Publicações científicas no Reino Unido têm menos submissões de artigos feitos por mulheres. Relatos apontam que, no isolamento social, mulheres estão deixando pesquisa de lado
(MarieClaire, 12/05/2020 – acesse no site de origem)
A pandemia do coronavírus vem causando abismos ainda mais acentuados em diferentes aspectos da desigualdade de gênero. O mais recente deles é a produção científica de mulheres que vem sendo prejudicada desde o estabelecimento das medidas de isolamento social.
Segundo reportagem publicada no jornal The Guardian, a Dra. Elizabeth Hannon, editora do British Journal for the Philosophy of Science” percebeu em abril que o número de artigos enviados à publicação e feitos por mulheres havia caído drasticamente. No entanto, o mesmo não se aplicava à quantidade de pesquisas assinadas por homens.
No Twitter, Hannon fez um post chamando atenção para o fato. “Número insignificante de envios de mulheres no último mês”, escreveu. “Nunca vi algo como isso.” A resposta foi uma manifestação de diferentes acadêmicas dizendo que estavam frustradas pois a supervisão da educação e cuidados com os filhos havia recaído sobre elas, desde o início da pandemia, quando muitas escolas e cresches fecharam.
“Já ouvi muitas histórias de mulheres de projetos abandonados, colaborações com as quais eles se sentiram incapazes de continuar. É extremamente preocupante, especialmente para a filosofia, que já tem muito trabalho a fazer em termos de igualdade de gênero”, disse Hannon ao Guardian.
Já em outra publicação científica renomada, a revista Comparative Political Studies, as entregas de homens aumentaram quase 50% em abril, de acordo com seu co-editor, David Samuels. A preocupação é que o isolamento social agrave mais ainda a desigualdade de gênero em uma área que mesmo antes da pandemia já não era equilibrado.
Sem tempo
Além do cuidados com os filhos, Elizabeth diz que muitas mulheres acabam tendo de dar atenção a parentes mais velhos ou doentes e se disse preocupada que muitas estariam deixando a pesquisa de lado por causa do aumento das tarefas domésticas. É o caso de Jenny Hallam, que leciona psicologia na Universidade de Derby e foi ouvida pelo jornal e está em casa com os filhos de quatro e sete anos, fazendo homeschooling.
A médica Viki Male, imunologista do Imperial College London, disse ao Guardian que “definitivamente existe um perigo” de que as mulheres acadêmicas possam estar sofrendo mais com o lockdown do que seus colegas e concorrentes homens. Viki está cuidando de seus filhos, de três e seis anos, além de administrar seu laboratório, ministrar palestras – incluindo uma nova sobre imunidade ao Covid-19 – e consultar seus alunos. Ela costuma passar 16 horas por dia trabalhando e cuidando de crianças. A professora contou que o marido também se envolve nas tarefas de casa, mas, como ela ganha menos e pode ser mais flexível na rotina, a maior parte dos cuidados com a família ficam com ela.
“Faz sentido para mim cuidar da casa das 9 às 5″, diz ela. “Eu suspeito que, em todo o país, outros casais tiveram o mesmo tipo de conversa que tivemos. Provavelmente reflete maneiras sistêmicas nas quais os empregos de homens e mulheres geralmente diferem”.
No Brasil, um estudo feito em 2018 e apresentado Simpósio Brasileiro sobre Maternidade e Ciência constatou que 54% das mães pesquisadoras ouvidas eram as únicas cuidadoras das crianças e 40% tinham dois filhos. Além disso, 45% afirmou não ter tempo de trabalhar em casa e quase 60% das entrevistadas avaliam que a maternidade teve impacto negativo em suas carreiras, e 56% disseram não conseguem cumprir prazos.