Aborto remoto, preconceito de perto

03 de junho, 2021

Como funciona um inédito serviço de aborto legal por telemedicina que virou alvo de conservadores

(Piauí | 03/06/2021 | Por Fernanda Da Escóssia e Luigi Mazza | Acesse a matéria no site de origem)

Foi numa tarde de novembro do ano passado que a menina chegou com a mãe ao Hospital de Clínicas de Uberlândia. Foram direto ao Nuavidas (Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual). A mãe contou a história da garota à ginecologista Helena Paro: a filha fora a uma festa sem a mãe saber, um rapaz lhe ofereceu uma bebida… no meio da noite, a garota foi encontrada desmaiada por uma amiga num quarto, sozinha. Semanas depois, contou para a mãe sobre o atraso da menstruação. Estava grávida. Tinha 13 anos. E, com o apoio da mãe, queria interromper a gravidez.

A partir daquela primeira consulta, a garota tornou-se uma das dezessete pacientes atendidas pela equipe de Paro para fazer o aborto legal por telemedicina – procedimento que, no Brasil, só é realizado no Nuavidas. A legislação brasileira autoriza o aborto em caso de estupro, de anencefalia fetal (fetos que não desenvolvem o cérebro) e risco de vida à mulher. O Nuavidas, criado em 2017, firmou-se como um dos centros de referência para o aborto legal no país. Funciona no Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia. Recebeu, em 2020, 138 mulheres e 244 meninas de até 12 anos vítimas de violência sexual – sim, mais meninas que adolescentes e adultas. O padrão etário vem se repetindo este ano: 48 adultas e 105 meninas, pelos dados até 12 de março. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que quase 60% das vítimas de violência sexual no Brasil tinham no máximo 13 anos – em 2019, 38 mil crianças foram alvo desse tipo de crime.

Em 2020, com os leitos do hospital ocupados pela Covid, o Nuavidas se viu ameaçado de não conseguir receber as pacientes. A equipe então se lembrou de que, justamente por causa da pandemia, o uso da telemedicina foi expressamente autorizado pela Lei nº 13.989/2020, em caráter emergencial, e pela portaria nº 467/2020 do Ministério da Saúde. Com a lei debaixo de um braço e a portaria debaixo do outro, Paro começou a batalha para implantar o atendimento híbrido, parte presencial, parte por teleconferência. Em agosto de 2020, com a concordância da direção do hospital universitário, da Comissão de Ética da instituição e do Ministério Público Federal em Uberlândia, o protocolo do aborto assistido por telemedicina – relatado na medicina desde 2006, mas até então inédito no Brasil – saiu do papel. É aplicado para interromper gestações de até 63 dias (nove semanas) e apenas quando for possível fazer o aborto legal induzido por medicamentos, sem procedimento cirúrgico.

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