer melhor os candidatos, não encontrou o voto ideal. “Todos os candidatos se corrompem”.
Como única mulher concorrendo à Presidência com potencial chance de vencer, Marina Silva (Rede), concorda com a avaliação de que é preciso conhecer as propostas, propósitos e trajetória dos candidatos antes de decidir seu voto.
“As mulheres são mais criteriosas e, depois de tantas decepções na política, cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém”, disse à Bloomberg.
Não só na definição do voto, mas a disparidade entre homens e mulheres também está presente na vida profissional dos brasileiros.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pessoas do sexo feminino estudam mais, trabalham mais e ganham menos do que as do sexo masculino. Pesquisa de junho feita pelo instituto indica que as mulheres recebem, em média, salário 23,5% menor do que os homens.
Dados do Ministério Público reforçam a necessidade de olhar para as mulheres. De 2016 a agosto de 2018, foram reportados ao governo 1,2 milhão de casos de feminicídio e violência contra a mulher, de acordo com levantamento feito pelo MP.
Por Rachel Gamarski e Simone Iglesias, da Bloomberg