(Agência Patrícia Galvão | 06/08/2020 | Por Beatriz Accioly Lins)
No dia 6 de agosto de 1985, há exatos 35 anos, foi inaugurada na cidade de São Paulo a 1ª Delegacia de Defesa da Mulher, um equipamento da polícia investigativa (civil) voltado para o atendimento a mulheres acometidas por violências doméstica e/ou sexual. A 1ª DDM foi pioneira no mundo, fazendo das delegacias especializadas para mulheres (ou DEAMs, em alguns estados) uma invenção brasileira em termos de política pública.
O surgimento das DDMs deu-se no período de redemocratização e em meio a muitas críticas ao descaso institucional do sistema de justiça e do Estado brasileiro em relação a situações de violência contra mulheres, em especial em âmbito conjugal.
Não foram raras situações em que assassinos de companheiras eram absolvidos ou tratados com leniência em nome da “legítima defesa da honra”, com a mulher sendo moralmente atacada e considerada culpada pela própria morte.
Criadas no governo Franco Montoro (PMDB), as DDMs tiveram a chancela do então secretário de segurança pública paulista Michel Temer, mas são fruto mesmo da forte militância das mulheres nos anos 1970, que chamavam a atenção para a necessidade do Estado “meter a colher” na garantia de direitos, mesmo que se tratasse de situações familiares e íntimas. O privado é público, dizia o slogan tornado política pública.
Em 1983, foi criado em São Paulo o Conselho Estadual da Condição Feminina (CECF), que propunha atendimento integral às mulheres vítimas de violência, não só pela segurança pública, como também com assistências social e psicológica. A resposta do governo Montoro, por uma série de questões que podemos abordar depois, foi a inusitada (e combatida) delegacia especializada, que a princípio foi pensada como uma política pública mais interdisciplinar, mas na prática acabou encapsulando a violência no tratamento criminal, ainda que não houvesse na época um ordenamento jurídico específico para esses casos.
Há muitas críticas e sugestões que já foram e ainda serão feitas às DDMs, a maioria delas pertinentes, necessárias e até emergenciais. Não obstante, as DDMs abriram as porteiras práticas para a elaboração e a criação de diversas mudanças legislativas e inovações em políticas públicas que sinalizam a necessidade da garantia do direito à integridade e ao bem-estar das cidadãs brasileiras. Entre elas, inclusive, a Lei Maria da Penha, que não por acaso aniversaria amanhã.
Tenho muito carinho pela 1ª DDM, em suas virtudes e em seus muitos gargalos, espaço em que passei dois anos acompanhando o expediente policial.
Deixo aqui uma foto da dra. Rosmary Corrêa, 1ª delegada-titular da 1ª DDM, em 1985. Hoje, a delegacia faz parte da Casa da Mulher Brasileira de São Paulo, inaugurada ano passado, um equipamento mais integral e multidisciplinar que se aproxima bastante das formulações do CECF, lá de 1983.
Beatriz Accioly Lins é doutora em Antropologia Social e pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre os Marcadores Sociais da Diferença (NUMAS/USP). Contato: [email protected]