Em debate organizado pela ARTIGO 19, convidados ressaltam a importância de garantir o acesso à informação sobre aborto legal, sobretudo para as mulheres e para os profissionais da saúde responsáveis por efetivar este direito no Brasil
(Artigo 19, 05/11/2018 – acesse no site de origem)
No Brasil, a interrupção da gestação é um direito previsto em lei em três situações: quando é decorrente de estupro, quando há risco de morte para a gestante ou se o feto é anencéfalo. Apesar de legalizada nessas situações específicas, a possibilidade da interrupção da gestação ainda não pode ser classificada como um direito plenamente garantido às mulheres nos diferentes contextos vividos no amplo território brasileiro.
Entre os entraves estruturais que perpetuam esta situação, a violação do acesso à informação é um obstáculo que precisa ser superado: para acessar o abortamento legal, é necessário conhecer esse direito e saber ainda onde e como exercê-lo. É necessário ainda que haja serviços de saúde disponíveis e com profissionais bem informados para garantir um atendimento humanizado e qualificado às mulheres. Na prática, porém, as desigualdades e discriminações de gênero ainda prevalecem em muitos casos.
As barreiras que existem nesse sentido e os caminhos para superá-las foram o tema de um encontro realizado no dia 23/10 pela ARTIGO 19, em São Paulo, com o objetivo de discutir um breve panorama de acesso à informação e aborto legal no Brasil. Para contribuir com o debate, foram convidados o ginecologista e membro fundador do Board Diretivo da Global Doctors for Choice de New York, Cristião Rosas, a jornalista e analista júnior de comunicação na Global Health Strategies, Natália Veras, e a jornalista e editora na Gênero e Número, Carolina de Assis.
Júlia Rocha, assessora de projetos na área de Acesso à Informação da ARTIGO 19, lembrou que a falta de informação sobre direitos sexuais e reprodutivos das mulheres é uma lacuna histórica no país. “Uma pesquisa apontou que 95% das mulheres desconheciam ou não tinham informações sobre violência sexual e acesso ao aborto legal, e que 48% das mulheres não faziam ideia de quais eram as situações em que o aborto poderia ser feito legalmente”, disse, resgatando dados de um estudo feito em 2005 pelo movimento Católicas pelo Direito de Decidir sobre percepções de aborto no Brasil.
O médico Cristião Rosas apontou ainda que, assim como os cidadãos e cidadãs, boa parte dos profissionais de saúde não têm informações e sensibilização profissional para trabalhar em casos de aborto legal no Sistema Único de Saúde. “Isso só caracteriza o quanto há de má gestão dentro dos próprios hospitais públicos”, afirma.
Outro entrave identificado pelos participantes foram as dificuldades encontradas por jornalistas e comunicadores para acompanhar o tema. Natália Veras, da Global Health Strategies, reforçou a importância da criação de manuais e protocolos para jornalistas e profissionais da área da saúde sobre os cuidados na hora de tratar temas como estupro e realização do aborto previsto em lei no Brasil, que podem ajudar a evitar a propagação de conteúdos discriminatórios ou revitimizadores.
Carolina de Assis, editora na Gênero e Número, explicou ainda que, muitas vezes, é difícil para jornalistas avaliarem dados que nem sempre estão disponíveis e, quando solicitados, chegam em formato de tabelas e planilhas complexas. “No debate sobre gênero tem muita desinformação e a gente julga que sem os dados fica mais difícil das pessoas refutarem certos problemas”, disse.
No dia 25 de novembro, a ARTIGO 19 irá lançar um relatório sobre acesso à informação e aborto legal no Brasil.
Assista o vídeo da transmissão ao vivo feita durante o debate: