Em defesa do parto ativo

18 de abril, 2014

(Jornal do Commercio, 18 a 22/04/2014) Em 4 de abril de 1982, uma obstetra sul-africana organizou uma passeata no norte de Londres, durante a qual 60 mil pessoas exigiram o direito da mulher a dar à luz em qualquer posição que escolhesse. O chamado Movimento pelo Parto Ativo acabava de ser criado por Janet Balaskas, uma das mais respeitadas do mundo na área. Foi uma resposta à dificuldade imposta pelo Hampestad’s Royal Free Hospital, que obrigou uma gestante a assinar termo de responsabilidade, isentando quatro parteiras de culpa, quando ela tentava dar à luz em quatro apoios.

No fim, ela cedeu e o parto ocorreu na posição ginecológica.

“Eu não fazia a menor ideia de que seria a fundadora do movimento.  Ainda acho isso inacreditável”, afirmou Balaskas à reportagem, durante a passagem por Brasília. Em entrevista exclusiva, ela assegurou que o parto ativo é o mais natural método de concepção e enumerou benefícios para a mãe e o bebê.

Balaskas também criticou a decisão da Justiça do Rio Grande do Sul, que, no fim do mês passado, determinou que uma gestante teria que se submeter à cesariana, mesmo contra a própria vontade. “Eu entendo essa situação como uma violência obstétrica”, comentou.No último dia 10, a sul-africana Janet Balaskas visitou a Casa de Parto de São Sebastião, no Distrito Federal, e promoveu uma palestra na Universidade de Brasília (UnB), com a participação de Maria Esther Vilela, coordenadora do Programa Saúde da mulher do Ministério da Saúde; e de Daphne Rattner, professora da UnB e presidente da Rede pela Humanização do Parto e do Nascimento (Rehuna).

Entrevista JANET BALASKAS

Por que a cesariana desperta tanta polêmica e não é considerada o melhor tipo de parto?

Há vários tipos de cirurgia cesariana: a eletiva, aquela feita durante o trabalho de parto e a de emergência. Atualmente, no Brasil, a taxa de cesarianas está próxima de 60%. É um índice bastante alto. A Organização Mundial da Saúde (OMS) defende que a taxa deve estar entre 10% e 15%. Quando esse índice ultrapassa 15%, os prejuízos são maiores que os benefícios. A cesariana traz riscos tanto para a mãe quanto para o bebê e, mesmo que ela seja às vezes necessária e que salve vidas, um parto como o que você descreve nesta pergunta é uma extração cirúrgica.

Não é um parto. Todos os inúmeros benefícios que a natureza traz para a mãe e o bebê durante o processo de parto são perdidos.

Quais são esses benefícios?

Eles incluem os chamados hormônios do amor, que regem o nascimento. No momento do parto, mãe e bebê estão repletos desses hormônios e formam um vínculo forte, que é impossível de ser replicado em uma cesariana.

Em um parto natural, o bebê nasce por meio de um ato de paixão e de amor, e a mãe faz sua entrada na maternidade em um estado de êxtase, sentindo-se bem e cheia de energia, em vez de ter que passar por uma recuperação pós-operatória de uma cirurgia de grande porte. A amamentação é mais fácil e mais bem-sucedida; a depressão pós-parto se tornam muito improvável de acontecer, e a mãe achará mais fácil cuidar de seu bebê.

O que é o parto ativo e que benefícios ele representa para a mãe e o bebê?

Em um parto ativo, a mulher tem liberdade para seguir seus instintos. Ela se movimenta, relaxa em qualquer situação que se sinta confortável e dá à luz em posição vertical, ou ajoelhada, de cócoras ou na água. Ela pode se soltar e se entregar para o processo natural que vai parir o bebê. O parto não é algo que “fazemos” – ele acontece. Os principais benefícios são a ajuda da força da gravidade, que torna tudo menos dolorido para a mulher e mais fácil para o bebê; o suprimento de oxigênio para o bebê e para o útero é melhor; os diâmetros da pélvis ficam maiores; e as contrações uterinas se tornam mais eficientes.

Que tipo de precauções é preciso tomar durante esse tipo de parto?

Como não é um procedimento cirúrgico, um parto ativo não exige nenhum cuidado especial em relação à higiene, a não ser o bom senso. O bebê está naturalmente protegido pelas bactérias que estão no corpo da mãe, pois ambos compartilham os mesmos fatores imunes. Provavelmente, é mais higiênico parir em casa, rodeada por bactérias familiares às quais a mãe e o bebê terão uma resistência natural.

No parto, não somos diferentes dos outros mamíferos, e não ouvimos falar de infecções serem um problema comum entre os animais, ou no mundo selvagem.

Então, o parto ativo é o mais natural que existe?

O parto ativo não é nenhuma novidade. Não é um método. As mulheres vinham parindo de forma ativa por milhares de anos em todo o mundo – inclusive no Brasil -, antes de a cirurgia cesariana assumir. Parto ativo é apenas uma maneira de descrever um parto natural.

