Em tempos de coronavírus, a regra é clara, em todas as línguas: “fique em casa”. No entanto, para milhões de mulheres e crianças em todo o planeta, o confinamento se torna uma tortura com homens violentos dentro do lar. O alarme vermelho soou na França em março, quando o ministro do Interior, Cristophe Castaner, declarou que a violência doméstica havia aumentado 32% no país. Nesta segunda-feira (6), o governo francês lançou um número nacional destinado a “homens violentos”, numa tentativa de diminuir as estatísticas da violência dentro de casa.
(RFI, 06/04/2020 – acesse no site de origem)
Na França, desde março, já é possível encontrar nas farmácias um sistema de alerta para ajudar mulheres vítimas de violência doméstica. O dispositivo com um número de telefone 0800 destinado a homens agressivos durante o confinamento foi lançado nesta segunda-feira (6) e anunciado no Twitter pela secretária de Estado da Igualdade entre Homens e Mulheres do governo Macron, Marlène Schiappa.
“O número de prevenção de #ViolencesConjugales (Violências Conjugais, em francês) será lançado hoje. Salve sua família da violência: faça seu acompanhamento no 08.019.019.11”, tuitou Schiappa. Ela havia anunciado a criação desse número, o primeiro dedicado a homens violentos, em entrevista ao jornal Ouest France na quinta-feira (2).
“O confinamento atinge a história familiar e pessoal de cada um. Essa situação às vezes cria ansiedade, há menos saídas e válvulas de alívio de pressão, e isso às vezes pode agravar as tensões”, declarou a secretária, completando que” não há vergonha em ligar”.
Esta linha, financiada pela Delegacia dos Direitos da Mulher e gerenciada pela Federação Nacional de Autores de Violência (Fnacav), está aberta de segunda a domingo, das 9h às 19h, em todo o território francês.
Durante o período de confinamento devido à Covid-19, 22 interventores, psicólogos ou especialistas no tratamento de autores de violência se disponibilizarão para oferecer escuta e colocar os interlocutores em contato com uma das 36 estruturas membros do Fnacav. Cada um deles pode receber até três chamadas simultaneamente.
“À beira da violência”
“O objetivo é permitir que as pessoas à beira da violência, ou que já estão dentro, telefonem para encontrar uma escuta e começar um trabalho”, disse Alain Legrand, presidente da Fnacav, pedindo: “Çigue antes de agredir”. Soluções de acomodação temporária, em centros ou em quartos de hotel, também podem ser oferecidas, dependendo da situação.
“O cuidado de homens que se sentem à beira de agir evita muitos casos e recorrências. Alguns saem da violência, outros conseguem se distanciar, mesmo que, é claro, para outros, nada funcione”, continuou Legrand, que até agora só estava na linha direta da federação e recebia de quatro a cinco ligações violentas de cônjuges por semana.
Nesta segunda-feira, a presidente da Anistia Internacional França, Géneviève Garrigos, lançou nas redes sociais uma campanha com a hashtag #UnDrapBlancAuFenetres (“Um lençol branco nas janelas”, em francês), para enviar uma mensagem de apoio às mulheres vítimas de violência doméstica na França, a exemplo da iniciativa que nasceu originalmente na Itália.
Desde o início da quarentena, o Executivo argentino também vem adotando medidas para proteger as mulheres do aumento da violência doméstica. O presidente da Argentina, Alberto Fernández, classificou as violências domésticas como prioritárias, ao lado de crimes contra a saúde pública ou abuso de privação de liberdade no país.
A cada ano, mais de 210.000 mulheres são vítimas de violência doméstica na França e menos de uma em cada cinco apresenta uma queixa. Em 2018, 18.591 pessoas foram condenadas por violência contra seu parceiro ou ex-parceiro, 96% dos quais são homens.
ONU exorta países a protegerem mulheres da violência doméstica
O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, lançou um apelo global no domingo (5) para proteger mulheres e meninas da violência doméstica. O confinamento de quase 3 bilhões de pessoas para combater a pandemia de coronavírus levou a um aumento acentuado da violência dentro das casas, em vários países.
Este é o segundo apelo de Guteres contra a violência de gênero e a violência contra as mulheres nos domicílios, que progrediu em muitos países em face do confinamento generalizado. “Nas últimas semanas, à medida que as pressões econômicas e sociais pioraram e o medo aumentou, o mundo experimentou um surto terrível de violência doméstica”, disse o chefe da ONU.
Guterres exortou os Estados a agirem rapidamente. “Peço a todos os governos que tomem medidas para prevenir a violência contra as mulheres e forneçam soluções para as vítimas como parte de seu plano de ação nacional contra a Covid-19.”
Nos Estados Unidos, várias cidades relataram um número crescente de casos de violência doméstica e ligações para o assunto. Na Índia, o número de casos dobrou durante a primeira semana de restrições de movimento, de acordo com a Comissão Nacional para as Mulheres.
Ativistas turcos também pediram uma melhor proteção das mulheres devido ao aumento de assassinatos contra elas desde a recomendação do governo de confinamento em 11 de março. Já a primeira semana de confinamento na África do Sul resultou em quase 90.000 denúncias de violência. O governo australiano relatou um aumento de 75% nas buscas na Internet por apoio diante da violência doméstica.