(CBN, 08/07/2015) Levantamento do Conselho Federal de Medicina mostra que a situação se repete na rede particular. Muitas maternidades mudaram de ramo em busca de mais lucro. Para garantir vaga em unidades de atendimento, médicos têm agendado cirurgias cesáreas.
Aos oito meses de gestação, Adriana Rosa ficou ao menos três com infecção urinária mal tratada. Com dores fortes e contrações, a faxineira procurou uma unidade de pronto atendimento. Mas, como a única maternidade pública da cidade está fechada há quase um ano pela Vigilância Sanitária, ela foi obrigada a buscar assistência em outro município.
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‘Fiquei duas horas esperando uma ambulância, minha irmã me colocou no carro e fui para Itanhaém. Foi detectada a ausência de batimento cardíaco. O médico disse que não podia me atender porque não tinha leito.’ Depois percorrer 50 quilômetros e duas cidades, ela conseguiu um leito para fazer a indução do parto de Ana Luiza, já sem vida. ‘Já tinha problema de depressão. Agora, estou com a cabeça ruim. Se tivesse maternidade, nada disso estaria acontecendo’, diz.
O drama de Adriana, vivido em Peruíbe, litoral de São Paulo faz parte da realidade brasileira. Mais de três mil leitos de obstetrícia foram extintos em três anos no Brasil, de acordo com um levantamento do Conselho Federal de Medicina. A situação se repete na rede particular. Em São Paulo, nos últimos cinco anos, 17 maternidades fecharam as portas.
A falta de leitos obstétricos em todo o país tem explicação. Para o obstetra do Pré-Natal do Instituto Nacional de Saúde da Mulher da Fiocruz Marcos Nakamura, a maioria das unidades mudou de ramo em busca de mais lucro: ‘Os planos de saúde pagam pouco para os hospitais perto de um procedimento cirúrgico, como cardiológico e ortopédico. Os hospitais preferem fechar as maternidades para colocar especialidades mais rentáveis para esses hospitais’.
A carência de leitos obstétricos reflete na qualidade do atendimento. Cada vez mais, as maternidades estão cheias. Para garantir uma vaga em unidades de atendimento, muitos médicos têm agendado cesáreas, o que eleva ainda mais as taxas brasileiras. Pacientes também pedem para fazer a cirurgia com receio de não dar à luz num hospital de referência. Hoje, mais da metade dos partos é feita dessa forma no país.
Grávida de quatro meses, a designer Camila Cafardo planeja o nascimento do bebê para novembro, mas se recusa a agendar o procedimento porque deseja o parto normal. ‘É o que tiver vaga no dia. Sei de hospitais cheios, mas se não conseguir dentro das duas opções que prefiro, vou para uma terceira.’
Mesmo quem possui a cobertura de um plano de saúde se depara com a cobrança de um valor extra feito por obstetras. A justificativa para as gestantes é garantir que o médico escolhido faça o parto em vez de uma equipe de plantão.
A chamada taxa de disponibilidade, considerada irregular pelo Ministério da Saúde, mas tolerada pelo Conselho Federal de Medicina, costuma variar entre R$ 2 mil e R$ 5 mil, com explica o corregedor da entidade, José Maia Vinagre. ‘Como não se sabe da disponibilidade do médico, que pode estar doente ou num congresso, não é antiético cobrar da paciente para ficar à disposição’, afirma.
Diante da pouca oferta de serviços na rede pública, muitas gestantes também não sentem segurança nos procedimentos dos planos de saúde e preferem pagar para ter um atendimento melhor.
De acordo com a Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos, que é uma listagem feita pela Associação Médica Brasileira, um parto no modelo particular custa entre R$ 8 mil e R$ 12 mil – incluindo o obstetra, um auxiliar, um anestesista e um pediatra neonatal. Mas, como muitas dessas mulheres têm planos de saúde, elas costumam ter o parto coberto total ou parcialmente.
Elaine Freires
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