Só há um tipo de parto, e os princípios de um parto ativo são universais e verdadeiros.

Uma gaúcha de 29 anos foi obrigada pela Justiça a fazer uma cesariana contra a própria vontade. Como a senhora vê esse caso?

Eu entendo essa situação como uma violência obstétrica. Todas as mulheres têm o direito de consentir e de recusar qualquer procedimento feito em seu corpo.

Se a cirurgia foi realizada sem o consentimento prévio dela, eu consideraria isso um abuso dos direitos humanos básicos. Isso aponta para a necessidade de uma melhor comunicação e colaboração entre as mulheres e os médicos, e uma compreensão muito mais profunda da fisiologia do nascimento por parte dos médicos e dos pais. No momento, existe uma guerra entre a maioria dos obstetras e as mulheres brasileiras que querem um parto natural, quando deveria haver parceria e cooperação.

As mulheres, hoje, são muito mais informadas sobre o parto.

Elas têm opiniões bem formadas e desejos em relação ao nascimento de seus bebês. Elas conhecem seus direitos. Penso que os médicos se beneficiariam muito se ouvissem o que as mulheres no Brasil estão dizendo e se tentassem oferecer mais apoio às que querem parir naturalmente, ao mesmo tempo em que oferecem apoio obstétrico quando necessário.

Em que culturas o parto ativo é considerado uma norma?

O parto ativo era a norma em todas as culturas antes do advento da obstetrícia moderna.

No mundo de hoje, é difícil encontrar uma região onde ele seja a norma. No entanto, nos lugares onde há uma forte cultura para o parto natural, o parto ativo é parte fundamental. Em tais locais, os resultados geralmente são muito bons, com uma taxa de complicações muito baixa. O parto ativo é seguro, traz satisfação e promove saúde física e mental ótima para o recém-nascido.

Isso dá ao bebê uma base de resistência a doenças e um sistema imunológico forte por toda a vida. Essa é uma das muitas razões pelas quais mulheres inteligentes e bem informadas queiram dar à luz naturalmente aos seus bebês. Foi isso que me motivou no início. No Reino Unido, estamos em uma situação em que o parto ativo é comum, se não for a norma. Há muito respeito pelas mulheres que fazem essa escolha, e o sistema nacional de saúde lhes oferece, gratuitamente, condições e recursos para utilizar centros para parto normal e para o parto domiciliar planejado.

Acesse o PDF: Em defesa do parto ativo (Jornal do Commercio, 18 a 22/04/2014)

m defesa do parto ativo
Em 4 de abril de 1982, uma obstetra sul-africana organizou uma passeata no norte de Londres, durante a qual 60 mil pessoas exigiram o direito da mulher a dar à luz em qualquer posição que escolhesse. O chamado Movimento pelo Parto Ativo acabava de ser criado por Janet Balaskas, uma das mais respeitadas do mundo na área. Foi uma resposta à dificuldade imposta pelo Hampestad’s Royal Free Hospital, que obrigou uma gestante a assinar termo de responsabilidade, isentando quatro parteiras de culpa, quando ela tentava dar à luz em quatro apoios. 

No fim, ela cedeu e o parto ocorreu na posição ginecológica.

 

“Eu não fazia a menor ideia de que seria a fundadora do movimento.

 

Ainda acho isso inacreditável”, afirmou Balaskas à reportagem, durante a passagem por Brasília. Em entrevista exclusiva, ela assegurou que o parto ativo é o mais natural método de concepção e enumerou benefícios para a mãe e o bebê.

 

Balaskas também criticou a decisão da Justiça do Rio Grande do Sul, que, no fim do mês passado, determinou que uma gestante teria que se submeter à cesariana, mesmo contra a própria vontade. “Eu entendo essa situação como uma violência obstétrica”, comentou.No último dia 10, a sul-africana Janet Balaskas visitou a Casa de Parto de São Sebastião, no Distrito Federal, e promoveu uma palestra na Universidade de Brasília (UnB), com a participação de Maria Esther Vilela, coordenadora do Programa Saúde da mulher do Ministério da Saúde; e de Daphne Rattner, professora da UnB e presidente da Rede pela Humanização do Parto e do Nascimento (Rehuna).

 

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entrevista JANET BALASKAS

 

Por que a cesariana desperta tanta polêmica e não é considerada o melhor tipo de parto?

 

Há vários tipos de cirurgia cesariana: a eletiva, aquela feita durante o trabalho de parto e a de emergência. Atualmente, no Brasil, a taxa de cesarianas está próxima de 60%. É um índice bastante alto. A Organização Mundial da Saúde (OMS) defende que a taxa deve estar entre 10% e 15%. Quando esse índice ultrapassa 15%, os prejuízos são maiores que os benefícios. A cesariana traz riscos tanto para a mãe quanto para o bebê e, mesmo que ela seja às vezes necessária e que salve vidas, um parto como o que você descreve nesta pergunta é uma extração cirúrgica.

