(Vírgula, 19/02/2016) Pânico, incertezas e uma aflição a cada novo ultrassom. Essa tem sido a vida de grávidas em meio ao desencontro de informações sobre a relação do zika vírus com a microcefalia. A recomendação para “adiar a gravidez” não serve para elas. Inconformadas, as futuras mães atacam a paranoia causada pela falta de informações e o despreparo dos profissionais de saúde: “estamos correndo atrás do rabo”, disse Caroline Costa Curta Tostes, grávida de sete meses e moradora de Ribeirão Preto.
“As informações são muito vagas, não se sabe de onde vem, o que causa. Isso acaba gerando desespero”, reclamou Caroline Tostes.
Em janeiro, Caroline passou por uma situação de “desespero”. Ela acordou com manchas vermelhas no corpo. “Passaram diversas situações na cabeça, não por mim, mas pela criança”, lembrou. Caroline aguardou cinco horas para receber o diagnóstico de dengue e foi enviada a outro hospital onde teve que esperar mais cinco horas. “Comecei a chorar, por ninguém saber nada direito”, disse. Ninguém sabia informar o estado do bebê e uma das médicas ainda disse que o exame detalhado só é feito para fins estatísticos, segundo ela. “Se tiver prejudicado o bebê, não temos o que fazer, só apoio psicológico”, relatou.
“Quando descobri que estava grávida só via notícias sobre zika vírus, fiquei assustada. Aconselharam a não engravidar, mas já era tarde demais”, lembrou Mariah Rodrigues.
As informações são mais assustadoras do que esclarecedoras, para Mariah Rodrigues, grávida de quatro meses e moradora de Santos. “Faço pré-natal pelo sistema público de saúde, nenhuma vez tocaram no assunto, nem sequer sobre como se prevenir”, reclamou. Desde o final de 2015, já foi dito que a microcefalia é causada pelo zika vírus, transmitido pelo Aedes aegypti, que foi uma contaminação causada por um lote vencido de vacina contra rubéola, que é culpa do larvicida pyriproxyfen usado para tratar a água potável (…).
Natália Del Lama Sartoro, grávida de sete meses, trabalha em um hospital de Ribeirão Preto e convive com reclamações de mulheres todos os dias, sem contar os comentários de amigas que também estão grávidas. “Cada uma fala algo sobre a forma para se proteger, percebo que as informações estão desencontradas”, disse. A pior parte, na opinião dela, é que essa paranoia está destruindo “a melhor fase na vida da mulher que é a gravidez”.
Bruna Elisa N. Candido está no quinto mês de gestação e quando os casos de microcefalia começaram a ser divulgados, ela cancelou viagens, colocou tela mosqueteiro na cada toda e passou a tomar banhos de repelente todos os dias. “Cada ultrassom é um alívio”, disse. O uso do produto e também de inseticidas é a única arma que elas encontraram para se proteger do que chamam de “terror” na vida de uma futura mãe.
“Só quem passa por essa dificuldade sabe o que é, a mãe que acredita que não será feliz com um filho assim e preferir o aborto, tem que ter esse direito”, opinou Bruna.
Um grupo liderado pela antropóloga Débora Diniz, do instituto de bioética Anis, está preparando uma ação para apresentar ao Supremo Tribunal Federal pedindo a legalização do aborto nos casos em que a microcefalia for confirmada. A mesma equipe conseguiu aprovação da interrupção da gravidez para fetos com anencefalia em 2012. As grávidas apoiam o direito de escolha da futura mãe, mas ao mesmo tempo cobram exames mais precisos.
“As mães têm descoberto microcefalia com seis meses de gestação, aí, o que dá para fazer? Para variar, a mulher é colocada em uma situação difícil”, criticou Mariah. É preciso descobrir as causas e efeitos da microcefalia e analisar a possibilidade de aborto caso a caso, de acordo com a estrutura familiar, financeira e psicológica de cada casal, acrescentou Caroline.
Thais Sabino
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