Maternidade no cárcere: o Brasil tem 400 gestantes e 550 crianças nas penitenciárias femininas

01 de fevereiro, 2015

(Folhaweb, 01/02/2015) Pelo menos 550 mulheres cumprem pena ao lado dos filhos pequenos no Brasil; destas, 32 estão no Paraná

“Quem está pagando a sua dívida com a sociedade é a mãe; não a criança.” A frase de Patrícia Elizabeth Benitez Romero, assessora do setor de solidariedade do Grupo Marista, resume bem a situação dos 32 meninos e meninas que vivem hoje na Penitenciária Feminina do Paraná (PFP), em Piraquara, região metropolitana de Curitiba (RMC). Em um espaço com paredes coloridas, que se diferencia das minúsculas celas prisionais, os pequenos passam as tardes brincando no berçário, na grama ou no parquinho, sob a supervisão das mães. Os altos muros que cercam a instituição, as agentes fazendo a guarda a todo momento, as frequentes revistas e o acesso restrito a outras pessoas, contudo, deixam claro que ali se trata de um presídio de segurança máxima.

Conforme o Ministério da Justiça, 400 gestantes e 550 crianças, sendo 53% de até seis meses, 26% de um ano e 20% com idades superiores, vivem atualmente nos 80 estabelecimentos penais femininos do País (53 penitenciárias). São casos como o de *Alice, de 2 anos, cuja mãe, a londrinense *Joana, de 27, foi condenada a 11 anos de reclusão por tráfico de drogas e associação, em junho de 2012. De cabelos cacheados soltos e sorriso tímido, a garota é como qualquer bebê de sua idade: se diverte, chora, faz manha e, aos poucos, vai descobrindo novas palavras e significados. O pai dela, de quem Joana não tem notícias, também está preso, há sete anos, acusado de homicídio. Já a irmã mais velha, Laura*, de 6, mora com a tia em Londrina.

“Eu era promotora de vendas, mas o dinheiro não estava dando e me vi obrigada (a cometer o crime). Fiquei sabendo que estava grávida e, em questão de um mês, eu já fui presa”, conta a detenta, hoje à frente da cozinha da creche. Na PFP, única das cinco unidades do Estado a receber crianças, as mães possuem o mesmo direito à remissão concedido às demais trabalhadoras. “A cada dois dias de trabalho, elas têm um dia descontado da pena. E recebem três quartos de um salário mínimo”, explica a diretora, Rita Naumann. Segundo ela, das cerca de mil presas do Paraná, 400 estão em Piraquara. “Aqui temos um diferencial: quase 100% (das internas) participam de alguma atividade, como tratamento penal, cursos de qualificação profissional, escola ou convênio de trabalho com empresas de fora.”

Em geral, as gestantes são encaminhadas primeiro ao Complexo Médico-Penal, onde permanecem até o momento do parto. Depois, já na PFP, são levadas a uma galeria separada, para amamentação. Saem de lá apenas quando os bebês completam seis meses, momento em que eles começam a frequentar a educação infantil e a se preparar para a saída da unidade. Pela legislação, os pequenos podem ficar na instituição até os seis anos, tempo que varia de Estado para Estado. A recomendação de especialistas, contudo, é de que a partir dos dois a criança seja entregue a um familiar mais próximo.

“Nunca imaginava que existia esse lugar aqui. Quando entrei, achava que ela (Estela*, de um ano e sete meses) ia nascer e iam mandá-la embora”, afirma *Marta, de 23, de Paranacity (Noroeste). Acusada de latrocínio e ocultação, ela cumpre pena de 23 anos, 4 meses e 13 dias. Como recorreu da sentença, atualmente espera um retorno da Justiça para saber se continua ao lado da filha ou se a deixa com os familiares. Caso a separação ocorra, a menina só poderá voltar ao presídio aos sábados e domingos, que são os dias de visita.

Desde outubro de 2014, a Rede Marista de Solidariedade (RMS) é a responsável pelo desenvolvimento das atividades pedagógicas no local, conhecido como “Estação Casa”. Das 5h30 às 19 horas, porém, são as próprias detentas que cuidam das crianças, num esquema de revezamento. “À noite, a gente desce (para as celas) e eles ficam aqui, com as agentes e enfermeiras”, relata *Patrícia, de 32, de Bandeirantes (Norte Pioneiro). Mãe de *Pedro, de um ano e sete meses, e de *Sabrina, de 13, atualmente sob cuidados da avó, ela “caiu” numa escuta telefônica, também por acusação de tráfico, pouco tempo após a prisão do ex-companheiro. “Em parte, é triste ter os filhos na prisão. Sei que ele tem liberdade, mas não faz as mesmas coisas que faria fora”, lamenta.

* Todos os nomes utilizados são fictícios, para preservar as identidades das mães e das crianças

Mariana Franco Ramos, da reportagem local

Acesse no site de origem: ATRÁS DAS GRADES – Maternidade no cárcere (Folhaweb, 01/02/2015) 

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