Nosso enfrentamento começa agora, em novembro, mas requer atuação durante todo o ano, dia após dia; saiba como ajudar vítimas
(Catraca Livre, 06/11/2019 – acesse no site de origem)
Os números são impactantes: pesquisas mostram o crescimento de vítimas de feminicídio e agressões contra mulheres a cada ano no Brasil. De 2017 para 2018, por exemplo, a alta de feminicídios foi de 4%. Em 2017, mais de 221 mil mulheres procuraram delegacias de polícia para registrar agressões em decorrência de um problema social complexo, bastante conhecido, mas pouco debatido: a violência doméstica.
Os dados são do Atlas da Violência e do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019. Esse tipo de violência atinge principalmente mulheres negras, mas também faz entre suas vítimas mulheres brancas, indígenas, pardas, amarelas. Não faz distinção entre adultas, idosas, jovens e crianças, nem entre mulheres cis ou trans, e héteros, lésbicas ou bissexuais.
Atinge quem mora na região Norte do Brasil assim como quem está no Nordeste, no Centro-Oeste, no Sudeste ou no Sul. Tampouco escolhe classe social: dia a dia, faz vítimas em comunidades pobres, na classe média e também em casas luxuosas. Ela não distingue vítimas com preferência ideológica à esquerda, à direita nem ao centro.
Depois de consultar especialistas no tema — a promotora Fabíola Sucasas, do Ministério Público de São Paulo, Jamila Jorge Ferrari, coordenadora das Delegacias de Defesa da Mulher do Estado de São Paulo, e Ana Beatriz El-Kadri, da ONG Mapa do Acolhimento —, a Catraca Livre desenvolveu a campanha #ElaNãoPediu, de enfrentamento à violência doméstica.
E por que #ElaNãoPediu? Simples: a campanha também busca desmistificar frases reproduzidas pela sociedade, mas que são prejudiciais às próprias vítimas. Afinal, a mulher não apanhou por que “estava pedindo”, não pediu para sofrer violência psicológica, não pediu para ser impedida de exercer sua profissão, não pediu para ser humilhada, não pediu para ser afastada de amigos e familiares. Não. #ElaNãoPediu.
O lançamento em novembro tem como objetivo dar destaque ao Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher, celebrado no dia 25. A campanha, que estreia agora, tem três eixos:
– o primeiro é a produção de conteúdos que destrincham o problema e mostram caminhos possíveis para resolvê-lo;
– o segundo, a divulgação de uma websérie nas redes sociais da Catraca. Em quatro episódios, contamos histórias de mulheres vítimas da violência doméstica pelo Brasil e discutimos a questão a partir da análise de especialistas;
– o terceiro, a entrega, no dia 25, de uma ferramenta que centraliza programas de combate ao problema e também oferece, a partir de um quizz simples, caminhos para quem ainda não sabe que tipo de ajuda precisa para sair do ciclo da violência. São, inicialmente, 200 iniciativas, entre projetos do poder público e outros desenvolvidos pela sociedade civil, presentes nas 26 capitais e no Distrito Federal.
Ouvimos histórias de vítimas dessas agressões que, quase sempre, têm um mesmo padrão: um ciclo que se repete por muito tempo até que a mulher consiga perceber que vive um relacionamento abusivo e que, na maioria das vezes, vai precisar de uma rede de apoio para conseguir romper este ciclo e se libertar do agressor.
Outro ponto importante: a violência é algo gradual. A agressão física nem sempre é o primeiro ato do agressor. Geralmente, o relacionamento abusivo tem início com pressões psicológicas, humilhação e falas que minam aos poucos a autoestima da vítima.
Uma rede de apoio eficiente é multifacetada. Vai cercar a vítima a partir de acolhimento, apoio psicológico, ajuda jurídica, e, dependendo do caso, oferecer atendimento médico e odontológico, além de capacitar a mulher para que ela possa ter uma renda e se torne independente financeiramente. O trabalho de prevenção é considerado o mais importante: quanto mais cedo meninos e meninas estiverem sensibilizados para o tema, menor deve ser a ocorrência dessas agressões.
Neste mês, vamos mostrar o retrato da violência doméstica no Brasil, divulgar relatos de quem está vivendo essa realidade e apresentar quem atua na linha de frente. Mas não fiquemos só em novembro: compartilhe sempre conteúdos e serviços de fontes seguras que podem ajudar outras mulheres a se desvencilhar do problema.
Por Alessandra Petraglia, Heloisa Aun e Paula Lago