 

Não é um parto. Todos os inúmeros benefícios que a natureza traz para a mãe e o bebê durante o processo de parto são perdidos.

 

Quais são esses benefícios?

 

Eles incluem os chamados hormônios do amor, que regem o nascimento. No momento do parto, mãe e bebê estão repletos desses hormônios e formam um vínculo forte, que é impossível de ser replicado em uma cesariana.

 

Em um parto natural, o bebê nasce por meio de um ato de paixão e de amor, e a mãe faz sua entrada na maternidade em um estado de êxtase, sentindose bem e cheia de energia, em vez de ter que passar por uma recuperação pós-operatória de uma cirurgia de grande porte. A amamentação é mais fácil e mais bem-sucedida; a depressão pósparto se tornam muito improvável de acontecer, e a mãe achará mais fácil cuidar de seu bebê.

 

O que é o parto ativo e que benefícios ele representa para a mãe e o bebê?

 

Em um parto ativo, a mulher tem liberdade para seguir seus instintos. Ela se movimenta, relaxa em qualquer situação que se sinta confortável e dá à luz em posição vertical, ou ajoelhada, de cócoras ou na água. Ela pode se soltar e se entregar para o processo natural que vai parir o bebê. O parto não é algo que “fazemos” – ele acontece. Os principais benefícios são a ajuda da força da gravidade, que torna tudo menos dolorido para a mulher e mais fácil para o bebê; o suprimento de oxigênio para o bebê e para o útero é melhor; os diâmetros da pélvis ficam maiores; e as contrações uterinas se tornam mais eficientes.

 

Que tipo de precauções é preciso tomar durante esse tipo de parto?

 

Como não é um procedimento cirúrgico, um parto ativo não exige nenhum cuidado especial em relação à higiene, a não ser o bom senso. O bebê está naturalmente protegido pelas bactérias que estão no corpo da mãe, pois ambos compartilham os mesmos fatores imunes. Provavelmente, é mais higiênico parir em casa, rodeada por bactérias familiares às quais a mãe e o bebê terão uma resistência natural.

 

No parto, não somos diferentes dos outros mamíferos, e não ouvimos falar de infecções serem um problema comum entre os animais, ou no mundo selvagem.

 

Então, o parto ativo é o mais natural que existe?

 

O parto ativo não é nenhuma novidade. Não é um método. As mulheres vinham parindo de forma ativa por milhares de anos em todo o mundo – inclusive no Brasil -, antes de a cirurgia cesariana assumir. Parto ativo é apenas uma maneira de descrever um parto natural.

 

Só há um tipo de parto, e os princípios de um parto ativo são universais e verdadeiros.

 

Uma gaúcha de 29 anos foi obrigada pela Justiça a fazer uma cesariana contra a própria vontade.

 

Como a senhora vê esse caso?

 

Eu entendo essa situação como uma violência obstétrica. Todas as mulheres têm o direito de consentir e de recusar qualquer procedimento feito em seu corpo.

 

Se a cirurgia foi realizada sem o consentimento prévio dela, eu consideraria isso um abuso dos direitos humanos básicos. Isso aponta para a necessidade de uma melhor comunicação e colaboração entre as mulheres e os médicos, e uma compreensão muito mais profunda da fisiologia do nascimento por parte dos médicos e dos pais. No momento, existe uma guerra entre a maioria dos obstetras e as mulheres brasileiras que querem um parto natural, quando deveria haver parceria e cooperação.

 

As mulheres, hoje, são muito mais informadas sobre o parto.

 

Elas têm opiniões bem formadas e desejos em relação ao nascimento de seus bebês. Elas conhecem seus direitos. Penso que os médicos se beneficiariam muito se ouvissem o que as mulheres no Brasil estão dizendo e se tentassem oferecer mais apoio às que querem parir naturalmente, ao mesmo tempo em que oferecem apoio obstétrico quando necessário.

 

Em que culturas o parto ativo é considerado uma norma?

 

O parto ativo era a norma em todas as culturas antes do advento da obstetrícia moderna.

 

No mundo de hoje, é difícil encontrar uma região onde ele seja a norma. No entanto, nos lugares onde há uma forte cultura para o parto natural, o parto ativo é parte fundamental. Em tais locais, os resultados geralmente são muito bons, com uma taxa de complicações muito baixa. O parto ativo é seguro, traz satisfação e promove saúde física e mental ótima para o recém-nascido.

 

Isso dá ao bebê uma base de resistência a doenças e um sistema imunológico forte por toda a vida. Essa é uma das muitas razões pelas quais mulheres inteligentes e bem informadas queiram dar à luz naturalmente aos seus bebês. Foi isso que me motivou no início. No Reino Unido, estamos em uma situação em que o parto ativo é comum, se não for a norma. Há muito respeito pelas mulheres que fazem essa escolha, e o sistema nacional de saúde lhes oferece, gratuitamente, condições e recursos para utilizar centros para parto normal e para o parto domiciliar planejado.

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