Após ser espancada na orla da Barra da Tijuca, a influenciadora digital foi alvo de críticas e piadas na Internet, mas recebeu apoio de organizações
(O Globo, 18/12/2019 – acesse no site de origem)
RIO — Há três anos a youtuber assumidamente gay Karol Eller postou um vídeo no seu canal no Youtube no qual pediu “menos vitimismo” por parte dos homossexuais. “Não é porque um gay morreu assassinado que é homofobia”, dizia ela na mensagem.
No domingo passado (15), ela foi espancada por um homem em um quiosque na Barra da Tijuca (Zona Oeste do Rio) em “um caso típico de homofobia”, segundo a delegada que registrou o caso como lesão corporal e injúria por preconceito. Atacada nas redes sociais por ser apoiadora de Jair Bolsonaro, ela ganhou solidariedade por parte de grupos de defesa dos direitos LGBTI.
No Instagram, no post no qual mencionava a agressão sofrida no fim de semana, muitos dos 45 mil comentários têm tom agressivo, com risadas, piadas, xingamentos e frases como “bem-feito” ou “fale de mimimi agora”.
A posição dos grupos de defesa dos direitos LGBTI, porém, vai na direção oposta:
— Nós temos que ser solidários, ela tem que ser acolhida, até para que ela perceba o quanto errou. Ela não entendia a necessidade da lei contra a homofobia. Queremos nossos direitos para preservar as pessoas de passar pelo que ela passou. Não sei se ela vai mudar, mas não podemos nos tornar iguais a quem criticamos — afirmou a responsável pela coordenação política da Associação Brasileira de Lésbicas e pela coordenação nacional do Movimento D’Ellas, Yone Lindgren.
O Grupo Gay da Bahia, uma das organizações mais antigas do Brasil, tem a mesma posição. Para o presidente, Marcelo Cerqueira, Karol Eller tinha uma “homofobia internalizada” e talvez por isso tenha se aproximado de pessoas que tinham “comportamento hostil aos homossexuais”.
— Ela achava que nossa luta era “mimimi”, que era vitimismo, agora ela sofreu na pele. O nosso movimento repudia esse tipo de agressão que ela sofreu porque somos pela paz, harmonia e amor — disse Cerqueira. — As pessoas estão pegando pesado nas redes sociais, está barra pesada. Ninguém tem esse direito.
O Grupo Arco-Íris afirma que vai cobrar da polícia civil a investigação rigorosa dos fatos. O coordenador do movimento, Claudio Nascimento, disse que “discriminação é discriminação, não importa contra quem, e nós vamos sempre repudiar”.
— Que esses setores mais conservadores possam enxergar que a discriminação e o assassinato de homossexuais no Brasil não é algo abstrato, é algo concreto que acontece cotidianamente.
A Aliança Nacional LGBTI+ emitiu nota na qual apresenta solidariedade à youtuber e repudia quem “ouse justificar tamanha violência” pois “os agressores são os culpados, e não aceitamos que a vítima seja responsabilizada”.
— Nós não somos bárbaros. Independentemente de tudo, ela sofreu uma violência, e temos que estar ao lado de quem sofreu a violência. Mesmo ela falando que não se identifica com a lgbtfobia, porque a nossa capacidade de humanidade desce ao grau zero. Nos solidarizamos independentemente de qualquer coisa, como nos solidarizaríamos por qualquer crime lesbofóbico — diz Toni Reis, diretor da Aliança. — Essa pessoa que bateu nela tem um problema com a sua própria sexualidade. Parece que a namorada é bonita, e ele ficou incomodado. É o cúmulo do machismo, do patriarcado.
Vitimismo e ‘mimimi’
Karol Eller é muito ativa nas redes há alguns anos, mesmo antes de se aproximar da família Bolsonaro. Seu vídeo mais criticado foi postado em seu canal no Youtube em março de 2016.
“Todo dia morre um policial, todo dia morre um hétero, todo dia morre um gordo, todo dia morre um negro, todo dia morrem várias pessoas assassinadas, pelo amor de Jeová. Então, menos vitimismo. Não é porque um gay morreu assassinado que é homofobia. Tem muito gay que faz cagada. Tem muito hétero que faz cagada, que anda com pessoas erradas e às vezes sofre mesmo, é vítima mesmo de pessoas malvadas. Não só por ser gay, mas porque nosso mundo hoje é podre. Para com essa palhaçada de vitimismo que todo dia morre uma bicha, um sapatão. Não é assim que vocês falam da gente?”, afirmou na mensagem.
Em diversos vídeos e posts, a influenciadora digital diz que é contra ativismo, feminismo e que só quer “viver a minha vida”. Mas também pede respeito aos homossexuais.
No dia em que a Suprema Corte americana aprovou o casamento gay em todo o país, em junho de 2016, ela postou um vídeo chorando no qual faz um “desabafo”:
“Estou muito indignada com as pessoas que estão julgando isso que a gente lutou tanto para conseguir. Vocês não têm que nos engolir ou concordar, apenas respeitar o nosso sentimento. Nós, gays, temos um coração. Nós não somos animais, somos humanos, pessoas civilizadas e temos que aprender a respeitar o próximo. Eu só quero respeito.”