Ao menos uma mulher vítima de violência sexual que iria realizar um aborto legal previamente agendado no Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha, na capital paulista, teve o procedimento suspenso sem aviso prévio após a Prefeitura de São Paulo extinguir os atendimentos no local.
A descontinuidade do serviço foi revelada pela coluna no mês passado. A paciente diz que “ficou com um novo trauma” por ter que passar por todos os procedimentos necessários —exames e consultas com médicos e psicólogos— mais de uma vez. Afirma também ter sido vítima de violência obstétrica quando, enfim, conseguiu realizar a interrupção da gestação em outra unidade de saúde.
A vítima buscou o hospital Cachoeirinha pela primeira vez no dia 5 de dezembro de 2023. Após passar em consulta com médico e assistente social, o procedimento foi agendado para o dia 20 do mesmo mês. Ao chegar no local na data marcada, porém, ela foi informada de que não seria possível dar prosseguimento ao aborto devido à suspensão do serviço.
No mesmo dia, a paciente foi ao Hospital da Mulher, gerido pelo Governo de São Paulo. Lá, ela afirma ter sido informada de que teria que começar o atendimento novamente, desde o início. “Tive que relatar tudo o que passei [da violência sexual] de novo”, relata ela, que pediu que sua identidade não fosse divulgada, em depoimento à coluna.
A paciente, então, buscou o Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem) da Defensoria Pública de São Paulo. No dia seguinte, o órgão enviou um ofício ao hospital pedindo a continuidade do atendimento para a interrupção legal de gestação, com aproveitamento dos exames, consultas e entrevistas já realizados, a fim de se evitar “a revitimização da paciente”.
O órgão também ressaltou que a mulher é mãe de uma criança com autismo e que não possui rede de apoio. A instituição de saúde não atendeu ao ofício.
A paciente retornou ao Hospital da Mulher no dia 27 de dezembro, para realizar, mais uma vez, as consultas e exames necessários com os profissionais de saúde. Ela diz que se sentiu desconfortável na entrevista com a assistente social.
“Sabe aquela coisa de agir como [se fosse] sua amiga, mas no fundinho está querendo te cutucar? Ela, a todo momento, falava: ‘Você sabe que você pode dar queixa, fazer um boletim de ocorrência? Você não tem culpa, mas a responsabilidade [de estar nessa situação] é sua.”