Foram eleitas: Talíria Petrone, deputada federal, e Renata Souza, Mônica Francisco e Dani Monteiro, que trabalhavam como assessoras da vereadora, deputadas estaduais.
(HuffPost Brasil, 10/10/2018 – acesse no site de origem)
Há pouco mais de dois anos, em 2 de outubro de 2016, Marielle Franco foi eleita vereadora da cidade do Rio de Janeiro com mais de 46 mil votos. Há quase sete meses, em 14 de março de 2018, Marielle Franco foi assassinada e o crime segue sem resposta. “Não serei interrompida”, ela disse certa vez em discurso da Câmara Municipal. Tentaram calar a sua voz, mas sua luta se multiplicou. Marielle virou semente.
Mulher, negra, mãe, lésbica e cria da favela da Maré, em seu mandato como vereadora, a socióloga trabalhou pelos direitos das mulheres, da população negra e LGBT e das vítimas da violência no Rio de Janeiro. Antes de ter sua vida interrompida por uma execução brutal, ela entoava a frase “eu sou porque nós somos” e defendia que mais mulheres negras como ela ocupassem a política. No pleito do último domingo, algumas das sementes de Marielle brotaram pelo País.
As herdeiras do legado de Marielle
O Rio de Janeiro elegeu quatro mulheres negras amigas de Marielle, todas pelo Psol: Talíria Petrone, deputada federal, e Renata Souza, Mônica Francisco e Dani Monteiro, que trabalhavam como assessoras da vereadora, deputadas estaduais.
Talíria Petrone, 33 anos, é professora de história, negra, feminista e vereadora em Niterói desde 2016, quando iniciou seu mandato ao lado de Marielle, que ocupava a mesma cadeira do outro lado da ponte Rio-Niterói. Ela chega a Câmara dos Deputados no ano que vem com o apoio de 107 mil eleitores. Foi a nona mais votada no estado e a segunda entre os candidatos do Psol.
Além de compartilharem a vitória nas urnas em 2016 e as mesmas bandeiras, Talíria e Marielle eram amigas. Na Câmara dos Deputados, Talíria promete defender, entre outras pautas, a descriminalização e legalização do aborto, uma nova política em relação às drogas – para reduzir o encarceramento em massa e morte da juventude negra – e a derrubada do projeto Escola sem Partido.
“Se nosso corpo e nossa voz não estão nos espaços de decisão, a nossa pauta e a nossa vida não vai estar também”, disse durante a campanha. Após o resultado das urnas no domingo, Talíria comemorou a eleição de Renata, Mônica e Dani. “Três mulheres negras do PSOL eleitas para a Alerj. Três assessoras de Marielle Franco. Três sementes que brotaram do asfalto. Que orgulho!”, publicou em sua conta no Twitter.
Três mulheres negras do PSOL eleitas para a Alerj. Três assessoras de Marielle Franco. Três sementes que brotaram do asfalto. Que orgulho! @MonicaFPsol @danimontpsol @renatasouzario
— Talíria Petrone (@taliriapetrone) 8 de outubro de 2018
Renata, ex-chefe de gabinete de Marielle, foi eleita com quase 64 mil votos – a nona mais votada entre os 70 deputados estaduais eleitos no Rio. Mulher, negra e criada na favela da Maré, na zona norte do Rio, Renata cursou pré-vestibular comunitário, formou-se jornalista na PUC-Rio com bolsa integral, fez mestrado e doutorado na UFRJ e hoje, aos 36 anos, é pós-doutoranda em comunicação pela UFF. Assim como Marielle, trabalhou ao longo de dez anos com Marcelo Freixo, hoje eleito deputado federal, na Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Alerj.
“Sou uma das três mulheres negras do PSOL eleita para a Alerj. Nunca mais estaremos sozinhas nos espaços de poder. Mari tá fazendo festa no céu”, comemorou Renata. Ao lado de Dani e Mônica, ela irá compor a bancada de cinco deputados estaduais do Psol a partir do dia 1º de janeiro de 2019.
Honramos a memória de @marielle_franco . Sou uma das três mulheres negras do PSOL eleita para a Alerj. Nunca mais estaremos sozinhas nos espaços de poder. Mari tá fazendo festa no céu. E toda a cidade é de Oxum ❤️🌻❤️ #mariellepresente #lutecomumapreta #renatasouza50007 pic.twitter.com/ZTXHqvGZL1
— Renata Souza (@renatasouzario) 8 de outubro de 2018
Mônica Francisco, 48 anos, também teve uma votação expressiva no último domingo – 40,6 mil votos lhe garantiram uma cadeira na Alerj a partir do ano que vem. Cientista social, pastora evangélica e militante dos direitos civis há 30 anos, ela também foi assessora de Marielle na Câmara Municipal do Rio e já era a aposta da vereadora para as próximas eleições municipais.
