Cabe agora ao governo alterar a lei.
(HuffPost Brasil, 31/05/2018 – acesse no site de origem)
O anúncio do resultado do referendo irlandês sobre o aborto, feito no último sábado (25, em Dublin, perante multidões de ativistas que lutaram por esse direito, assinalou o início de uma nova era na história do país. Quase 35 anos após a introdução da 8ª Emenda à Constituição da Irlanda, que deu a mulheres grávidas e fetos o mesmo direito à vida, 66,4% dos eleitores votaram em favor da legalização do aborto.
Mas, apesar da vitória esmagadora da campanha pela revogação da emenda – todos menos um dos distritos eleitorais irlandeses votou pela revogação –, no dia após o anúncio do resultado as mulheres irlandesas ainda não tinham acesso à interrupção da gravidez em seu país. E a garantia desse direito ainda será demorada.
Então, o que acontece agora?
A responsabilidade de executar a vontade expressa pela população irlandesa cabe agora ao governo, liderado pelo primeiro-ministro Leo Varadkar, defensor declarado da campanha do “sim” no referendo.
Após a votação decisiva no sábado, o ministro da Saúde, Simon Harris, prometeu apresentar uma nova legislação sobre o aborto. No Castelo de Dublin, ele comandou os gritos de “Sim, fizemos!”.
Nos próximos dias ele vai apresentar ao gabinete um projeto de lei a ser discutido internamente. A expectativa é que a nova legislação seja apresentada para a discussão pelo Parlamento ainda neste ano.
Pela legislação proposta, as mulheres terão direito ao aborto nas primeiras 12 semanas de gravidez, sujeitas a ouvirem conselhos médicos e passarem por um período de espera de três dias para lhes dar a chance de rever sua decisão. Sob circunstâncias excepcionais, o aborto será permitido até 24 semanas de gravidez. O governo espera que o novo regime de aborto seja implementado legalmente até o final do ano.
Na esteira do resultado do referendo, Varadkar afirmou que o voto assinala “o dia em que a Irlanda saiu debaixo da derradeira das nossas sombras e se colocou sob a luz. “Hoje temos uma Constituição moderna para um povo moderno”, ele ponderou.
O que isso significa para a Irlanda do Norte?
Após o resultado na República da Irlanda, a atenção agora se volta à Irlanda do Norte. Apesar de ela fazer parte do Reino Unido, o aborto é ilegal na Irlanda do Norte, sendo proibido até mesmo em casos de incesto e estupro.
O DUP (Partido Unionista Democrático) já assinalou que é contra a liberalização das leis de aborto. A líder do partido, Arlene Foster, declarou que o referendo na Irlanda “não terá impacto sobre a lei na Irlanda do Norte”.
“Um referendo foi promovido na República da Irlanda devido à proibição constitucional ao aborto que existia nesse país. Não existe essa proibição constitucional na Irlanda do Norte”, disse Foster.
“O DUP é um partido pró-vida (antiaborto), e vamos continuar a defender nossa posição. O aborto é uma questão extremamente delicada e que não deveria atrair pessoas às ruas para festejar.
“Alguns dos setores que reivindicam uma mudança na lei são os mesmos que obstroem a autonomia de poderes da Irlanda do Norte ou reivindicam que Westminster altere a lei, ao mesmo tempo em que se opõem ao fato de a Irlanda do Norte ser regida diretamente pelo governo do Reino Unido. ”
Mas outros políticos e ativistas se manifestaram a favor de a Irlanda do Norte liberalizar sua posição em relação ao aborto.
A presidente do Sinn Fein (partido político republicano irlandês), Mary Lou McDonald, e a vice-líder Michelle O’Neill ergueram uma faixa com os dizeres “A Irlanda do Norte será a próxima”.
Indeed it is. #together4yes #sf4yes pic.twitter.com/9agWDUeQxC
— Sinn Féin (@sinnfeinireland) 26 de maio de 2018
nquanto isso, a ministra da Educação britânica Anne Milton, do Partido Conservador, disse no programa “Peston on Sundat”, da rede ITV, que vai defender a liberalização das leis do aborto na Irlanda do Norte.
“Eu soube que uma pesquisa feita no ano passado indicou que a maioria da população da Irlanda do Norte quer uma mudança na lei”, ela disse. “A situação atual parece uma anomalia. As mulheres da Irlanda do Norte fazem abortos na Inglaterra, mas isso não parece certo. A população da Irlanda do Norte precisa refletir sobre o assunto.”
Considerando que não há Assembleia da Irlanda do Norte, Milton disse que, se um deputado propuser uma emenda, seria recomendável proceder a uma votação livre da mesma. “Pessoalmente”, ela disse, “acredito no direito de escolha da mulher.”