No último domingo, as mulheres brasileiras foram para as ruas em um dos maiores atos políticos da jovem democracia brasileira. Protestaram, com razão, contra os posicionamentos para lá de problemáticos do candidato Jair Bolsonaro (PSL) em relação a nós. O presidenciável já disse, entre outras coisas, que não quer intervir na desigualdade salarial e que esta é até justificável em contextos como os de licença-maternidade. Há muitos registros de outras falas de Bolsonaro sobre mulheres em diferentes contextos. Contra tudo isso, as mulheres marcharam e disseram que #EleNão.
(Emais, 04/10/2018 – acesse no site de origem)
Se o movimento que culminou nos protestos vai influenciar nas urnas ainda não dá para dizer. Em véspera de eleição muito se diz, muito se sente e se especula mas (ao menos esse ano) pouco se sabe. E embora, como milhões de mulheres, eu esteja sim preocupadíssima com o resultado das eleições – não só a presidencial -, quero me apegar aos recados trazidos pelo #EleNão, pois acho que deles pode vir a força para lutar que tanto precisamos.
Os protestos do dia 29 não são o fim de um processo. São, simultaneamente, consequência e um novo começo. Reunir milhões de mulheres Brasil e mundo afora em nome de uma causa muito clara é consequência de anos de luta feminina, do ressurgimento do feminismo no centro do debate e das mulheres deixando bem claro que são agentes de suas histórias, incomode a quem incomodar.
Ao mesmo tempo, #EleNão é começo porque quem quer que saia vencedor(a?) das urnas nos dias 7 e 28 inicia em janeiro uma nova legislatura. Legislatura essa que começa inevitavelmente ciente da força das mulheres brasileiras e de seu poder de união. Que começa muito pouco tempo depois de um movimento verdadeiramente gigantesco e suprapartidário das mulheres. O recado das ruas foi muito claro: não aceitamos quem fale assim conosco. Não levamos mais desaforo para a casa.
Depois de anos de conquistas e de lutas contra o retrocesso, a força política das mulheres ficou mais nítida. Também ficou evidente que todos os governantes de Executivo e Legislativo brasileiro podem ter a certeza de que nós mulheres vamos fiscalizá-los e não daremos sossego em caso de retrocesso. Vamos fazer barulho até sermos ouvidas pelas instituições tão estruturalmente masculinas desse país, não importa quanto tempo isso leve.
Não o fazemos por hobby, o fazemos porque não temos outra opção que não seja resistir por nossas vidas.
Por tudo isso, por mais pessimista que estejamos, é preciso também olhar a potência do #EleNão e absorver sua mensagem mais potente: vão continuar tentando amordaçar nossos direitos, mas nunca mais vão fazer isso sem oposição. Silêncio não é substantivo feminino, resistência é.
Nana Soares é jornalista especializada em direitos da mulher e combate à violência. Faz mestrado em Gênero e Desenvolvimento na University of Sussex, na Inglaterra e é co-autora da campanha “Você não Está sozinha” contra o abuso sexual no Metrô de São Paulo.