“Foi a minha experiência e trajetória no ativismo, na defesa dos direitos humanos, a minha relação com o movimento popular de favelas e o movimento de mulheres por quase 30 anos, que me legitimaram e me levaram ao mandato de Marielle. Ela via na minha figura uma possibilidade de quadro. É claro que a execução de Marielle precipitou muito esse processo e foi um dos principais elementos de fazer com que eu decidisse aceitar esse desafio e me candidatasse. A importância de ter trabalhado no mandato de Marielle é imensa”, disse Mônica em entrevista a Ponte Jornalismo.
Dani Monteiro é a mais jovem do trio de assessoras de Marielle eleitas para ocupar a Alerj. Ela recebeu quase 28 mil votos. Aos 27 anos, Dani acumula alguns anos de militância pelo direito à cidade e integra o Movimento Negro Unificado (MNU) e o coletivo RUA Juventude Anticapitalista. Ela defende que seu mandato seja um novo jeito de fazer política, construído pelas juventudes, de forma anti racista e feminista.
Outras mulheres eleitas pelo Brasil
Pelo País, outras mulheres negras que lutam a mesma luta de Marielle foram eleitas para as esferas estaduais e federal. A vereadora de Belo Horizonte Áurea Carolina, do Psol, multiplicou quase dez vezes a votação que à levou ao cargo em 2016 e garantiu, com mais de 162 mil votos, a sua ida à Câmara dos Deputados no ano que vem. Ela teve a quinta maior votação de Minas Gerais e foi eleita deputada federal pelo estado.
“Vamos aquilombar as instituições em Brasília. Vamos aquilombar os grandes poderes. Fazer [da Câmara dos Deputados] um espaço de resistência, de enfrentamento às injustiças”, afirmou ao UOL. Ao lado de Áurea, a advogada popular Andréia de Jesus, também do Psol, foi eleita deputada estadual em Minas.
A Bahia elegeu a sua primeira deputada estadual negra no último domingo: a professora Olívia Santana, do PCdoB, recebeu quase 58 mil votos. Formada em pedagogia pela UFBA (Universidade Federal da Bahia), ela acumula larga experiência na política. Atuou como vereadora por 10 anos em Salvador, foi secretária de Educação e Cultura da capital baiana, secretária estadual de Políticas para as Mulheres e, recentemente, chefiou a secretaria de estado de Trabalho, Emprego e Renda.
Em Pernambuco, a chapa coletiva Juntas, do Psol, recebeu quase 40 mil votos e vai levar a assembleia legislativa do estado cinco mulheres. Dentre elas está Robeyoncé Lima, mulher negra, transexual e a primeira advogada a ter o direito de usar o nome social na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do estado. “Se a gente não tiver nesse contexto, inseridas nesses sistemas políticos, a política não vai fazer nada pela gente”, disse em entrevista ao HuffPost Brasil.
No estado de São Paulo, a educadora e ativista Érica Malunguinho da Silva, do Psol, foi eleita deputada estadual com 55,2 mil votos. Ela é a primeira mulher trans a conquistar uma vaga na Assembleia Legislativa paulista. Negra e nordestina, nascida em Pernambuco, Érica está em São Paulo há cerca de 15 anos, onde tem uma trajetória de militância antiga. Ela transformou seu ateliê de arte numa espécie de centro cultural, intitulado de “Aparelha Luzia”. No local, ocorrem debates, cursos e eventos sociais em torno da temática de combate ao racismo.
A ativista e estudante de gerontologia na Universidade Federal de São Carlos, Erika Hilton, vai acompanhar Malunguinho nos próximos quatro anos na Alesp. Mulher trans e negra, ela faz parte da Bancada Ativista, chapa coletiva do Psol eleita no último domingo com quase 150 mil votos. O mandato coletivo é liderado por outra mulher negra, Mônica Seixas, jornalista e ativista ambiental.
Atuantes na política há mais tempo, a ex-governadora do Rio de Janeiro, Benedita da Silva, foi reeleita para o cargo de deputada federal pelo PT, e Leci Brandão terá mais um mandato como deputada estadual em São Paulo pelo PCdoB.